CONCERTO: “Ravel et le Jazz”
Belmondo Quintet | Orquestra Clássica de Espinho
Direcção musical | Diogo Costa
48º FIME - Festival Internacional de Música de Espinho
Praça do Progresso, Espinho
17 Jun 2022 | sex | 22:00
O Festival Internacional de Música de Espinho vestiu-se com as cores do jazz no arranque da sua 48ª edição. Do jazz, mas também da música clássica, numa combinação arrojada que teve o condão de harmonizar as duas grandes matrizes da entidade organizadora do Festival, a Academia de Música de Espinho. Ambiciosa, a aposta num concerto iminentemente eclético teve nos compositores modernistas franceses, sobretudo em Maurice Ravel, mas também em Claude Debussy e Erik Satie, uma extraordinária âncora, com base na qual Lionel Belmondo modelou um conjunto de arranjos subtis e de enorme qualidade e bom gosto. Lionel Belmondo que, com os seus saxofones e flauta, liderou o quinteto que pontificou neste concerto de abertura, tendo a seu lado o irmão Stéphane Belmondo (trompete e fliscorne), Laurent Fickelson (piano), Sylvain Romano (contrabaixo) e Tony Rabeson (bateria), coadjuvantes perfeitos numa noite inspirada. Em torno do quinteto, a parte e o todo em simultâneo, a Orquestra Clássica de Espinho, sob a direcção do maestro Diogo Costa, mostrou-se igual a si própria: sóbria, sólida, irrepreensível.
Escrita inicialmente para piano por Claude Debussy, em 1914, a suite “Six Épigraphes Antiques” tem em “Pour l’Egyptienne” um dos seus mais belos movimentos. Foi este o tema de abertura do concerto, ficando desde cedo demonstrada a adequação de géneros no seu desenvolvimento, muito por culpa do virtuosismo de Lionel Belmondo e restantes membros do quinteto. A Orquestra soube envolver em sonoridades doces os apontamentos jazzísticos, o todo resultando num momento de puro prazer a prenunciar um concerto inesquecível. Seguiu-se “Berceuse sur le nom de Gabriel Fauré”, de Maurice Ravel, e o êxtase repetiu-se. Stéphane Belmondo expressou a sua enorme qualidade num longo solo de trompete, mas foi Laurent Fickelson quem mais se fez notar, o piano dividido entre a dolente linguagem clássica e os ritmos vibrantes do jazz. Prelúdio do 1º acto de “Les Fils des Étoiles”, de Erik Satie, “La Vocation” foi mais um momento mágico, tal como o foram “Le Plus Que Lent”, de Debussy, ou “Yusef’s Tree”, uma peça escrita por Lionel Belmondo e que é um tributo a Yusef Lateef, a par de Milton Nascimento uma das figuras do jazz que mais tem influenciado o agrupamento.
Exploração empolgante dos cruzamentos entre universos musicais, “Ravel et le Jazz” foi, já o disse, um enorme concerto. Sob o manto da modernidade, os temas clássicos tomam formas inesperadas. Rompendo com a tradição, os sons e ritmos desenvolvidos de um e outro lado do Atlântico no primeiro quartel do século passado mostram, afinal, ter muito mais em comum do que aquilo que poderíamos supor. Só por isto, todas as palavras de reconhecimento que possa dirigir à organização do Festival serão poucas. Mas há também esse pormenor de vital importância que é a oferta do Concerto à cidade, prosseguindo no extraordinário esforço de valorizar a cultura e, em particular, a música, aproximando-a daqueles que menos acesso têm a ela. O novo espaço da Praça do Progresso albergou um numeroso público, mostrando-se perfeitamente adequado a este tipo de manifestações. Resta falar dos mais novos, dos alunos da Academia, os músicos de amanhã. Foi deles o primeiro grande momento, cantando em conjunto um tema que foi, em si mesmo, um hino à alegria. Que venham mais concertos como este!
[Foto: Filipe Pereira, Festival Internacional de Música de Espinho | https://www.facebook.com/fimespinho]
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