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terça-feira, 13 de junho de 2023

CERTAME: FIMO - Festival Internacional de Marionetas de Ovar 2023


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CERTAME: FIMO – Festival Internacional de Marionetas de Ovar 2023
Bruno Gama (POR), Companhia Beto Hinça (BRA), Companhia da Oficina (POR), Contacto (POR), Daria Ivanova-Hololobova (UCR), Grupo Mosaico Cultural (BRA), La Pajarera Puppet Show (ARG), Marionetas Rui Sousa (POR), S.A. Marionetas (POR), Títeres Cachirulo (ESP), Twisted Fairground (ESP), Urdime (ESP), Vate (POR)
Organização | União das Freguesias de Ovar, S. João, Arada e S. Vicente de Pereira 
Ovar, vários locais
09 Jun > 11 Jun 2023


Oeiras, Espinho, Alcobaça, Sintra, Ílhavo, Faro, Caminha, Lousã, Gondomar, Évora, Montemor-o-Novo, Lisboa, Porto, Ovar… É um clube restrito, o dos certames que, em Portugal, elegem as Marionetas, nas mais variadas formas, como fulcro da sua atenção. “Poucos, mas bons”, parece-me escutar, ao que eu contraporia que deveriam ser mais, de tal forma o carácter popular desta arte se funde com a tradição, constituindo uma forma de espalhar cultura pelos mais diversos espaços, junto de um público que, normalmente, a ela não tem o devido acesso. Os marionetistas sabem, pois, da responsabilidade acrescida que sobre eles pesa. Por esse motivo, na construção das formas animadas e na sua manipulação, no desenho dos cenários, na escrita dos textos e na interpretação das peças, colocam o melhor de si, transformando cada espectáculo num momento de arte e engenho, de sonho e fantasia, um momento simultaneamente lúdico e divertido, capaz de tocar a criança de tenra idade ou o mais provecto dos anciãos com histórias de encanto e espanto.

Ao longo de três dias, Ovar foi o epicentro nacional do Teatro de Marionetas graças à 16ª edição do FIMO – Festival Internacional de Marionetas de Ovar 2023. Trazendo com ele 23 espectáculos produzidos por treze companhias de cinco países, o certame teve ainda para oferecer vários workshops de marionetas, uma Feira de Artesanato e espaços de diversão espalhados pelo centro da cidade, mobilizando um número elevado de espectadores de todas as idades. Falando exclusivamente daquilo a que tive oportunidade de assistir, na manhã e parte da tarde do último dia, começaria precisamente pelo workshop de marionetas “Vertep”, levado a cabo pela ucraniana Daria Ivanova-Hololobova. Parte integrante do património cultural ucraniano com quase quatro séculos de existência, o vertep é um teatro de marionetas portátil que remete para as cenas da natividade. Convidadas a recriar as figuras de Maria e do menino, dos anjos ou do Rei Herodes, as crianças mostraram a sua destreza no domínio de tesouras e cartolinas, colas e tecidos. Quem sabe, no próximo 25 de dezembro um vertep possa abrigar-se debaixo do pinheirinho de uma casa ovarense, unindo portugueses e ucranianos naquilo que é o verdadeiro espírito natalício.

No Parque Urbano de Ovar, o Teatro de Marionetas provou a sua abrangência com uma peça conduzida por Márcia Leite, da Companhia da Oficina. Dirigida essencialmente a um público de tenra idade, “O Urso Que Não Era” conta a história de um urso que, ao ver aproximar-se o Inverno, se prepara para hibernar. Enquanto isso acontece, porém, a floresta onde habita dá lugar a uma grande fábrica e, ao acordar, espera-o uma grande surpresa. Com delicadeza e expressividade, Márcia Leite socorre-se de um vasto conjunto de formas animadas para nos falar da dificuldade crescente em mantermos a nossa identidade num mundo cada vez mais compartimentado, dominado pela burocracia, espoliado nos seus recursos e ameaçado de extinção. Um mundo de “homens tontos”. Do Brasil, o Grupo Mosaico Cultural trouxe “Lampião e Maria Bonita”, a história de um amor que acabou em tragédia e que tem como protagonistas os dois cangaceiros mais famosos de todos os tempos. A música e a boa disposição foram uma constante nesta peça interpretada por Nando Rossa, Ludmila Flores e Rafa Cambará, interagindo com um animado “bando de cangaceiros” (ou seja, o “público”) e arrancando dele os mais entusiásticos aplausos.

Nas sessões da tarde, a Companhia de Títeres Cachirulo apresentou “Camiño de Aventuras”, dando a ver o encontro, no Caminho de Santiago, entre o peregrino Gaiferos, a quem a Rainha Isabel de Castela incumbiu a “missão impossível” de buscar a paz com os mouros, e o Diabo, que tudo faz para o desviar dos seus objectivos. Bruno Gama apresentou “Zé Pastel”, dando plasticidade e vida a um conjunto de objectos que, manipulados com destreza, arrancaram saborosas gargalhadas ao público. A companhia catalã “Twisted Fairground” trouxe um conjunto de marionetas em grande formato, mesclando o teatro físico com os autómatos e a manipulação de fios. Com uma abordagem próxima aos filmes de terror de série B, onde não faltou sequer um Dr. Frankenstein recrutado entre o público, “Los Secretos de Ecdisis” teve em Matt Knight e Azucena Desparpajo Zuk dois terríficos anfitriões. Termino com Beto Hinça, cuja companhia é presença assídua no certame vareiro desde a primeira hora. A forma descontraída como interage com o público, a nota de provocação a arrancar longos “nãos” à pequenada, faz de Beto Hinça um marionetista de excelência e deste “Magia Musical” um espectáculo super-divertido, pleno de suspense, onde cachorros e trapezistas, bailarinas e esqueletos percorrem o palco, arrastando com eles a marca da surpresa e do insólito.

quinta-feira, 13 de junho de 2019

TEATRO DE MARIONETAS: "Hullu"



TEATRO DE MARIONETAS: “Hullu”,
Criação e interpretação | Johanna Ehlert, Loïc Apard, Matthieu Siefridt
Co-criação e encenação | Dominique Habouzit
Assistente | Elise Nicod
Iluminação | Thomas Maréchal
Som e composição musical | Sébastian Guérive
Figurinos | Sabrina Marletta
Produção | Blick Théâtre
60 Minutos | Maiores de 10 anos
FIMO 2019 – Festival Internacional de Marionetas de Ovar
Centro de Artes de Ovar
07 Jun 2019 | sex | 22:30


Nunca, até hoje, terá passado pelo Festival Internacional de Marionetas de Ovar um espectáculo com tanta qualidade como “Hullu”, que os franceses do colectivo Blick Théâtre apresentaram no palco do Centro de Artes, nas noites de sexta e sábado passados. É, da minha parte, uma ousadia fazer esta afirmação e devo admitir que corro o risco de ser acusado de parcialidade, sobretudo porque não vi todos os espectáculos que passaram pelo FIMO naquilo que leva de tempo de vida ao longo de treze edições. Mas a peça é de tal forma genial, tanto na sua construção, como nas dimensões técnica e interpretativa e, ainda, na mensagem que veicula, que certamente esta minha verdade é a verdade de todos quantos tiveram a oportunidade de poder apreciá-la e de com ela se deliciarem.

“Hullu” fala-nos desse mundo que habita o interior de cada um de nós, um mundo construído com a precária argamassa das ilusões e no qual buscamos refúgio sempre que o peso da realidade se torna insustentável. Mas o tempo prova-nos que esta fuga para o interior de nós próprios é sinónimo de clausura, nela se adivinhando o muro que, aos poucos, ameaça erguer-se e tornar-se intransponível. Cabendo, por definição, no universo das marionetas, “Hullu” é um espectáculo cuja dimensão e alcance vai muito para além disso. Inventivo e engenhoso, ele reparte-se entre a ilusão mágica, o assombro acrobático, a expressividade mímica e o humor refinado, oferecendo uma hora da mais pura diversão, onde o teatro de marionetas, o teatro físico, a dança e as artes circenses se misturam e confundem.

Mestres da ilusão, os actores mostram-se exímios em criar ambientes que baralham as fronteiras entre o real e o fantástico, entre o arquetípico e o indecifrável. Aqui, as marionetas ganham vida própria, tornam-se autónomas, deixando no ar a dúvida de quem manipula quem. Em “Hullu”, marionetas e seres de carne e osso passam a ser uma e a mesma coisa, pondo à prova a capacidade do espectador em percepcionar o real. A linguagem do disfarce na qual assenta toda a encenação de “Hullu” faz-nos mergulhar num mundo mágico e desconcertante e que é, no limite, o nosso próprio mundo interior. Original, excêntrico, envolvente, inquietante e profundamente imaginativo, “Hullu” é uma daquelas peças que nos transporta de volta à infância e nos devolve, em doses generosas, a magia e o sonho de acreditar naquilo que está para além de nós.

segunda-feira, 10 de junho de 2019

CERTAME: Festival Internacional de Marionetas de Ovar FIMO 2019


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CERTAME: Festival Internacional de Marionetas de Ovar FIMO 2019
Ovar, vários locais
07 > 09 Jun 2019


Ao longo de três dias, o Festival Internacional de Marionetas de Ovar FIMO 2019 voltou a espalhar magia, colorido e muita animação pelas salas, praças e fontes da cidade, oferecendo ao público um total de 65 espectáculos por 21 companhias de 14 diferentes países. Promovido pela União de Freguesias de Ovar, São João de Ovar, Arada e São Vicente de Pereira Jusã, o certame arrancou na noite de sexta-feira com “Chinese Tradition”, um espectáculo da companhia Sky Bird Puppet Group que ofereceu ao público alguns belíssimos exemplos de diversidade de marionetas e das técnicas inerentes à sua animação existente em Hong Kong. O momento em que Cheung Chun Fai mostrou à plateia um vislumbre do que está por detrás da manipulação - partilhando com os espectadores alguns exercícios de aquecimento a exigirem destreza, coordenação e uma enorme concentração -, revelou-se único, tanto pela interacção com a assistência como pelo seu carácter formativo.

No átrio da Escola dos Combatentes, Maru Fernández e Gerardo Martínez, do colectivo uruguaio Coriolis, apresentaram “Tropo”, uma peça na qual Julián e Ramiro, dois intrépidos amigos, tratam de devolver aos habitantes de uma comunidade rural tudo quanto perderam numa devastadora tempestade. De manipulação directa, marionetas de luva, luz negra e sombras se fez este espectáculo, recriando um ambiente quixotesco e oferecendo algumas rábulas deveras divertidas. Para o final deixo propositadamente “Hullu”, a peça que os franceses do Blick Theatre levaram ao Centro de Artes de Ovar. Tratou-se dum espectáculo absolutamente à parte neste Festival, destacando-se de todos os outros pela sua inventividade, qualidade técnica e momentos absolutamente surpreendentes, oferecidos ao longo de uma hora de pura magia. A “Hullu” e ao Blick Theatre voltarei brevemente neste espaço, em análise crítica separada.

O segundo dia do FIMO – para mim o último - teve início ainda durante a manhã, no belíssimo espaço verde do Parque Urbano, com três espectáculos sequenciais e todos eles tendo nas marionetas de fio o elemento em comum. Do Brasil, a Cia Tu Mateixa - cujo nome constitui uma homenagem à casa-oficina de marionetas de Pepe Otal, em Barcelona, onde a actriz Júlia Barnabé fez uma parte significativa da sua formação – trouxe-nos “Laia e o Voo da Imaginação”, um espectáculo delicado e sensível, assente na enorme cumplicidade entre marioneta e marionetista e que nos diz que não precisamos de sair do nosso quarto para viajarmos até muito longe, até onde nos deixarmos levar pelo sonho. Acrescentaria apenas que, se houvesse um prémio para a melhor marioneta, era para Laia que iria com inteira justiça, toda ela trabalhada em madeira, os movimentos assentes num impressionante conjunto de 18 fios, olhos articulados e uma “dimensão humana” verdadeiramente única.

Menos profundo, mas não menos divertido, The Gipsy Marionettist”, do bósnio Rasid Nikolic, teve na interacção com o público um dos seus grandes trunfos, misturando esqueletos que cantam jazz com tigres ferozes, dançarinas do ventre com o homem mais forte do mundo, o mais charmoso e sedutor e ainda o maior acrobata, estes três últimos “voluntários” recrutados entre a assistência. A manhã terminou com “Hanging by a Thread”, dos Di Filippo Marionette, dupla constituída por Remo Di Filippo e Rhoda Lopez. Através dele, ao longo de meia hora, vimos evoluir um violinista, um dançarino de sapateado, uma dona de casa empunhando uma vassoura, dois rappers, um ciclista acrobata e ainda Gino, um menino débil e um tanto envergonhado que encontra um nenúfar. Com um domínio da técnica particularmente apurado e uma presença de enorme expressividade, Rhoda e Remo ofereceram um espectáculo que encantou miúdos e graúdos e viria a conquistar o Prémio do Público deste FIMO 2019.

“A Árvore Cantada”, dos portugueses Cia Bipolar, foi um dos espectáculos que abriu a tarde, trazendo as questões ambientais para a ordem do dia. Lançando mão de um dispositivo cénico muito simples e eficaz e usando a técnica da manipulação directa, Cátia Vieira falou-nos o papel da água ao longo das estações do ano e a sua importância para que os ciclos ligados à natureza se possam repetir e perpetuar. No espaço fronteiro ao edifício da Câmara Municipal, Marta Lorente e Raquel Batet, da Cía. eLe, de Barcelona, ofereceram-nos uma visão possível do eterno conflito de gerações e de como um velho recupera um pouco da sua meninice depois de se cruzar na rua com um rapaz traquinas e de com ele se travar de razões. Da República Checa, Pavel Vangeli apresentou na Fonte dos Combatentes “The Swinging Marionettes”, espectáculo que recorre à técnica do fio para levar o espectador ao encontro dos anjos e demónios que habitam a cidade de Praga, de um espectáculo de circo, de um naufrágio no mar ou de um concerto de esqueletos em pleno cemitério. Quatro histórias divertidas, assentes em marionetas muito belas e numa enorme qualidade técnica do marionestista checo. Finalmente, no Auditório do Orfeão de Ovar, o chileno David Zuazola apresentou “El Juego Del Tempo”, conjunto de “sete peças, de sete minutos cada, de sete realizadores de sete diferentes países”, e que nos fala de bullying duma forma imaginativa e com uma linguagem narrativa que cruza as marionetas com o cinema de terror.

Para a noite do segundo dia estavam reservados dois dos melhores espectáculos deste FIMO. Primeiramente, na Casa da Contacto, Javier Aranda partiu das suas memórias de infância - os tempos passados ao lado da mãe a vê-la costurar, a cesta com agulhas, tesouras, meias velhas e todo um arsenal de sonho e magia -, para nos oferecer “Vida”, uma história muito simples tornada apelativa e particularmente eficaz graças à expressividade, à mímica e à capacidade técnica do espanhol na forma como emprega as mãos para contar a sua história. São mãos que distribuem magia quando se unem para dar vida a formas com as quais nos identificamos, com quem rimos e choramos. Por último, a companhia chinesa Yangzhou Puppetry Institute ofereceu ao muito público presente no Largo do Tribunal o espectáculo “Puppet Collection Highlight”, no qual oito marionetistas fizeram uma demonstração alargada do que de melhor a companhia tem para oferecer no campo das marionetas, manipuladas com a técnica da vara. Um espectáculo que, complementando todos os restantes, permitiu que o público tomasse contacto com a realidade das marionetas a um nível mais alargado e que se mostrou decisivo para elevar esta edição do FIMO a níveis de qualidade nunca antes alcançados.