[Clicar na imagem para ver mais fotos]
CERTAME: Festival Internacional de
Marionetas de Ovar FIMO 2019
Ovar, vários locais
07 > 09 Jun 2019
Ao longo de três dias, o Festival
Internacional de Marionetas de Ovar FIMO 2019 voltou a espalhar magia, colorido e muita animação pelas salas, praças e fontes da cidade, oferecendo
ao público um total de 65 espectáculos por 21 companhias de 14
diferentes países. Promovido pela União de Freguesias de Ovar, São
João de Ovar, Arada e São Vicente de Pereira Jusã, o certame
arrancou na noite de sexta-feira com “Chinese Tradition”,
um espectáculo da companhia Sky Bird Puppet Group que ofereceu ao público alguns belíssimos exemplos de diversidade de
marionetas e das técnicas inerentes à sua animação existente em Hong Kong. O momento em
que Cheung Chun Fai mostrou à plateia um vislumbre do que está
por detrás da manipulação - partilhando com os espectadores alguns exercícios
de aquecimento a exigirem destreza, coordenação e uma enorme
concentração -, revelou-se único, tanto pela interacção com a
assistência como pelo seu carácter formativo.
No átrio da Escola dos Combatentes,
Maru Fernández e Gerardo Martínez, do colectivo uruguaio Coriolis,
apresentaram “Tropo”, uma peça na qual Julián e Ramiro, dois
intrépidos amigos, tratam de devolver aos habitantes de uma
comunidade rural tudo quanto perderam numa devastadora tempestade. De
manipulação directa, marionetas de luva, luz negra e sombras se fez
este espectáculo, recriando um ambiente quixotesco e oferecendo algumas
rábulas deveras divertidas. Para o final deixo propositadamente
“Hullu”, a peça que os franceses do Blick Theatre levaram ao
Centro de Artes de Ovar. Tratou-se dum espectáculo absolutamente à
parte neste Festival, destacando-se de todos os outros pela sua
inventividade, qualidade técnica e momentos absolutamente
surpreendentes, oferecidos ao longo de uma hora de pura magia. A “Hullu”
e ao Blick Theatre voltarei brevemente neste espaço, em análise
crítica separada.
O segundo dia do FIMO – para mim o
último - teve início ainda durante a manhã, no belíssimo espaço
verde do Parque Urbano, com três espectáculos sequenciais e todos
eles tendo nas marionetas de fio o elemento em comum. Do Brasil, a Cia
Tu Mateixa - cujo nome constitui uma homenagem à casa-oficina de
marionetas de Pepe Otal, em Barcelona, onde a actriz Júlia Barnabé
fez uma parte significativa da sua formação – trouxe-nos “Laia
e o Voo da Imaginação”, um espectáculo delicado e sensível,
assente na enorme cumplicidade entre marioneta e marionetista e que
nos diz que não precisamos de sair do nosso quarto para viajarmos até
muito longe, até onde nos deixarmos levar pelo sonho. Acrescentaria
apenas que, se houvesse um prémio para a melhor marioneta, era para
Laia que iria com inteira justiça, toda ela trabalhada em madeira, os movimentos assentes
num impressionante conjunto de 18 fios, olhos articulados e uma
“dimensão humana” verdadeiramente única.
Menos profundo, mas não menos
divertido, The Gipsy Marionettist”, do bósnio Rasid Nikolic, teve
na interacção com o público um dos seus grandes trunfos,
misturando esqueletos que cantam jazz com tigres ferozes, dançarinas
do ventre com o homem mais forte do mundo, o mais charmoso e sedutor
e ainda o maior acrobata, estes três últimos “voluntários”
recrutados entre a assistência. A manhã terminou com “Hanging by
a Thread”, dos Di Filippo Marionette, dupla constituída por Remo
Di Filippo e Rhoda Lopez. Através dele, ao longo de meia hora, vimos
evoluir um violinista, um dançarino de sapateado, uma dona de casa
empunhando uma vassoura, dois rappers, um ciclista acrobata e ainda
Gino, um menino débil e um tanto envergonhado que encontra um
nenúfar. Com um domínio da técnica particularmente apurado e uma
presença de enorme expressividade, Rhoda e Remo ofereceram um
espectáculo que encantou miúdos e graúdos e viria a conquistar o
Prémio do Público deste FIMO 2019.
“A Árvore Cantada”, dos
portugueses Cia Bipolar, foi um dos espectáculos que abriu a tarde,
trazendo as questões ambientais para a ordem do dia. Lançando mão
de um dispositivo cénico muito simples e eficaz e usando a técnica
da manipulação directa, Cátia Vieira falou-nos o papel da água
ao longo das estações do ano e a sua importância para que os
ciclos ligados à natureza se possam repetir e perpetuar. No espaço
fronteiro ao edifício da Câmara Municipal, Marta Lorente e Raquel
Batet, da Cía. eLe, de Barcelona, ofereceram-nos uma visão possível
do eterno conflito de gerações e de como um velho recupera um pouco
da sua meninice depois de se cruzar na rua com um rapaz traquinas e de
com ele se travar de razões. Da República Checa, Pavel Vangeli
apresentou na Fonte dos Combatentes “The Swinging Marionettes”,
espectáculo que recorre à técnica do fio para levar o espectador
ao encontro dos anjos e demónios que habitam a cidade de Praga, de
um espectáculo de circo, de um naufrágio no mar ou de um concerto
de esqueletos em pleno cemitério. Quatro histórias divertidas,
assentes em marionetas muito belas e numa enorme qualidade técnica
do marionestista checo. Finalmente, no Auditório do Orfeão de Ovar,
o chileno David Zuazola apresentou “El Juego Del Tempo”, conjunto
de “sete peças, de sete minutos cada, de sete realizadores de sete
diferentes países”, e que nos fala de bullying duma forma
imaginativa e com uma linguagem narrativa que cruza as marionetas com
o cinema de terror.
Para a noite do segundo dia estavam
reservados dois dos melhores espectáculos deste FIMO. Primeiramente,
na Casa da Contacto, Javier Aranda partiu das suas memórias de
infância - os tempos passados ao lado da mãe a vê-la costurar, a cesta
com agulhas, tesouras, meias velhas e todo um arsenal de sonho e magia -, para nos oferecer “Vida”,
uma história muito simples tornada apelativa e particularmente
eficaz graças à expressividade, à mímica e à capacidade técnica
do espanhol na forma como emprega as mãos para contar a sua
história. São mãos que distribuem magia quando se unem para dar
vida a formas com as quais nos identificamos, com quem rimos
e choramos. Por último, a companhia chinesa Yangzhou Puppetry
Institute ofereceu ao muito público presente no Largo do Tribunal o
espectáculo “Puppet Collection Highlight”, no qual oito
marionetistas fizeram uma demonstração alargada do que de melhor a
companhia tem para oferecer no campo das marionetas, manipuladas com
a técnica da vara. Um espectáculo que, complementando todos os restantes, permitiu que o público tomasse contacto com a realidade
das marionetas a um nível mais alargado e que se mostrou decisivo para elevar esta edição do
FIMO a níveis de qualidade nunca antes alcançados.
Sem comentários:
Enviar um comentário