TERTÚLIAS LITERÁRIAS: “Conversas às 5”,
com Aurora Gaia
Participação especial | Tomás Caroço (piano)
Centro de Reabilitação do Norte
25 Fev 2025 | ter | 17:00
Quando temos fome, o que fazemos é sair à procura de comida. Tem sido assim desde tempos imemoriais, sabendo nós que a produção de alimentos foi a razão pela qual os seres humanos abandonaram o nomadismo e formaram comunidades. Aliás, a própria conformação do corpo humano é fruto da evolução alimentar, na medida em que a necessidade de colher alimentos em pontos cada vez mais altos levou à progressiva alteração da postura física. Mas não é de antropologia que quero falar hoje, nem de necessidades físicas, antes da fome de cultura e da consequente busca de alimento para o espírito. Fome, entenda-se, motivada por um vírus louco que, nos períodos mais críticos, barrou o acesso ao teatro e à dança, ao cinema e aos concertos, às galerias e museus, às conversas e tertúlias. Ora, “se Maomé não pode ir à montanha, pois que venha a montanha a Maomé”, que o mesmo é dizer que dessa fome nasceram as Tertúlias Literárias “Conversas às 5”, persistente prova de amor aos livros e à literatura, a completarem agora o bonito número de vinte edições.
Antes de abordar uma sessão verdadeiramente especial, importa render homenagem e abraçar com a maior emoção e gratidão aqueles que ajudaram a erguer e a consolidar estas “conversas”. Desde logo os escritores Sandra Barão Nobre, Sérgio Almeida, Miguel Araújo, Gustavo Carona, Álvaro Domingues, Minês Castanheira, Pedro Guilherme-Moreira, Rosa Alice Branco, Marta Duque Vaz, André Domingues, Valdemar Cruz, Isabel Rio Novo, Aurelino Costa, Diogo Leite Castro, Cláudia Cruz Santos, Marta Pais Oliveira, Dora Gago e, em dois momentos distintos, João Luís Barreto Guimarães. Foram eles que, desde esse longínquo 27 de Abril de 2021, abriram portas à magia e ao sonho que só os livros podem conter, falando do seu mester, dando a ver as suas obras, falando de outros autores, de outros livros, de novas viagens. Importa estender o agradecimento às muitas centenas de participantes que nos têm dado o prazer da sua presença, mas também àqueles que fazem com que as tertúlias aconteçam, da Administração e Direção Clínica do Centro aos muitos colaboradores nas mais diversas unidade de internamento e áreas terapêuticas.
Em tempo de celebração, a poetisa Aurora Gaia e o pianista Tomás Caroço foram os ilustres convidados de uma sessão que se constituiu num abraço à poesia e à música. Aurora Gaia nasceu no Porto, a 7 de setembro de 1938, tendo vivido longos anos em Gaia e atualmente a viver no Furadouro, Ovar. Desde sempre associada a projetos de cariz cultural, desenvolveu a sua atividade profissional na televisão como caracterizadora. Tem o seu nome ligado ao teatro, em peças como “Um cálice de Porto”, “A dama de copas” e “Felizmente há luar” e ao cinema, tendo participado em longas, médias e curtas metragens, entre as quais se destaca o filme “Uma relação fiel e verdadeira” de Margarida Gil. Publicou dois livros de poesia “E por isso eu amo tanto a Palavra” e “A Palavra na Arte”. Tomás Caroço é médico interno de Medicina Física e de Reabilitação no Hospital de Faro. Iniciou os estudos musicais aos 7 anos no piano, e aos 10 anos na viola d’arco. Concluiu a classe de instrumento (viola d’arco) na Escola de Música do Conservatório Nacional. Actualmente, dedica-se, entre outras áreas, à Medicina das Artes Performativas, tocando regularmente com a Orquestra Médica Ibérica.
“Palavras são como facas que trespassam os nossos sentidos”. Na beleza das palavras, na suavidade dos gestos e na delicadeza e harmonia dos sons, o tempo da sessão foi de emoção e encanto. Os poemas escolhidos foram pretexto para Aurora Gaia render homenagem a alguns poetas da sua predilecção, de João Luís Barreto Guimarães a Eugénio de Andrade, de Aurelino Costa a Amadeu Baptista ou a António Gedeão. “Simplesmente Aurora”, tornada “Gaia” pela “falta de estética” do apelido Carvalhais, Aurora Gaia quis mostrar também alguma da sua poesia e, simultaneamente, mostrar-se a si mesma no amor e apego aos outros, chamando para o pé de si a actriz Luísa Pinto ou a fotógrafa Lauren Maganete. A música foi-se imiscuindo nos poemas e António Pinho Vargas fez-se ouvir em duas peças muito belas, “Tom Waits” e “Dança dos Pássaros”. Chick Corea e um mexido “Armando’s Rhumba” foi outra das peças interpretadas, sendo ainda possível, em fim de festa, ouvir “The Heart Asks Pleasure First”, um dos mais inspirados temas de Michael Nyman. O melhor, porém, chegaria justamente no fim, com Aurora Gaia a cantar uma pérola do Cante, “Para Que Quero Eu Olhos”. Sim, a cantar - “(…) oh és tão linda, oh és tão formosa” - e a encantar. Memorável!
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