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sábado, 20 de abril de 2024

CONCERTO: Abe Rábade



CONCERTO: Abe Rábade
Ovar em Jazz 2024
Centro de Arte de Ovar
19 Abr 2024 | sex | 21:30


A preencher a terceira noite do Ovar em Jazz, Abe Rábade trouxe ao Centro de Artes os sons da Galiza. Entre a magia de uma música de raiz celta e a versatilidade e originalidade que caracterizam o próprio Jazz, o músico e a sua banda abriram clareiras por entre as árvores que povoam os bosques do Noroeste peninsular, apontando aos espaços onde se fundem a ancestralidade e o presente, o místico e o pragmático, o rural e o urbano. Colhendo a inspiração na vegetação autóctone da Galiza, “como um prolongamento das nossas emoções e intuições”, o pianista e compositor de Santiago de Compostela abraçou o projecto “Botánica” e fez questão de presentear o público com um conjunto de temas extraídos deste que é o seu décimo quinto álbum de estúdio em nome próprio. Sobre o palco, além de Rábade, estiveram Davide Salvado na voz e percussões, Daniel Juárez no saxofone tenor, Virxilio da Silva na guitarra, Ton Risco no vibrafone, Jimena Andión no violoncelo, Alejandra López no contrabaixo, Naíma Acuña na bateria e ainda o bailador Miguel Pardo de Castro. Foi este grupo artístico heterogéneo que fez do tempo do concerto um tempo de integração de estéticas musicais e de exploração rítmica e melódica descomplexada e livre. O público gostou.

Um “díptico” inspirado na bétula, ou vidoeiro - árvore cujo tronco é de “um branco quase espectral e com uma folha muito pequenina, muito cantarina” -, abriu o concerto, funcionando como uma espécie de resumo daquilo que iríamos escutar. Mas se a árvore que servia de ponto de partida era a mesma, as músicas mostraram-se tão diferentes entre si como o Inverno do Verão. “Menciñeira Nua” é um tema intimamente ligado à chamada música celta, um género inscrito na world music, ao passo que “Vestida de Bop” vai beber a sua essência às fontes clássicas do Jazz. Este último tema, o mais longo do concerto com os seus doze minutos, teve ainda o condão de “apresentar” os músicos e a sua qualidade instrumental, em solos onde a classe e o virtuosismo de Daniel Juárez, Ton Risco e Virxilio da Silva, sobretudo estes, veio ao de cima. No seu todo, o concerto viria a alternar entre os dois géneros, ora mostrados na sua forma mais genuína e pura, ora correndo ao longo de uma linha de fronteira nem sempre distinguível, misturando-os e confundindo em composições com tanto de refrescante como de vivo e livre.

Firmados os pressupostos, prosseguimos a viagem sobrevoando um bosque de freixos - “cantarei pola túa vida / tu que bailas con bo xeito / de meniño que me miras / entre as poliñas do freixo” - rumo à Serra do Courel e à Devesa da Rogueira. É desse lugar mágico e da sua vegetação que Abe Rábade extrai uma espécie de “suite” onde cabem o Narciso e a Faia, o Castanheiro e o Teixo, numa alusão clara ao ciclo da vida e ao conhecimento que vamos adquirindo com o passar do tempo. Entre os ramos do salgueiro e as folhas do sobreiro, o concerto prosseguiu numa espécie de adoração aos quatro elementos, com a mensagem implícita de uma natureza ameaçada que cabe a todos defender e preservar. Termino dizendo que é legítimo que cada um queira para si o melhor de dois mundos, mesmo sabendo que, as mais das vezes, isso é impossível. A abordagem conjunta a dois géneros que, embora próximos entre si, têm características próprias e fortemente vincadas, faz com que este projecto corra o risco de não agradar “nem a gregos nem a troianos”. Por mim, grego ou troiano que seja, gostaria de ter visto mais Jazz na noite de ontem. Mas não me posso queixar, já que os momentos ligados ao género de forma mais íntima foram preciosos.

[Foto: Ovar/Cultura]

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