CONCERTOS & CONVERSAS: Ovar Expande ’23
Sean Riley
Evaya
Ana Lua Caiano
Escola de Artes e Ofícios
20 Out 2023 | sex | 21:30
Domando a “cena instrumental” que tomou conta do primeiro dia do Ovar Expande ’23, a voz, esse instrumento por excelência, foi marca distintiva comum aos três concertos deste dia intermédio. O público voltou a preencher por completo os espaços da Escola de Artes e Ofícios e a generosidade dos artistas e o valor das suas propostas foram evidências maiores de uma noite que teve de tudo para agradar a todos. Sean Riley (Afonso Rodrigues) assumiu o primeiro momento e, em palco com a sua guitarra acústica e o seu forte carisma, ofereceu-nos um conjunto de temas que constituíram, em si mesmos, uma viagem a dois lugares que lhe são particularmente queridos e que percorreu recentemente na companhia de Paulo “The Legendary Tigerman” Furtado, deles fazendo títulos de trabalhos discográficos: California e Andaluzia. Paisagens desérticas e horizontes a perder de vista casam na perfeição com a voz de Sean Riley, puxando para primeiro plano a música de tradição americana, em particular a folk e os blues. Temas como “L.A.”, “Every Star”, “One Day” ou “Good Kids” cativaram pela sua intencionalidade e despojamento, os vivos aplausos dispensados no final sendo prova de admiração e gratidão por parte do público.
Com uma carreira a dar os primeiros passos (produziu a primeira canção em 2018), a Evaya (Beatriz Bronze) coube a espinhosa missão de suceder a um “peso pesado” e segurar a fasquia num nível particularmente elevado. Desafio aceite, desafio ganho, a artista pôs no Palco Galeria o experimentalismo da sua música e a força das suas palavras, carregando de lirismo o segundo momento da noite. Com Polivalente (“a minha banda”) num plano recuado, Evaya surpreendeu pela sua expressividade e graça, mas sobretudo pela beleza da sua voz e riqueza dos seus poemas. Cantando quase exclusivamente em português, a artista trouxe com ela as certezas de quem tem os pés bem assentes na terra e sabe o que quer. Extraído do tema “Doce Linguagem”, “(…) escolho a Paz / em vez de querer estar certa”, é verso de canção e ideal de vida, arrastando para outra dimensão a intencionalidade do poema. Reveladoras de uma maturidade surpreendente, as mensagens vão-se fazendo anunciar e, devagarinho, acabam por entrar e sentar-se ao nosso lado. “Pertences às palavras / és livre do não-ser.”
A encerrar a noite, Ana Lua Caiano e a sua loop station deram mostras do que são capazes. Com recurso a uma panóplia de instrumentos populares de percussão - o bombo e o adufe, a pandeireta, o brinquinho ou a melódica - e a vocalizações muito simples, a artista cria o ambiente de fundo sobre o qual se derrama uma música de raíz tradicional portuguesa, com versos inspirados num quotidiano feito de mal (me) quereres e corpos em mudança, lembretes e pessoas indecisas, mãos nas mãos e dores de cabeça, malas feitas e adeus. Juntando a uma voz bastante versátil, a harmonia e o bom gosto das composições e uma forte presença em palco, Ana Lua Caiano teve para oferecer uma hora de excelente música, reservando ainda algum tempo para explicar ao público um conjunto de pormenores que estão na base do seu processo criativo. “Cheguei Tarde a Ontem” e “Se Dançar É Só Depois”, títulos dos seus primeiros trabalhos, estiveram na base de um alinhamento onde tiveram igualmente lugar alguns temas originais e que farão parte de um novo álbum a editar no próximo mês de Fevereiro. À saída, a satisfação do público era bem patente nos rostos como nas conversas. Não cessa de se expandir este Ovar Expande!
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