Tende a não ficar na memória o último concerto a que me foi dado assistir no Auditório de Espinho neste ano a caminhar para o final. Com a Orquestra de Jazz de Espinho, em palco estiveram dois ilustres convidados, o pianista Mário Laginha e a fadista Cristina Branco, para um concerto que encerrava a perspectiva de uma grande noite. Porquê? Porque Daniel Dias e Paulo Perfeito vêm a fazer um excelente trabalho com um punhado de jovens que se entregam de alma e coração ao jazz, porque Mário Laginha é um pianista com provas dadas e oferece a garantia de muito empenho e qualidade e porque Cristina Branco é uma grande voz, que não apenas do fado (da minha discoteca fazem parte um número apreciável de trabalhos seus, que revisito amiudadamente com deleite). Se a isto juntar o facto de ser esta a primeira vez que tive oportunidade de escutar Cristina Branco ao vivo, perceber-se-á o quanto de felicidade e beleza antevia no espaço do concerto. Só que não.
Se justificada ou não, a ansiedade foi uma nota indisfarçável na cantora desde o momento da entrada em palco. Não pelo gesto de se benzer ao entrar, mas por aquele constante atirar da cabeça para trás e respirar fundo, tema após tema, como que a dizer de si para si: “Esta já está”. A voz timbrada, melódica, harmoniosa que lhe conhecia desfez-se em hesitações, repentes e lapsos que não era suposto acontecer. A força dos metais da orquestra também não ajudou, de tal forma que os três temas iniciais - “Quando Eu Canto”, com letra de Maria do Rosário Pedreira, o arejado “Alice No País Dos Matraquilhos”, de Sérgio Godinho, e “Cherokee Louise”, letra e música de Joni Mitchell - fazem do arranque do concerto um exercício de sensaboria e tibieza como há muito não me era dado ver. “Ó Laurinda, Linda, Linda” e “Camponês Alentejano” vieram trazer algum alento ao concerto, não pelas melhorias no registo vocal mas porque, finalmente, pode escutar-se Mário Laginha em solos de grande intensidade e riqueza.
Até ao final, o concerto deu mais do mesmo. Cristina Branco continuou a parecer deslocada, Mário Laginha ia fazendo o que podia e a orquestra lá foi cumprindo o seu papel, ainda que muito menos segura em relação àquilo a que nos acostumou. Lucas Oliveira teve uma entrada sem garra no solo de saxofone de “Às Vezes Dou Por Mim” mas acabou em grande e mereceu o enorme aplauso que lhe foi tributado. Na bateria, João Martins esteve ao melhor nível, o mesmo podendo dizer-se de Diogo Dinis, no contrabaixo. Registe-se, em abono da verdade, a interpretação do popular “José Embala o Menino”, o grande momento (único?) de Cristina Branco no Auditório de Espinho. Também “O Amor Quando Se Revela” merece referência, sobretudo pela novidade da versão. “Carta a Miguel Djéje”, de Zeca Afonso, fechou o alinhamento da pior forma, as palavras atropeladas e uma entrada a destempo da cantora a confirmarem uma noite desinspirada. “A Lua Partida ao Meio”, um tema de Mário Laginha cantado a meias pelo próprio e por Cristina Branco”, foi outro equívoco. Melhores dias virão!
[Foto: Auditório de Espinho | facebook.com/auditoriodeespinhoacademia]
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