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sábado, 5 de maio de 2018

CONCERTO: "4 Mãos: Os Esteiros na Ponta da Caneta"



CONCERTO: “4 Mãos: Os Esteiros na Ponta da Caneta”,
de Filipe Raposo (piano) e António Jorge Gonçalves (desenho em tempo real)
Cine-Teatro de Estarreja
04 Mai 2018 | sex | 21:30


Como um poema! Foi assim, “a 4 mãos”, na noite de ontem, no Cine-Teatro de Estarreja. Em palco, num “concerto para piano e caneta”, o encontro improvável entre a música e o desenho em tempo real, protagonizado por Filipe Raposo e António Jorge Gonçalves, traduziu-se num momento poético singular, intimista e particularmente belo. Ao longo de 45 minutos, sob uma música ora dolente e melodiosa, ora nervosa e vibrante, desfilaram ante o olhar do público um conjunto de sequências desenhadas inspiradas nas belíssimas paisagens desta região do Baixo Vouga Lagunar.

Num palco ainda escuro, começam a escutar-se notas indefinidas que se vão traduzindo por pontos e traços no ecrã, como se de uma espécie de código se tratasse. Passados os primeiros momentos, as linguagens começam a articular-se entre si de forma mais clara, a sequência de notas transforma-se em melodia e os pontos e linhas ganham continuidade para formarem um desenho, inicialmente confuso - reticulado informe sobre um fundo escuro -, logo tornado legível com o aparecimento dum barco, um homem com uma vara que o conduz, uma das linhas transformada em canal. De repente tudo faz sentido, um mapa imaginário da ria com os seus esteiros oferece-se aos nossos olhos com toda a definição. Sobre o mapa surgem homens e a geografia dos lugares desloca-se para paisagens interiores, aludindo à pesca, à apanha do sal, ao cultivo dos campos, ao pastoreio do gado, à comunhão com um mundo a pulsar de vida. Vida que é agora ilha, que logo é jangada a transbordar de gente, para no momento seguinte ser cidade do novo mundo, de arranha-céus feita. E o todo reduz-se ao átomo, que deixa de o ser para ser íris e dente-de-leão e pétalas coloridas que se transformam em fogo com o qual o homem se aquece. Pura poesia!...

Baseado em duas linguagens artísticas diferentes, construído numa base de espontaneidade e improviso, “4 Mãos: Os Esteiros na Ponta da Caneta” oferece momentos de enorme beleza, realçando a simbiose entre o homem e a natureza no seu estado mais puro. E tudo de forma tão simples, tão natural, que nos põe um sorriso de felicidade no rosto e um enorme aconchego na alma. Mas este é também um espectáculo sobre a amizade entre duas pessoas que, ao longo do tempo, têm vindo a construir uma cumplicidade que engloba momento, estrutura, textura, evocação e emoção. Filipe Raposo e António Jorge Gonçalves interagem de forma única, evidenciando discursos que se encontram, intersectam, provocam, completam. Com os sentidos à flor da pele, em suspenso, levados nas asas do sonho, assistimos em êxtase ao desenrolar desta(s) história(s). Que nos confortam e animam, que nos enlaçam e aquecem. 

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