Páginas

sexta-feira, 4 de maio de 2018

CINEMA: "Soldado Milhões"



CINEMA: “Soldado Milhões”,
Realização | Gonçalo Galvão Teles e Jorge Paixão da Costa
Argumento | Jorge Paixão da Costa e Mário Botequilha
Fotografia | José António Loureiro
Montagem | João Braz
Interpretação | João Arrais, Miguel Borges, Tiago Teotónio Pereira, Ivo Canelas, Isac Graça, Raimundo Cosme, Carminho Coelho, Graciano Dias, Nuno Pardal, Dinarte Branco, Lúcia Moniz, António Pedro Cerdeira
Produção | Pandora da Cunha Telles e Pablo Iraola
Portugal | 2018 | Guerra | M/12 | 85 minutos
Cinema Dolce Espaço, Ovar
04 Mai 2018 | sex | 16:00


Envolvendo a 2ª Divisão do Corpo Expedicionário Português, a Batalha de La Lys foi um dos episódios mais negativos da participação portuguesa na I Guerra Mundial. Na madrugada de 9 de Abril de 1918, oito divisões alemãs, com cerca de 100 mil homens e mais de mil peças de artilharia, avançaram sobre as forças portuguesas que, apesar de dizimadas – o balanço refere 1341 mortos, 4626 feridos, 1932 desaparecidos e 7440 prisioneiros -, resistiram tempo suficiente para permitir aos aliados suster a ofensiva e recomporem-se. Será precisamente no seio desta dramática história que se destacará um herói acidental, o transmontano Aníbal Augusto Milhais, celebrado pela sua bravura e ficando conhecido como o “Soldado Milhões”.

No ano em que se assinala o centenário do fim da I Guerra Mundial, a história do Soldado Milhões é mostrada em filme. Construída em tempos distintos, buscando uma complementaridade entre os momentos em guerra e fora dela, a história é desenhada de forma séria, tornando verosímil a personagem do Soldado Milhões, especialmente quando o conflito é evocado. As sequências de guerra são duma enorme sobriedade e dignidade, estando em causa menos os recursos limitados da produção e mais a opção estética de remeter o conflito para o íntimo dos seus protagonistas. Não há grandes planos sobre o campo de batalha, divisões de blindados a avançarem em linha e a esmagarem tudo à sua passagem, balas tracejantes a riscarem a noite, sangue a jorrar em bica ou tripas de fora; mas está lá – e sente-se – a raiva, a ansiedade, a loucura e o medo que se esconde em cada linha de trincheira. E está lá, forte como em nenhum outro lugar, o espírito de sobrevivência, a saudade, a amizade e a camaradagem.

“Soldado Milhões” é, por tudo quanto ficou dito, um belo momento de cinema. Mas tem debilidades. A abordagem à história de João Ferreira de Almeida, o “último fuzilado português”, é um erro já que não acrescenta nada ao filme, antes funciona como elemento de dispersão. E depois, factualmente, sabemos que os momentos terríveis vividos pelo Corpo Expedicionário Português tiveram muito a ver com o facto das tropas se encontrarem mal preparadas e insuficientemente equipadas para enfrentar um inimigo poderoso nos campos gelados da Flandres, nesse Inverno e início de Primavera de 1918. Ora, aquilo que nos é dado a ver é precisamente o contrário do que seria suposto, decorrendo a acção num clima estival e em paisagens mais compatíveis com o sul da Europa, quase conseguindo ouvir-se o canto das cigarras. E se esta claríssima falha da produção belisca o filme de forma indelével, temos a excelente interpretação de João Arrais a servir-lhe de contraponto e a justificar, também ele, o nome de “Milhões”. “Actor Milhões”!

Sem comentários:

Enviar um comentário