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quarta-feira, 7 de maio de 2025

TERTÚLIA / ESCUTA COMENTADA: “Oximoro” | João Martins



TERTÚLIA / ESCUTA COMENTADA: “Oxímoro”,
de João Martins
Museu Júlio Dinis - Uma Casa Ovarense
01 Mai 2025 | qui | 10:30


oximoro |csimó| 
(o·xi·mo·ro)

nome masculino
Combinação engenhosa de palavras cujo sentido literal é contraditório ou incongruente (ex: silêncio ensurdecedor é um oximoro). = OXÍMORO, OXÍMORON, OXIMÓRON
Origem etimológica: latim tardio oxymorum, -i, do grego oxúmoron, -ou. “Oximoro”
in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa

O Dia do Trabalhador deu azo a que João Martins pusesse mãos à obra e apresentasse, no ambiente acolhedor e intimista do Museu Júlio Dinis, “Oximoro”, o seu terceiro álbum de estúdio, com edição do Carimbo Porta-Jazz. Ao invés de um formalíssimo concerto, o músico optou por dar a conhecer o álbum através de passagens seleccionadas, revelando o seu conceito, a razão de ser dos títulos dos oito temas que integram o trabalho, as curiosidades que várias das suas passagens abrigam, a aventura do acto de compor, a articulação com os restantes músicos, alguns pormenores da gravação do álbum nos estúdios do CARA - Centro de Alto Rendimento Artístico, o invulgar desenho da capa do álbum, da autoria de Maria Mónica, ou o momento ansiosamente aguardado da sua apresentação ao público, no passado dia 9 de Abril, no portuense espaço Porta-Jazz. Foi uma conversa animada que envolveu Laura Rui, voz do álbum e que também emprestou a sua colaboração ao nível dos sintetizadores, e que teve na interacção com o público um elemento da maior riqueza e dinamismo.

“Como se fosse a apresentação de um livro, só que em versão áudio”. Foi desta forma que João Martins começou por explicar o pressuposto da sessão, na expectativa de que ninguém tivesse vindo ao engano. Poucos, mas bons, os espectadores começaram por ouvi-lo falar do título do álbum, desse “oximoro”, palavra que desconhecia mas que, muito casualmente, serviu na perfeição à intenção do músico em criar um trabalho “que estudasse os opostos, os paradoxos”. Inspirados neste conceito, os temas foram sendo compostos e os títulos surgiram quase naturalmente. “Os Pequenos Passos do Gigante” é o tema de abertura do disco, com o trabalho do sintetizador a sugerir estes pequenos passos, agigantados graças à duração do tema. “Dicotomia Singular”, o tema seguinte, fala do diálogo entre os saxofones de Fábio Almeida e Gabriel Neves, enquanto “Profundamente Superficial” tem a ver com a forma como João Martins sente a diferença entre as várias texturas do tema, acentuadas pelo trabalho de Nuno Trocado na guitarra eléctrica.

Incongruência das incongruências, “A Dança Sem Movimento” é um “bolero camuflado” cujo som vive em parte de uma caixa de ritmos. “Diversificado Incongruente” é a excepção que confirma a regra, já que o título não encerra um oximoro, embora se encaixe na conceptualidade do álbum ao falar das dificuldades que o trabalho de composição implica. “Ligados pela Interrupção” reflecte os silêncios que também são música, ao passo que “O Acaso Planeado”, a balada do álbum, parte de uma base rítmica à qual cada músico deveria acrescentar um tom (embora na prática as coisas não se passassem exactamente assim) e tem numa máquina de escrever um original instrumento. “A Turbulência da Serenidade” é um título que se explica por si só, antecipando um tema onde as diferenças de ritmo, som e textura são notórias. A conversa progrediu entre o que é jazz e o que não é jazz, os espaços para a experimentação e a improvisação, a voz sem poema e os poemas sem voz, o poder catalisador da bateria, os desafios de um estúdio de gravação, uma residência artística que percorreu uma tanoaria, o interior de uma igreja ou o seio de uma floresta. Um momento enriquecedor a muitos títulos, ficando a aguardar-se a sequência lógica desta tertúlia: o concerto de apresentação de "Oximoro" na cidade de Ovar.

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

CONCERTOS & CONVERSAS: OVAR EXPANDE 2024 (I)



CONCERTOS & CONVERSAS: Ovar Expande 2024
Com Bernardo Freire, Joaquim Margarido, Laura Rui, Mazgani, Miguel Araújo, Tiago Alves
Escola de Artes e Ofícios
16 e 17 Out 2024 | qua e qui | 18:30, 21:30 e 22:30


Nascido da vontade de expandir horizontes à nova música portuguesa e de, num enquadramento inovador, trazê-la para mais perto do público, o OVAR EXPANDE está de regresso para a sua quinta edição. Concertos, conversas, oficinas e masterclasses, são, ao longo de quatro dias, vectores de entretenimento, criatividade, inovação e conhecimento, evocando “a arte e o ofício” de fazer e conhecer a música. Numa edição que explora a ligação da música e da palavra à sua dimensão cinematográfica, o certame arrancou na noite da passada quarta-feira com uma conversa moderada por Tiago Alves e que teve como convidado o músico Miguel Araújo. O visionamento de um punhado de videoclips abriu espaço a um saboroso momento de partilha de ideias, opiniões e algumas curiosidades, dando a ver uma faceta menos conhecida de Miguel Araújo, a de (excelente) conversador, disfarçando muito bem a sua timidez (assumida) e aceitando abrir o jogo sobre o seu processo criativo, a ligação entre a música e as imagens dos seus videoclips, as grandes referências musicais (e não só), o desconforto de estar em palco sem uma guitarra ou os medos de quem não sabe dançar.

O segundo dia do OVAR EXPANDE voltou a explorar o cruzamento do cinema com a música, através de uma conversa que reuniu o cantor Mazgani e o crítico de cinema Bernardo Freire. Centrado no filme documental de Rui Pedro Tendinha, “Estrada para Mazgani”, o momento teve moderação de Joaquim Margarido e permitiu desvendar a “estrada” a que o título se refere. De uma humildade tocante, o músico partilhou as histórias que se abrigam em duas décadas de carreira, o olhar apontado em frente. Bernardo Freire ajudou a descodificar o lado “road movie” que o filme de Tendinha ostenta e Mazgani, entre o compromisso com os seus fãs e a aventura de cantar em português, concluiu que “queria era ser Wagner, ser Beethoven, escrever a Sagração da Primavera”. Ainda que sem o estatuto de génio, é um artista carismático, talentoso, com uma forte presença em palco, contagiante de energia e intencionalidade. Foi isso que o público presente na bonita Sala Expande da Escola de Artes e Ofícios pode constatar, no concerto que fechou a noite, no qual o artista revisitou temas como “River of Stone” e “Glowing Horses” ou, recuando um pouco mais, “The Poet’s Death” ou “The Traveler”. A grande novidade esteve, porém, em “A Avenida”, que abriu o concerto, mas também em “Frente Leste” ou “Romanceiro”, a “Chama” ou o fabuloso “Cidade de Cinema”, dando a escutar algumas das pérolas do seu último trabalho discográfico.

Entre a conversa e o momento musical que fechou a noite em verdadeira apoteose, o OVAR EXPANDE abriu a série de oito concertos, como é da tradição, com a chamada “prata da casa”. A dar os primeiros passos, mas já com um conjunto de prestações que abrem em promessa e certeza uma carreira que se adivinha recheada de momentos felizes, Laura Rui chamou à Sala Galeria da Escola de Artes e Ofícios um respeitoso número de aficionados, que a acompanharam entusiasticamente ao longo de uma hora de belíssima música. Com Sofia Queirós no contrabaixo e Sónia Sobral no acordeão, Laura Rui fez do alinhamento deste seu concerto uma sequência de poemas cantados, dos quais emergiu a vontade e a força do ser mulher. Em composições inspiradas, com uma voz feita sussurro breve ou intenso grito, a artista de Ovar levou-nos por caminhos de firmeza e coragem, ao encontro das mulheres de Maria Teresa Horta e de Sophia de Mello Breyner, de Fausto Bordalo Dias, José Afonso e António Gedeão. No breve espaço de uma hora, Laura Rui pôs em palco todo o seu querer, ao mesmo tempo mostrando que conhece bem a estrada que decidiu percorrer. O reconhecimento do público fez-se sentir em ovações prolongadas e sentidas. “Há mulheres que são maré em noites de tardes… e calma”.