CONCERTO: Elicia Silverstein
Festival Internacional de Música de
Espinho
Capela de Santa Maria Maior, Espinho
28 Jun 2019 | sex | 22:00
Local singelo e de enorme significado
para os espinhenses – para quem as histórias e memórias se fundem
na relação íntima com o mar –, a Capela de Santa Maria Maior
acolheu a violinista Elicia Silverstein, na noite da passada sexta
feira, para um concerto no âmbito da 45ª edição do Festival
Internacional de Música de Espinho. Colocando obras de Salvatore
Sciarrino e Luciano Berio ao lado das de Johann Sebastian Bach,
Heinrich Biber e Antonio Maria Montanari, a jovem violinista
nova-iorquina trouxe implícita uma proposta de cruzamento entre a
vanguarda italiana e os sons de um certo barroco mais progressista,
explorando as conexões filosóficas, estruturais e técnicas da
grande música separada três séculos entre si.
Foi sob o signo da espiritualidade que
Elicia Silverstein iniciou o concerto, tocando a passacaglia “O Anjo da Guarda” de Biber, resultando numa demonstração da plasticidade tímbrica do violino, para a qual muito contribuiu o virtuosismo da artista e o próprio ambiente, um local de oração e de meditação sobre o que de mais elevado encontramos nos caminhos da fé. Item maior do repertório violinístico e uma preciosa jóia para os melómanos, a “Sonata nº 1, em
sol menor, para violino solo, BWV 1001” de Bach foi a peça seguinte e veio reforçar a certeza de estarmos perante uma talentosa violinista, capaz de
estabelecer uma relação muito pessoal com o metro e com o ritmo, a
dinâmica de expressão da música de Bach fortemente vincada na sua
interpretação, a polifonia latente.
Partilhando com a peça de Biber toda
uma abordagem melancolicamente etérea, o “Capricho nº 2” de
Sciarrino constituiu uma experiência única, através duma paleta
extraordinariamente rica, feita de longos arranhados, breves momentos
de harmonia perfeita e silêncios subtis, convidando o espectador a
uma imersão no som. Com Montanari e a sua vibrante “Giga (senza
basso), da Sonata de Dresden, em ré menor” regressamos por instantes
ao barroco para logo escutarmos aquele que viria a ser o momento alto
do concerto, a “Sequenza VIII” de Berio. Exemplo de virtuosismo
de composição e de interpretação, a peça relaciona-se, de forma
indirecta, com o princípio da chaconne, remetendo obliquamente para
a “Partita nº 2, em ré menor, para violino solo, BWV 1004” de
Bach, com a qual Elicia Silverstein encerrou o concerto. E se a peça
barroca foi como o “regresso à calma”, o perfeito encerrar de um
ciclo, é a música de Berio, a sua tensão crescente, as explosões
de sons, a jubilante música, que preenche por completo o espectador
e o acompanha muito para além de um tempo de fruição e deleite
ímpar. Inesquecível!
[Foto: facebook.com/fimespinho]
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