CONCERTO: Luisa Sobral
Novembro Jazz
Casa da Criatividade, S. João da
Madeira
09 Nov | sex | 22:00
“Se um dia alguém, perguntar por mim
/ Diz que vivi para te amar / Antes de ti, só existi / cansado e sem
nada para dar”. É aqui, à entrada do refrão de “Amar pelos
Dois”, que Luisa Sobral, vendo a plateia sem reacção, interrompe
a sua interpretação e, entre o espantado e o indignado, diz que “as pessoas
de S. João da Madeira não conhecem esta canção”. À provocação
respondeu o público da forma mais assertiva, acompanhando a cantora,
com entusiasmo, neste verdadeiro “hino nacional”; mas
fazendo-o, digo eu, mais para lhe agradar do que por outra coisa. Por
vontade própria, continuaria em silêncio, saboreando um tema que
pede para ser ouvido como uma oração, em recolhimento, não apenas
pela letra e pela forma sublime como Luisa Sobral o interpreta, mas
também porque remete para tão gratas recordações, daquelas que nos fazem ter
orgulho em sermos portugueses.
Foi este o mote do concerto: Uma Luisa
Sobral com uma voz que é um verdadeiro monumento, os acordes de
Mário Delgado, nas guitarras, a vestirem de sonoridades incríveis
os lindíssimos poemas e, nos intervalos, o diálogo aberto com o
público, revelador do verdadeiro prazer de com ele partilhar a noite
em S. João da Madeira. Uma noite especial, diga-se, não apenas pela
lotação esgotada da sala, o que é sempre uma motivação extra
para qualquer artista, mas também porque aconteceu no dia em que o
seu mais recente álbum de originais, “Rosa”, foi editado. Ao
longo de uma hora e meia, “Rosa” foi a estrela da noite, mas
Luisa Sobral não esqueceu os seus trabalhos anteriores, tendo
presenteado o público com “Paspalhão”, do seu álbum anterior
“Luísa” (2016), logo a abrir o concerto, aos quais foi
acrescentando “Cupido”, do mesmo álbum, o divertido “João”,
do álbum “Lu-Pu-I-Pi-Sa-Pa” (2014), o incontornável “Inês”,
do seu segundo álbum, “There's a Flower In My Bedroom” (2013),
imortalizado em dueto com António Zambujo, e ainda o popularíssimo
“Xico”, do primeiro álbum da cantora, “The Cherry On My Cake”
(2011), “a minha primeira música a passar na rádio”, lembrou a
propósito.
“Rosa” é, contudo, um caso à
parte. Foi-o no concerto, cada tema a brilhar de forma intensa e a
abrir portas para o mundo pessoal da cantora, e é-o no álbum agora
editado, declaradamente um marco na carreira de Luisa Sobral, pela
sua força e verdade, pelo notável trabalho ao nível das letras e
dos arranjos, pela beleza simples e delicada harmonia que dele emana.
É difícil adjectivar temas como “Querida Rosa”, “Benjamim”
ou “O Melhor Presente”, nos quais Luisa Sobral releva o amor
pelos seus dois filhos – os pequeninos José e Rosa -,
oferecendo-lhes um presente de valor inestimável em forma de música.
E que dizer de “Nadia”, o tema de abertura deste último trabalho
e que reflecte sobre a dura realidade dos migrantes que tentam chegar
à Europa a todo o custo? Ou ainda da ternura que se desprende de
“Mesma Rua Mesmo Lado”, “O Verdadeiro Amor”, “Dois
Namorados” ou “Envergonhado”, este último cantado já no
“encore”? Ao contrário do que seria suposto, este foi um concerto completamente à margem do jazz, o que acabou por se revelar um pormenor de somenos, de tal forma a noite se revelou intensa e bela.
Imperdoável será, sobretudo para aqueles que perderam a
oportunidade duma noite única, não correrem para as bancas a
comprar o CD. É verdadeiramente único!
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