CONCERTO: “Ethan Iverson &
Mark Turner”
A Jazz Supreme
Sala Vanni, Florença
26 Out | sex | 21:15
Lentamente dedilhadas, as notas do piano começam a fazer-se ouvir em sonoridades que remetem para um ambiente de profunda nostalgia. É Outono em Florença e as ruas de Oltrarno estão
agora mais sombrias, as folhas descem das árvores e esvoaçam em
espirais de vento, o cheiro das castanhas assadas invade o ar e
revoadas de estorninhos puntilham o céu. Apetece chamar “Piazza
del Carmine” a esta música de formas classicistas, quase
raveliana, que teima em sugerir imagens na nossa mente e que abre o
concerto da dupla nova-iorquina Ethan Iverson e Mark Turner na Sala
Vanni, em Florença, paredes meias com a Capela Brancacci. Trata-se
de “Lugano” e é o primeiro tema do álbum “Temporary Kings”
(ECM, 2018), trabalho de estreia de duas das mais distintas vozes da
cena jazzística actual. Como ficou bem provado neste concerto!
Distanciando-se dum universo
marcadamente intimista, o concerto prossegue com “Giant Steps”,
revisitação de um dos temas maiores de John Coltrane e recriação
das jam sessions de início dos anos 1990, altura em que Iverson e Turner travaram conhecimento, encetando uma carreira incrível nesse
agrupamento maior que dá pelo nome de Billy Hart Quartet e que ainda
recentemente tivemos o prazer de escutar na Casa da Música, com
Joshua Redman no papel de convidado. Depois de um verdadeiro show de
saxofone, regresso a “Temporary Kings” em toada de blues com
“Unclaimed Freight” e depois com “Myron's World”, uma balada
pungente da autoria de Mark Turner, de novo de cariz clássico e
dedicada ao irmão.
Para a parte final do concerto estava
reservado um dos momentos mais altos com a interpretação de
“Chelsea Bridge”, um tema de Billy Strayhorn gravado
originalmente por Duke Ellington. Da interpretação magistral de
Iverson e Turner sobra um sentimento de felicidade indescritível,
uma Ponte Vecchio a unir Florença e Nova Iorque, o mesmo ar outonal
da Piazza della Signoria a espelhar-se pela Quinta Avenida, as
árvores tingidas de vermelho no Giardino di Boboli como no Central
Park. A terminar, ainda o álbum “Temporary Kings” e o tema
“Dixie's Dilemma”, uma composição de Warne Marsh onde a
melodia, harmonia e ritmo se revelam de forma esplendorosa na “voz” instrumental da dupla. O ponto
final mais que perfeito num concerto absolutamente extraordinário!
[Foto: Wall Street Journal / wsj.com]
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