CONCERTO: “Liberdade25”
Sérgio Godinho & Os Assessores
Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha
16 Mar 2024 | sab | 21:30
Seis anos passados sobre o último concerto, volto ao sempre saboroso e apetecido frente a frente com Sérgio Godinho e a sua música. Uma espécie de ciclo que se repete, no recordar de músicas e poemas que são uma parte de mim, inscritos de forma indelével no conjunto das minhas mais gratas memórias, banda sonora dos meus ideais de liberdade e democracia. Aqueles que viveram as alegrias do “dia inicial inteiro e limpo”, que fizeram da esperança certezas e se deram as mãos por uma sociedade mais justa e melhor, sabem o quanto da força da luta se abriga nas canções de intervenção, na razão do seu protesto, no tocar a reunir que se ergue das vozes de Zeca Afonso ou José Mário Branco, de Luís Cília, Adriano Correia de Oliveira, Fausto Bordalo Dias, Manuel Freire ou, claro está, Sérgio Godinho. Esse mesmo Sérgio Godinho de quem guardo discos de muitas décadas, nomeadamente o “Pano Cru”, de 1978, LP inaugural da minha colecção, comprado com um dos meus primeiros salários. São infindáveis as vezes que o ouvi no gira-discos lá de casa…
Assistir a um concerto de Sérgio Godinho - e são já muitos os regressos ao longo dos anos -, é tornar aos tempos em que mandávamos cartas em papel perfumado, exigíamos os pontos nos iis, queríamos todos ser Etelvinas e abraçávamos os pequenos nadas de que a vida é feita. É por isso que oportunidades como esta, espécie de cursos de actualização e aperfeiçoamento, não se podem perder. Mesmo se a idade do cantor já pesa bastante. Mesmo se a voz perdeu muito da sua elasticidade e a energia em palco já não é o que era. Mas este é homem é eterno, continua a “dar o litro”, o brilhozinho nos olhos quiçá mais intenso e vivo, as palavras avisadas sempre atentas na denúncia do trabalho infantil, na mão dada aos imigrantes, na lembrança de que a liberdade não está a passar por aqui. Foi isto que vivemos e sentimos ao longo de uma hora e três quartos de emoções fortes, gargantas ao rubro, aplausos vibrantes e dois regressos ao palco em “encores” mais do que reclamados. Sempre na certeza de que, aqui e agora, este é o primeiro dia do resto das nossas vidas.
Cobrindo um arco temporal de mais de meio século, onde cabem vinte álbuns de estúdio e dez gravações ao vivo, o concerto teve o seu início com “O Rei do Zum-Zum”, do álbum “Ligação Directa” e chegou ao fim com “Liberdade”, essa canção icónica do álbum à “Queima Roupa”, que nos põe a cantar a paz, o pão, habitação, saúde, educação. Pelo meio jogámos ao boxe e tocámos bateria, fomos grão da mesma mó, dançámos no mundo, pusemo-nos em guarda, juntámo-nos ao coro das velhas, tivemos cuidado com as imitações e, até não se poder mais, jogámos, bailámos e cantámos. Recordámos canções menos conhecidas como “Na Prisão”, “Benvindo Sr. Presidente” e “Foi a Trabalhar”, escutámos “O Fugitivo” com o coração apertado, abraçámos Zeca Afonso com os “Vampiros” e José Mário Branco com “O Charlatão” e “Mariana Pais” e lembrámos que foi precisamente há 50 anos que teve lugar o Levantamento das Caldas, prenúncio de um 25 de Abril que não tardou. Os aplausos ainda ecoam ao deixar para trás o CCC numa noite memorável. Hoje soube-me a tanto. Portanto, hoje soube-me a pouco.
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