EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Os Insubmissos”,
de James Nachtwey
Centro Português de Fotografia
04 Mar > 30 Abr 2023
“A barbárie e a insensatez do ataque russo são inacreditáveis, mesmo quando eu vejo com os meus próprios olhos. O bombardeamento de residências civis, os disparos dos tanques à queima-roupa sobre casas e hospitais, o assassínio de não-combatentes em áreas ocupadas militarmente, fazem parte das tácticas usadas numa guerra que foi desencadeada sobre um estado soberano vizinho e não ameaçador... Pessoas “comuns” continuam a demonstrar uma coragem e determinação extraordinárias, se não mesmo teimosia, diante da imensa perda de vidas e destruição.” No final de mais um dia extenuante em cenário de guerra na Ucrânia, James Nachtwey enviou este texto no qual se adivinha o título da exposição. As palavras do multipremiado fotojornalista mostram-se em linha com o que dizem e revelam os fotógrafos de guerra em Bucha, Irpin e noutras localidades, reportando aquilo que Vladimir Putin insiste que o povo russo chame de «operação militar especial». Recusando-se a desviar o olhar dos verdadeiros custos do conflito, Nachtwey posiciona-se nessa missão maior que consiste em impedir que o mundo o faça.
Mostradas anteriormente em Coimbra, no âmbito do Prémio Estação Imagem 2022, as dez fotografias que compõem esta exposição preenchem o espaço de uma das enxovias da Cadeia da Relação, abrindo-se ao nosso olhar em desolação e dor. Trata-se de um “regresso” a Bucha, cenário de numerosos crimes de guerra, denunciados há escassos meses neste mesmo espaço pela lente do fotojornalista australiano Daniel Berehulak [ver “O Inverno Vermelho de Bucha”]. Na mulher que se ajoelha junto ao corpo do marido morto com um tiro na cabeça, no olho aberto e baço de mais uma das vítimas mortais do conflito que “espreita” de um saco para cadáveres ou no olhar perdido de um voluntário ucraniano que, de arma a tiracolo, ampara e abraça um idoso, após o ter ajudado a atravessar um rio, encontramos a mesma estupefacção e horror que preencheu o nosso olhar e a nossa mente face às dezenas de corpos exumados de uma vala comum e outros caídos nas ruas, nos quintais ou no interior das suas casas, abatidos de forma indiscriminada, que Berehulak já nos mostrara. Em qualquer dos casos a mesma interrogação: Porquê?
Considerado uma lenda viva do fotojornalismo, James Nachtwey mostra, aos 74 anos, um forte apego à sua profissão. Tímido e reservado, gosta de mergulhar em pensamentos filosóficos, usando a fotografia como uma arma pacífica para documentar a desigualdade e os conflitos sociais. Mas reconhece que a sua é uma luta inglória, patente na cada vez menor aceitação e interesse pelo seu objecto de trabalho, face a uma sociedade obcecada por imagens de entretenimento, celebridades e moda. Embora reconheça que perseguir a dor, a morte e a desgraça alheia possa ser visto como uma forma de exploração e sensacionalismo, o fotógrafo contrapõem com uma verdade insofismável ao dizer-nos que seria ainda pior permitir que a miséria humana permanecesse clandestina e fora do alcance de uma acção. Duas curtas frases preenchem o rosto da sua página pessoal [AQUI]: “Tenho sido uma testemunha, e estas imagens são o meu testemunho. Os eventos que registei não devem ser esquecidos e não podem repetir-se”. “Os Insubmissos” prolonga-se até ao dia 30 de Abril e é uma exposição a não perder.
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