DANÇA | MÚSICA: “Timber”
Direcção | Roberto Olivan
Assistente de ensaios | Cátia Esteves
Criação e interpretação | João Cardoso, Vanessa Cunha, Mafalda Cardoso, Liliana Oliveira, Ricardo Machado, Sara Garcia
Música | Michael Gordon
Direcção musical | Miquel Bernat
Interpretação musical | Drumming GP (André Dias, Daniel Araújo, João Miguel Simões, Jorge Pereira, Miquel Bernat, Pedro Góis)
Desenho de som e sonoplastia | Süse Ribeiro
Produção | Companhia Instável
Auditório de Espinho - Academia
24 Fev 2023 | sex | 21:30
Mantendo a aposta em dar a ver as amplas possibilidades que a música oferece na articulação entre os seus mais variados géneros ou na forma como se relaciona com outras linguagens artísticas, o Auditório de Espinho teve para oferecer na noite de ontem um espectáculo que vive da interacção entre percussão e dança. De um ponto de vista musical, “Timber” aposta na criação de paisagens sonoras que possam abrir espaço ao movimento e lhe sirvam de alimento. Coreograficamente, importa garantir a necessária fluidez entre bailarinos e percussionistas, rompendo com a dimensão tradicionalmente estática do músico e, ao mesmo tempo, adequando o movimento a um espaço que ora se abre, ora se fecha, como se de um respirar se tratasse. Para levar a cabo tão interessante quanto intenso desafio, em palco estiveram seis bailarinos da Instável - Centro Coreográfico e seis percussionistas do Drumming - Grupo de Percussão, sob a direcção do premiado coreógrafo Roberto Olivan e com música ao vivo do compositor nova-iorquino Michael Gordon. O resultado não poderia ser mais surpreendente.
Sendo difícil de pegar numa ponta por onde começar, agarro-me ao título do espectáculo, a esse “timber” que, em inglês, significa “madeira”. É ela a base da componente sonora do espectáculo, seis tábuas cortadas com diferentes dimensões, seis instrumentos aos quais correspondem diferentes tonalidades. Uma espécie de simantras, percutidas com baquetas que podem variar, permitindo alargar o leque de sons e criar melodias minimalistas onde a harmonia e o ritmo são elementos dominantes. Quem teve a oportunidade de assistir, neste mesmo espaço, a “Music For 18 Musicais”, de Steve Reich, com interpretação do Drumming GP, sabe perfeitamente de que música estou a falar e do que este grupo é capaz ao nível da percussão. Uma vez mais, a música contaminou o espaço com a sua ondulação insidiosa, transformando o momento numa experiência imersiva, hipnotizante, cuja força e energia nos prendeu ao seu âmago e nos predispôs para melhor percebermos o seu enquadramento e alcance no âmbito da peça.
O programa falava de “Timber” como “uma viagem às profundezas da nossa existência, uma visita a cada recanto que deixamos de visitar devido ao medo, ignorância ou abandono de nós mesmos. Uma desconexão pessoal daquilo que nos une à nossa única e autêntica natureza.” Pode ser que sim, pode ser que não. “A arte não se explica”, disse Ana Figueira, fundadora da Instável, no início de uma conversa com o público que teve lugar após o espectáculo, e esta afirmação deixa-me mais confortável. Há duas partes muito distintas na vertente de dança de “Timber”, sendo que a primeira tem apontamentos coreográficos interessantes mas não chega a deslumbrar. Aprecia-se a fisicalidade, o domínio do espaço, o constante estado de alerta dos bailarinos, mas parece tudo demasiado marcado, rígido, imperativo. A segunda metade corresponde a uma desaceleração, com uma enorme interacção entre músicos e bailarinos e uma maior liberdade de movimentos. Os últimos minutos são verdadeiramente sufocantes, as emoções à flor da pele, a gestualidade frenética dos bailarinos a contaminar o público e a transmitir-lhe um conjunto de sensações que vão da dor e do sofrimento à perda e à loucura. A rever, se possível!
[Foto: Auditório de Espinho - Academia | https://www.facebook.com/auditoriodeespinhoacademia]
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