Chama-se Leonilson e foi um dos grandes expoentes de um movimento da arte brasileira que ficou conhecido como Geração 80. Ao lado de Daniel Sesini, Leda Catunda, Beatriz Milhazes, Luiz Zerbini e muitos outros artistas que integraram este movimento artístico, celebrou o fim da ditadura militar brasileira em meados dos anos 1980 e assumiu a recém-adquirida liberdade com um estilo de pintura gestual, colorido e expressivo. Por estes dias, ele é uma das figuras em destaque na programação do Museu de Arte Contemporânea de Serralves com “Leonilson Drawn 1975 – 1993”, primeira grande retrospectiva da obra do artista brasileiro no nosso país. Das primeiras pinturas até aos bordados introspectivos dos últimos anos do artista, o visitante tem à sua disposição uma selecção de cerca de 250 trabalhos dos mais de 3.400 que produziu em vida, oferecendo uma panorâmica geral de toda a sua obra.
Leonilson nasceu em Fortaleza, estudou arte em São Paulo, mas acabaria por abandonar os estudos para se dedicar exclusivamente à prática artística. As suas primeiras obras revelam já os fundamentos de uma arte que, mais tarde, viria a ser caracterizada por uma elaborada transformação de materiais quotidianos em delicados objetos poéticos. Vogue Ideal (Fanzine), 1976, é como o título indica uma versão fanzine da revista Vogue e denuncia o fascínio do artista pela moda, embora exteriorizando uma posição claramente crítica da construção tradicional da identidade de género e do fosso social entre pobres e ricos. As viagens são um dos motivos primordiais da sua obra, permitindo-lhe participar em mostras colectivas e expor em galerias de Milão, Madrid, Bolonha, Paris e Amesterdão, mas também diversas cidades alemãs. Uma visita a Nova Iorque representa um momento-chave na carreira do artista, levando-o a adoptar o tecido como suporte principal da sua prática artística e o bordado como técnica; por outro lado, inspirou-o a considerar o corpo adornado com imagens bordadas como um território vulnerável, que aos seus olhos se identificaria com o Eu.
Quando Leonilson é diagnosticado com SIDA, em 1991, a sua linguagem visual sofre uma profunda alteração. Os sete desenhos da série O perigoso, 1992, em cujo primeiro desenho Leonilson incluiu uma gota do seu sangue HIV-positivo, constituem uma declaração pública subversiva da sua orientação sexual e da sua luta pessoal. Numa fase mais avançada, Leonilson já só era capaz de trabalhar com tecido, agulha e linhas. Menos autobiográficos quando comparados com os trabalhos prévios, os bordados deste período podem ser entendidos como autorretratos, em que os tecidos leves são predominantemente usados como símbolos de uma vida que se apaga. Também em 1991, Leonilson começa a fazer desenhos para ilustrar uma coluna semanal no jornal Folha de São Paulo. Em toda a prática artística de Leonilson é recorrente uma iconografia cristã, sobretudo patente em “Instalação sobre duas figuras”, 1993, a qual é constituída por peças das suas próprias camisas e lençóis colocados em cadeiras ou cabides como figuras antropomórficas. As palavras bordadas transmitem ideias como entrega total, a hipocrisia da Igreja, o desejo e Lázaro, figura bíblica que simboliza a ressurreição.
[Texto baseado na Folha de Sala que acompanha a exposição]
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