CONCERTO: “Crónicas da Intimidade de Uma Guitarra Azul” | Mafalda Veiga
Cine-Teatro de Estarreja
18 Jul 2020 | sab | 21:30
Quando, com apenas 22 anos de idade, Mafalda Veiga lançou o seu primeiro álbum de originais, os meus gostos musicais estariam próximos de atingir a maturidade. Estávamos em 1987 e os cantautores portugueses impunham-se no topo das minhas preferências, as letras assumindo uma elevada cotação na bolsa de valores de cada tema. E assim, não foi difícil inscrever “Pássaros do Sul” na lista dos trabalhos que mais escutei e cantei nesses tempos insanos, enfileirando-o ao lado dos mais amados, tão ricos os seus poemas, tão delicadas as melodias, tão harmoniosa a voz da cantora. O mesmo sucedeu com os álbuns seguintes, sobretudo com o inigualável “A Cor da Fogueira”, editado quase uma década depois. Ao olharmos para trás vemos como o tempo passa demasiado depressa (“só quando dói é devagar”). A cantora dobrou já os cinquenta anos de vida, mas escutá-la continua a dar o mesmo gozo de sempre. Fiel a si própria, Mafalda Veiga faz da sua música um convite à viagem, ao encontro dos lugares onde fomos e somos felizes. E nós embarcamos com ela, sem hesitações.
Ao Cine-Teatro de Estarreja, trouxe a cantora “Crónicas da Intimidade de Uma Guitarra Azul”, projecto a solo ancorado nalguns dos maiores êxitos da sua carreira. Nele encontramos, no meio de vinte temas, canções tão belas como “Cúmplices”, “Imortais”, “Estrada”, “Cada Lugar Teu”, “O Lume” ou “Restolho”. Através dele regressamos a outros projectos de referência da carreira da cantora e que remetem para Rui Reininho, João Pedro Pais, o músico brasileiro Lenine, esse “monstro sagrado” que é Elvis Presley e, até, um tema escrito para a novela “Olhos de Água” (2001). Com ele, abraçamos essa onda intimista que se desprende da artista sozinha em palco em diálogo com o público, fazendo-nos revisitar, de forma nostálgica, lugares e estados de alma, paisagens idílicas e objectos com tanto para contar, das cassetes analógicas a uma guitarra verdadeiramente azul, que isto de o concerto ter o nome que tem não é por acaso.
Pegando nas pistas que entretanto fui deixando, fica o leitor com uma ideia aproximada do que foi o concerto do passado sábado, em Estarreja. Um concerto que foi uma prova de fogo para a cantora, o nervosismo à flor da pele no regresso aos palcos de forma presencial, após quatro meses de confinamento forçado pela pandemia. Um concerto cujo alinhamento cruzou razão e coração, as canções certas no momento certo, as palavras do tema de abertura afirmativas, como um grito: “Esta é uma noite para comemorar / Qualquer coisa que ainda podemos salvar do tempo / Um lugar para nós / Onde demorar / Quando nada faz sentido / E se fica mais perdido / E se anseia pelo abraço de um amigo”. Depois foi o que já disse e mais, ainda, os parabéns que se cantam a um amigo, a esperança de que vamos ultrapassar bem o momento difícil que todos vivemos, a música dedicada ao público que confia e sabe dizer presente. Num abrir e fechar de olhos, o concerto chegou ao fim. A despedida fez-se com “Restolho”, o público na sala a cantar em surdina, o coração leve de tão cheio: “E a vida não é existir sem mais nada / A vida não é dia sim, dia não / É feita em cada entrega alucinada / Para receber daquilo que aumenta o coração”.
Cine-Teatro de Estarreja
18 Jul 2020 | sab | 21:30
Quando, com apenas 22 anos de idade, Mafalda Veiga lançou o seu primeiro álbum de originais, os meus gostos musicais estariam próximos de atingir a maturidade. Estávamos em 1987 e os cantautores portugueses impunham-se no topo das minhas preferências, as letras assumindo uma elevada cotação na bolsa de valores de cada tema. E assim, não foi difícil inscrever “Pássaros do Sul” na lista dos trabalhos que mais escutei e cantei nesses tempos insanos, enfileirando-o ao lado dos mais amados, tão ricos os seus poemas, tão delicadas as melodias, tão harmoniosa a voz da cantora. O mesmo sucedeu com os álbuns seguintes, sobretudo com o inigualável “A Cor da Fogueira”, editado quase uma década depois. Ao olharmos para trás vemos como o tempo passa demasiado depressa (“só quando dói é devagar”). A cantora dobrou já os cinquenta anos de vida, mas escutá-la continua a dar o mesmo gozo de sempre. Fiel a si própria, Mafalda Veiga faz da sua música um convite à viagem, ao encontro dos lugares onde fomos e somos felizes. E nós embarcamos com ela, sem hesitações.
Ao Cine-Teatro de Estarreja, trouxe a cantora “Crónicas da Intimidade de Uma Guitarra Azul”, projecto a solo ancorado nalguns dos maiores êxitos da sua carreira. Nele encontramos, no meio de vinte temas, canções tão belas como “Cúmplices”, “Imortais”, “Estrada”, “Cada Lugar Teu”, “O Lume” ou “Restolho”. Através dele regressamos a outros projectos de referência da carreira da cantora e que remetem para Rui Reininho, João Pedro Pais, o músico brasileiro Lenine, esse “monstro sagrado” que é Elvis Presley e, até, um tema escrito para a novela “Olhos de Água” (2001). Com ele, abraçamos essa onda intimista que se desprende da artista sozinha em palco em diálogo com o público, fazendo-nos revisitar, de forma nostálgica, lugares e estados de alma, paisagens idílicas e objectos com tanto para contar, das cassetes analógicas a uma guitarra verdadeiramente azul, que isto de o concerto ter o nome que tem não é por acaso.
Pegando nas pistas que entretanto fui deixando, fica o leitor com uma ideia aproximada do que foi o concerto do passado sábado, em Estarreja. Um concerto que foi uma prova de fogo para a cantora, o nervosismo à flor da pele no regresso aos palcos de forma presencial, após quatro meses de confinamento forçado pela pandemia. Um concerto cujo alinhamento cruzou razão e coração, as canções certas no momento certo, as palavras do tema de abertura afirmativas, como um grito: “Esta é uma noite para comemorar / Qualquer coisa que ainda podemos salvar do tempo / Um lugar para nós / Onde demorar / Quando nada faz sentido / E se fica mais perdido / E se anseia pelo abraço de um amigo”. Depois foi o que já disse e mais, ainda, os parabéns que se cantam a um amigo, a esperança de que vamos ultrapassar bem o momento difícil que todos vivemos, a música dedicada ao público que confia e sabe dizer presente. Num abrir e fechar de olhos, o concerto chegou ao fim. A despedida fez-se com “Restolho”, o público na sala a cantar em surdina, o coração leve de tão cheio: “E a vida não é existir sem mais nada / A vida não é dia sim, dia não / É feita em cada entrega alucinada / Para receber daquilo que aumenta o coração”.
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