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domingo, 13 de janeiro de 2019

VISITA GUIADA: "O Porto dos Britânicos"


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VISITA GUIADA: “O Porto dos Britânicos”
Orientada por | César Santos Silva
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
12 Jan 2019 | sab | 10:00


Enquanto aguardam com natural expectativa o início da primeira Visita Guiada de 2019 promovida pela Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos, várias dezenas de pessoas vão-se juntando no outrora Campo Pequeno*, bebendo os débeis raios de sol que atravessam as árvores nuas de folhas, assim procurando espantar o frio. Para este dia, o historiador César Santos Silva propôs “O Porto dos Britânicos”, um tema deveras aliciante para mais um momento único de descoberta e partilha de conhecimentos e que irá decorrer sob a influência das palavras da escritora Rose Macaulay, também ela historiadora e que, nos anos 50 do século passado, escreveu “Os Ingleses no Porto”, obra de referência para a compreensão da importância dos britânicos na dinâmica da cidade: “É no Porto que encontramos a colónia mais retintamente britânica que jamais se estabeleceu no estrangeiro”.

Nos traços de ilustres britânicos que marcaram a história da cidade e que deixaram obra que perdura até aos nossos dias, os oitenta participantes começaram por visitar o Cemitério dos Britânicos da Igreja de Saint James, espaço que se abriga por detrás de altos muros, a denunciar os anos em que a Inquisição em Portugal perseguia as religiões que não a católica. Do monumento de homenagem aos britânicos envolvidos nas Primeira e Segunda Guerras Mundiais, às sepulturas dos combatentes da comunidade britânica, em mármore branco e carimbado com o símbolo e a inscrição “Royal Air Force”, da urna onde está sepultado John Whitehead, um dos impulsionadores da arquitectura urbanística do Porto, ao túmulo do Barão Joseph James Forrester, que não o é na verdade, já que os seus restos mortais nunca foram achados, é todo um livro de História que se abre ao olhar do visitante, despertando-o para realidades até então desconhecidas.

Segunda paragem no roteiro, o Palácio de Cristal foi recordado na forma clássica que precedeu o actual edifício, evocando o seu autor, o arquitecto britânico Thomas Dillen Jones e as vicissitudes sofridas ao longo de quase 100 anos (1865 – 1951) e que fizeram do palácio, nas palavras do Professor César Santos Silva, “um elefante branco”. A visita prossegue e as histórias sucedem-se: O Museu Nacional de Soares dos Reis, com a sua imponente fachada neo-clássica, que abriga nas traseiras o que resta do Real Velódromo Maria Amélia, inaugurado em 1894, com um britânico a tornar-se no primeiro velocipedista a vencer aqui uma corrida; o busto de Arthur Wellesley, 1º Duque de Wellington, recordando as Guerras Peninsulares e os aliados britânicos durante as Invasões Francesas; o já demolido Museu Portuense da Rua da Restauração ou Museu Allen, criado no segundo quartel do século XIX por João Francisco Allen, um coleccionista inveterado que chegou a reunir quase seis centenas de telas; o Hospital de Santo António, começado a construir em 15 de julho de 1770 segundo o projecto de John William Carr, arquitecto britânico que nunca esteve em Portugal; ainda o Antigo Clube Inglês, cujo terraço assenta numa das torres da muralha fernandina e que a partir de 1923 recebeu a sede do Oporto British Club, lugar de encontro da comunidade britânica no Porto.

Descendo a Rua de Belomonte em direcção à Rua de Ferreira Borges e à Praça do Infante, penetramos no coração financeiro da cidade, verdadeiramente a “baixa” do Porto, desde logo ao encontro do Instituto do Vinho do Porto. Aqui se condensam séculos de história em torno do cultivo da vinha em Portugal e, mais recentemente, desse produto-chave da economia nacional que é o próprio Vinho do Porto. A par com o da emblemática Dona Antónia Adelaide Ferreira, mais conhecida por Ferreirinha, aqui se fundem nomes como os de Cockburn ou Warre, Symington ou Croft, Delaforce ou Forrester, Sandeman ou Warre, verdadeiras instituições no comércio do Vinho do Porto, que persistem com invejável pujança no território negocial e que são símbolos inequívocos da portugalidade no mundo. O Palácio da Bolsa serve de pretexto para evocar alianças comerciais seculares com o Reino Unido e lembrar o início duma nova dinastia em Portugal com D. João I e a sua união a Dona Filipa de Lencastre, precisamente uma britânica. A visita viria a terminar na antiga Rua Nova dos Ingleses, junto à Feitoria Inglesa, a única Factory House das muitas que existiram em todo o mundo que sobreviveu até aos nossos dias. Sem ser possível visitar o interior do edifício, o Professor César Santos Silva deixou-nos a evocação dos Wednesday Lunches, da galeria de retratos ou da monumental cozinha, situada no último andar e que conserva ainda todo o equipamento original e a baixela primitiva.

As marcas dos britânicos no Porto não se quedam por aqui mas isso, obviamente, representa uma das facetas mais interessantes deste tipo de iniciativas, convidando à pesquisa e à descoberta a título individual. Entre os muitos aspectos por explorar, ficam algumas sugestões: Os primeiros taxis que circularam na cidade eram similares aos taxis londrinos; o serviço telefónico português cuja concessão foi entregue em 1887 à Anglo-Portuguese Telephone, exercendo a sua actividade em Portugal ao longo de setenta anos e que nos deixou a título de herança as típicas cabinas telefónicas que ainda se podem encontrar na cidade; as empresas têxteis como a William Graham ou a Coats & Clark; o Oporto Cricket & Lawn Tennis Club, fundado em 1855, o mais antigo clube da cidade; a Oporto British School, prestes a completar 125 anos de vida e que foi, no continente europeu, a primeira escola oficial inglesa; o Hospital dos Ingleses, encerrado graças às políticas do Estado Novo; também o Futebol e o grande emblema da cidade, fundado em 28 de Setembro de 1893 por António Nicolau de Almeida, um comerciante de Vinho do Porto, e que recebeu o nome de baptismo de Foot-Ball Club do Porto. Ficam as dicas e fica a promessa de nova Visita Guiada para a tarde de 26 de Janeiro, a assinalar o primeiro aniversário do Núcleo Museológico da Confraria. A não perder!


* Antes da implantação da República, chamava-se “Campo Pequeno” (ou “Piqueno”, seguindo a grafia da época) ao actual Largo da Maternidade de Julio Dinis, da mesma forma que o Campo 24 de Agosto era o Campo Grande, um trecho da Rua do Bonjardim se designava Bairro Alto e a Rua da Prata correspondia a uma parte da actual Rua do Bonfim.

sábado, 22 de setembro de 2018

VISITA GUIADA: "O Porto de D. Pedro IV"


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VISITA GUIADA: “O Porto de D. Pedro IV”
Orientada por | Professor César Santos Silva
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
22 Set 2018 | sab | 10:00


Com quase seis dezenas de participantes - “gente suficiente para fazer uma revolução liberal (!)”, nas palavras bem humoradas do Professor César Santos Silva –, decorreu na manhã de hoje mais uma Visita Guiada promovida pela Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos. “O Porto de D. Pedro IV” serviu de assunto a uma jornada de conhecimento e convívio que teve o seu início na Praça do Exército Libertador e terminou na Rua de Cedofeita. Ao longo de duas horas falou-se de D. Pedro IV, naturalmente, mas falou-se de muitas outras coisas também, ou um dos lemas do orientador da visita não fosse o de que “tudo tem a ver com tudo”.

Baptizado como Pedro de Alcântara Francisco António João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon, D. Pedro IV tem o seu nome ligado a alguns dos mais importantes acontecimentos políticos da vida portuguesa na primeira metade do século XIX. Nascido em Queluz em 12 de Outubro de 1798, filho do Rei D. João VI e de D. Carlota Joaquina, D. Pedro teve uma infância marcada pelo instável ambiente familiar e pelos acontecimentos sociais e políticos, desde os ecos da Revolução Francesa às ameaças napoleónicas, culminando na fuga da corte para o Brasil perante as invasões francesas, em 1807. Foi precisamente por aqui que esta verdadeira aula de história começou, encerrando com ela um convite aos presentes a que mergulhassem na sequência de momentos conturbados que se seguiram, como a proclamação da independência do Brasil em 7 de Setembro de 1822, as duas coroas a que D. Pedro abdicou (e que até poderiam ter sido quatro, caso tivesse aceite as coroas de Espanha e da Grécia, que seriam suas por imposição sucessória) ou, sobretudo, o empenho pessoal do “apenas” Duque de Bragança na solução do tremendo conflito interno que se vinha a agudizar entre absolutistas e liberais desde que D. Miguel tomou conta do trono e rasgou, literalmente, a nova Carta Constitucional.

Numa sombra precária em manhã de autêntico Verão, fala-se então da expedição militar composta por menos de 7.000 homens, um terço dos quais mercenários, e que, dos Açores, chegará às costas portuguesas em 09 de Julho de 1832. São eles “os bravos do Mindelo”, uma incorrecção histórica já que o local do desembarque foi na praia do Pampelido da Memória, na freguesia de Lavra, concelho de Matosinhos e não no Mindelo, uma freguesia do concelho de Vila do Conde. Reposta a verdade – e depois de “pararmos” numa tasca de onde provinha um delicioso aroma a peixe frito, que saciou D. Pedro deixando-o farto mas que o levou a confessar estar falido … tendo o tasqueiro ficado f***** -, estamos pois em plena Praça do Exército Libertador (mas que será sempre o Carvalhido), percebendo que foi por aqui que as tropas liberais entraram na cidade - os miguelistas a cometerem um erro crasso já que, com os seus 80.000 homens, facilmente teriam esmagado a investida das tropas de D. Pedro, “cortando o mal pela raiz”. E se por aqui entraram, pela agora Rua 9 de Julho continuaram – e nós com eles - rumo ao coração duma cidade que os acolheu com desconfiança, como que adivinhando o cerco do Porto que viria a durar mais de um ano.

Pelo caminho vamos tomando contacto com o caos urbanístico que a própria Rua 9 de Julho personifica, a importância desta via que era a antiga estrada para Santiago de Compostela, as casas dos vareiros de Ovar, a profusão de quintas nobres que marcavam a paisagem duma zona profundamente rural, as fábricas que laboraram até há bem pouco tempo e as “ilhas” que em seu redor se instalaram, até a razão de ser de topónimos como a Ramada Alta, tomando como referência a distante torre dos Paços do Concelho. Mas fala-se igualmente na Quinta da Ana Esganada (onde, posteriormente, se rasgou o Hospital Militar) ou na “titoria” da Quinta das Águas Férreas, isto sem perder de vista as tropas de D. Pedro que, connosco, fazem este mesmo trajecto, encabeçadas agora pelo Batalhão Académico, o “teatral e muito vaidoso” Almeida Garrett ou o “cara-de-pau” Mouzinho da Silveira lado-a-lado com o sorumbático Alexandre Herculano ou com “o mais corrupto político português de sempre”, Costa Cabral. À esquerda, altaneiras, as torres da Igreja da Lapa parecem querer lembrar-nos que D. Pedro tem aí o seu coração. Até que entramos em Cedofeita!

Num Porto cercado e a viver momentos muito difíceis, a ordem entre os liberais estabelecia-se numa espécie de cidade-estado, sendo a sua “capital”, precisamente, esta Rua de Cedofeita. Era aqui que se concentravam os Ministérios e era aqui que estava alojado D. Pedro, depois duma curta estadia no Palácio dos Carrancas (actual Museu Nacional de Soares dos Reis). A importância desta artéria da cidade está patente nas suas casas e nas histórias que elas contam, os nomes de Felizardo Lima e de Carolina Michaëlis de Vasconcellos à cabeça. A visita está a chegar ao fim mas importa dizer que a cruel guerra civil terá os liberais como os grandes vencedores, o que redundará no exílio do rei absoluto e na reposição da Carta Constitucional lavrada por D. Pedro, provando, na plena medida, a sua pertinácia e dedicação à causa que encabeçou. Pouco mais viveria D. Pedro: só o tempo suficiente para ver as Cortes reunidas de acordo com a Carta, tendo falecido 4 dias após o começo do reinado de D. Maria II, em 24 de Setembro de 1834. Sobre aquele que ficou conhecido como “Libertador” ou “Rei Soldado” fica a certeza de que o seu nome é indissociável da experiência liberal portuguesa, que assinala o início do Portugal contemporâneo. Daí que as últimas palavras do historiador Professor César Santos Silva sejam de incentivo a que se procure saber mais sobre “o tremendo século XIX”. E porque as Visitas Guiadas não ficam por aqui, importa lembrar que a próxima terá lugar já no dia 14 de Outubro e levará os interessados à descoberta da Sinagoga do Porto. Informações e inscrições em geral@confrariacorposantomassarelos.pt.

sábado, 17 de março de 2018

VISITA GUIADA: "O Rei Carlos Alberto e o Porto"



VISITA GUIADA: “O Rei Carlos Alberto e o Porto”
Orientada por | Professor César Santos Silva
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
17 Mar 2017 | sab | 10:00


Em nova iniciativa da Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos, decorreu esta manhã uma Visita Guiada orientada pelo Professor César Santos Silva ao encontro dos pontos que unem a cidade do Porto à figura do Rei Carlos Alberto. Num percurso que ligou a Praça de Carlos Alberto à Capela com o mesmo nome, nos Jardins do Palácio de Cristal, foi passada em revista a história do monarca, nascido em Turim, em 02 de Outubro de 1798 e que viria a terminar os seus dias no Porto, em 28 de Julho de 1849, após um curto exílio de 100 dias.

Afinal, quem foi Carlos Alberto? Como é que alguém que aqui viveu pouco mais de três meses conseguiu ficar tão intimamente ligado à história e ao património da cidade? Porque é que “caiu no gôto” dos portuenses? Ao encontro das respostas a estas e outras questões, o Professor César Santos Silva começou por relatar os factos históricos que fazem de Carlos Alberto – Carlo Alberto Emanuele Vittorio Maria Clemente Saverio di Savoia-Carignano, de seu nome completo –, Rei do Piemonte e da Sabóia, um homem na mó de baixo à sua chegada ao Porto. Tendo aderido às ideias inspiradas por uma Itália federada e livre dos Habsburgos, Carlos Alberto liderou as forças que levaram à primeira Guerra da Independência contra o Império Austro-Húngaro, acabando derrotado em Novara e abdicando do trono em favor do seu filho, Vittorio Emanuele. Obrigado a fugir do seu país, elege o Porto – cidade que personificava os ideais do liberalismo - como local de exílio, onde chega em 19 de Abril de 1849.

A sua presença na cidade torna-se num acontecimento de enorme relevância e o monarca é aclamado quase em histeria pelas multidões que o aguardam. Mas vem cansado, depois duma viagem ininterrupta de 29 dias, com início em Novara e que irá atravessar, sucessivamente, Vercelli, Ventimiglia, a francesa Côte d'Azur, Toulouse, Tarbes, Hendaye, Burgos, Valladolid e, finalmente, Portugal, onde entra pelo Norte do País. Mais do que cansado, vem doente e “a medicina da época não tem melhor remédio para lhe oferecer do que leite de cabra”. Hospedado no Palacete Visconde de Balsemão, na então hospedaria que pertencia ao espanhol Pexe, na Praça dos Ferradores (actual Praça de Carlos Alberto), podia dizer-se que Carlos Alberto vivia no “inferno”. À azáfama deste concorrido e ruidoso ponto de partida e chegada dos fluxos de viajantes e carga de e para o Norte, juntavam-se os sucessivos pedidos das elites para audiências, privando-o do tão necessário repouso. Daí que, ao cabo de 19 dias, Carlos Alberto se veja obrigado a encontrar novo poiso, quiçá mais tranquilo.

É ao encontro duma pequena casa na Rua do Triunfo – actual Rua D. Manuel II – que os participantes na visita guiada se dirigem entretanto. E porque, em história, “tudo tem a ver com tudo”, pelo caminho vão sendo feitas referências de ordem vária: ora se “visita” o Hospital de Santo António e o seu projecto de construção megalómano com assinatura do arquitecto inglês John Carr, ora se tecem considerações sobre o Palacete do Visconde de Vilarinho de S. Romão e a sua capela quinhentista, transformada hoje em bar da noite. Há referências a Abel Salazar - para o Professor César Santos Silva, “o mais completo homem do seu tempo” -, a Manuel Rosário, tio de Almeida Garrett e do qual a Rua do Rosário vai herdar o nome, ou ainda a Arthur Wellesley, o Duque de Wellington (“não confundir com Duke Ellington”), cuja estátua “é quase o mesmo que erigir uma estátua a Angela Merkel a agradecer a troika”. E não ficam para trás o Palacete do Visconde de S. João da Pesqueira, futuro Marquês de Távora (“esse mesmo, o do Marquês de Pombal e dos azares”), ou o Palácio dos Carrancas, actual Museu Nacional de Soares dos Reis, depois de inicialmente proposto para albergar um Hospital de Crianças.

Mas voltemos à Rua do Triunfo e à casa que Carlos Alberto virá entretanto a ocupar e na qual ficará alojado pouco mais de um mês. Porquê? Primeiro, porque tem apenas três divisões e se mostra exígua para o monarca e seu séquito; e, depois, porque a barulheira contínua, graças à chiadeira dos carros de bois a caminho de Matosinhos, o impede de repousar. É então que a família Pinto Basto, proprietária da Vista Alegre e com interesses em Inglaterra – de onde irá importar para o nosso país, em 1889, essa “excentricidade” chamada Foot-ball –, oferece ao monarca no exílio a sua quinta de recreio, a Quinta da Macieirinha (actual Museu Romântico), a troco da módica renda mensal de 600.000 reis. Carlos Alberto acaba por se instalar neste reduto de tranquilidade nas encostas do Douro, onde virá a falecer, como dissemos, em 28 de Julho de 1949. A título de curiosidade saiba-se que todo o mobiliário da Casa, ao tempo de Carlos Alberto, está agora no Museo Nazionale del Risorgimento Italiano, sediado no Palazzo Carignano, em Turim, sendo o mobiliário que se pode apreciar no Museu Romântico uma cópia exacta do original.

Após a morte do monarca, o seu corpo foi transladado para o Panteão dos Sabóia, em Itália. A sua meia-irmã, a princesa Frederica Augusta de Montheart, contudo, não esqueceu a cidade que acolheu Carlos Alberto nos seus últimos tempos de vida. Deslocando-se ao Porto, em 1854, mandou erigir uma capela em sua memória nos Jardins do Palácio de Cristal, evocativa de S. Carlos Borromeu, a qual ficou concluída em 1861 e é hoje local de culto da Igreja Luterana. Antes disso, em 1852, o Porto oferecia o nome de Carlos Alberto à Praça dos Ferradores, o qual se mantém (e manterá) vivo na toponímia da cidade. Fica assim concluída esta visita guiada de enorme interesse e valor histórico, restando apenas o conselho para ficarem atentos às iniciativas da Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos, a próxima das quais, já no dia 08 de Abril, orientada pelo Professor Joel Cleto, levará os participantes num percurso pelas margens de Gaia, na (re)descoberta da lenda do Rei Ramiro e do castelo de Gaia. A não perder!

domingo, 10 de dezembro de 2017

VISITA GUIADA: "Porto de Natal"



VISITA GUIADA: “Porto de Natal”
Orientada por | Professor César Santos Silva
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
09 Dez 2017 | sab | 18:00


A Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos promoveu mais uma Visita Guiada orientada pelo Professor César Santos Silva e dedicada, desta vez, ao Natal de outrora na cidade do Porto. Da Praça de Carlos Alberto ao Largo dos Lóios, passaram-se a pente-fino os costumes e tradições ligados à festa da família, escutou-se o que dela disseram homens das letras e “provaram-se” as guloseimas de outrora e que subsistem até aos nossos dias.

Tempo de festa e de harmonia, o Natal é, com propriedade, denunciado como o tempo do consumo. E foi precisamente por aí que a Visita Guiada começou, numa espécie de preâmbulo, onde se lembrou Assis Carvalho e a sua afirmação, de 1907, de que “o Natal está a transformar-se numa festa consumista”. Esta associação entre Natal e consumo levou-nos ao primeiro ponto de paragem, em plena Rua de Cedofeita, uma das catedrais do consumo natalício do Porto de outros tempos. É precisamente aí, em frente ao já desaparecido Bazar dos Três Vinténs, hoje uma loja da cadeia Lefties, que se pode apreciar ainda o belíssimo painel de azulejo, desenhado em 1954 por Fernando Gonçalves e saído dos fornos da Fábrica Carvalhinho, em Vila Nova de Gaia. Prosseguindo pela Travessa de Cedofeita, antiga Viela do Açougue, lugar a uma breve paragem para recordar a extinta Casa do Pão de Ló de Margaride, marca registada de Leonor Rosa da Silva, Sucr., casa fundada em 1730 e “fornecedora da Casa Real e da Real e Ducal Casa de Bragança”. Pouco depois, já na antiga Praça de Santa Teresa (desde 1915, Praça Guilherme Gomes Fernandes), ficarmos a conhecer que era aqui que tinha lugar “a maior feira dedicada ao pão e ao centeio que o Porto conheceu” e para onde afluíam as regueifeiras de Valongo, as padeiras de Avintes ou as doceiras de Paranhos. Aqui também, António Ribeiro, neto dumas dessas mulheres de outrora ligadas ao pão e à doçaria, abriu a Padaria Ribeiro, a qual se mantém até aos dias de hoje.

Ainda no capítulo do pão e dos doces, um olhar sobre os Bolinhos de Jerimu, os formigos ou as rabanadas do Porto - pelas quais Ramalho Ortigão suspirava, considerando-as uma verdadeira instituição portuense; sobre “barrigas de freira”, “papos de anjo” ou “toucinho do céu”, designações com o seu quê de polémico numa cidade onde abundavam os Conventos; sobre o mel, cuja Feira Tradicional se realizava paredes-meias com a Igreja dos Clérigos e onde aquele produto era apregoado como “mel virgem para as paridas”, assegurando-se que fazia bem às parturientes; mas também sobre o Bolo Rei, nascido em França sob o nome de Galette des Rois, popularizado pela Confeitaria Nacional, em Lisboa e que chegou ao Porto em 1882, através da Confeitaria Cascais, mas somente para a festa de Reis”, esclarece o Professor César Santos Silva. Importa porém dizer que os primeiros passos do Bolo Rei foram tudo menos fáceis, de tal maneira a tradição do Pão de Ló se encontrava enraizada na Invicta. Entre as várias peripécias está uma que merece ser contada: Após a implantação da República, o Bolo Rei chegou a ser alvo duma petição para que o seu nome mudasse para Bolo Presidente. Hoje, este doce tradicional é uma instituição na cidade (e não só!), graças a Confeitarias como a Petúlia, Cunha, Costa Moreira, Nandinha ou a conceituada Tavi, na Foz do Douro.

Não menos importante que as doçarias será, porventura, o bacalhau e, a prová-lo, estão os números: Na Noite de Consoada, o mundo português come mais bacalhau que aquele que é consumido pelos restantes habitantes do planeta. Também aqui, a curiosidade de que o Bacalhau Cozido com Todos, típico da ceia de Natal, é uma “moda” relativamente recente, já que no tempo dos nossos bisavós se usava comê-lo assado ou guizado. Com tantas iguarias na noite de Natal, não espanta que Alberto Pimentel se referisse a ela como uma noite pantagruélica

Abreviando, esta foi também uma Visita Guiada onde se falou da ligação do Pai Natal (Santa Claus) ao original S. Nicolau, nascido em Patara, Anatólia, por volta do ano 270 d.C; de como a sua imagem actual radica nos contos de Washington Irving (o mesmo da “Lenda do Cavaleiro sem Cabeça”) ou na “falta de imaginação” dum publicitário da Coca-Cola que resolveu “vesti-lo” de vermelho; da majestosa árvore de Natal no interior do Palácio de Cristal, há precisamente cento e cinquenta anos; da novidade, no dealbar do século passado, que foram os brindes no Bolo Rei da Confeitaria Oliveira e cujo valor era de meia-libra em ouro; dos alquilhadores e de Ruben A.; dos primeiros néons de Natal no Porto, corria o ano de 1956; dos postais de Natal, trazidos para Portugal, como sucedeu com tantas outras coisas, pela Colónia Britânica do Porto; da loja Flora Portuense e do seu proprietário, Aurélio da Paz dos Reis, realizador do primeiro filme português, “A Saída das Operárias da Fábrica Confiança”; da Capela dos Três Reis Magos, na extinta Rua de D. Pedro, comprada pela quantia de quatrocentos escudos e deslocada para a Pocariça, Cantanhede; ou de como Camilo Castelo Branco não gostava da forma como se cantavam as Janeiras. O final da visita, no Largo dos Lóios, foi como que um regresso ao ponto de partida e ao Natal como um tempo de consumismo. As últimas palavras lembrarão João Araújo Correia, um médico da Régua, “médico dos pobres”, que terá dito: “Muito come no Natal aquela cidade. Os comboios e os barcos levam tudo para lá.”