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sábado, 17 de março de 2018

VISITA GUIADA: "O Rei Carlos Alberto e o Porto"



VISITA GUIADA: “O Rei Carlos Alberto e o Porto”
Orientada por | Professor César Santos Silva
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
17 Mar 2017 | sab | 10:00


Em nova iniciativa da Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos, decorreu esta manhã uma Visita Guiada orientada pelo Professor César Santos Silva ao encontro dos pontos que unem a cidade do Porto à figura do Rei Carlos Alberto. Num percurso que ligou a Praça de Carlos Alberto à Capela com o mesmo nome, nos Jardins do Palácio de Cristal, foi passada em revista a história do monarca, nascido em Turim, em 02 de Outubro de 1798 e que viria a terminar os seus dias no Porto, em 28 de Julho de 1849, após um curto exílio de 100 dias.

Afinal, quem foi Carlos Alberto? Como é que alguém que aqui viveu pouco mais de três meses conseguiu ficar tão intimamente ligado à história e ao património da cidade? Porque é que “caiu no gôto” dos portuenses? Ao encontro das respostas a estas e outras questões, o Professor César Santos Silva começou por relatar os factos históricos que fazem de Carlos Alberto – Carlo Alberto Emanuele Vittorio Maria Clemente Saverio di Savoia-Carignano, de seu nome completo –, Rei do Piemonte e da Sabóia, um homem na mó de baixo à sua chegada ao Porto. Tendo aderido às ideias inspiradas por uma Itália federada e livre dos Habsburgos, Carlos Alberto liderou as forças que levaram à primeira Guerra da Independência contra o Império Austro-Húngaro, acabando derrotado em Novara e abdicando do trono em favor do seu filho, Vittorio Emanuele. Obrigado a fugir do seu país, elege o Porto – cidade que personificava os ideais do liberalismo - como local de exílio, onde chega em 19 de Abril de 1849.

A sua presença na cidade torna-se num acontecimento de enorme relevância e o monarca é aclamado quase em histeria pelas multidões que o aguardam. Mas vem cansado, depois duma viagem ininterrupta de 29 dias, com início em Novara e que irá atravessar, sucessivamente, Vercelli, Ventimiglia, a francesa Côte d'Azur, Toulouse, Tarbes, Hendaye, Burgos, Valladolid e, finalmente, Portugal, onde entra pelo Norte do País. Mais do que cansado, vem doente e “a medicina da época não tem melhor remédio para lhe oferecer do que leite de cabra”. Hospedado no Palacete Visconde de Balsemão, na então hospedaria que pertencia ao espanhol Pexe, na Praça dos Ferradores (actual Praça de Carlos Alberto), podia dizer-se que Carlos Alberto vivia no “inferno”. À azáfama deste concorrido e ruidoso ponto de partida e chegada dos fluxos de viajantes e carga de e para o Norte, juntavam-se os sucessivos pedidos das elites para audiências, privando-o do tão necessário repouso. Daí que, ao cabo de 19 dias, Carlos Alberto se veja obrigado a encontrar novo poiso, quiçá mais tranquilo.

É ao encontro duma pequena casa na Rua do Triunfo – actual Rua D. Manuel II – que os participantes na visita guiada se dirigem entretanto. E porque, em história, “tudo tem a ver com tudo”, pelo caminho vão sendo feitas referências de ordem vária: ora se “visita” o Hospital de Santo António e o seu projecto de construção megalómano com assinatura do arquitecto inglês John Carr, ora se tecem considerações sobre o Palacete do Visconde de Vilarinho de S. Romão e a sua capela quinhentista, transformada hoje em bar da noite. Há referências a Abel Salazar - para o Professor César Santos Silva, “o mais completo homem do seu tempo” -, a Manuel Rosário, tio de Almeida Garrett e do qual a Rua do Rosário vai herdar o nome, ou ainda a Arthur Wellesley, o Duque de Wellington (“não confundir com Duke Ellington”), cuja estátua “é quase o mesmo que erigir uma estátua a Angela Merkel a agradecer a troika”. E não ficam para trás o Palacete do Visconde de S. João da Pesqueira, futuro Marquês de Távora (“esse mesmo, o do Marquês de Pombal e dos azares”), ou o Palácio dos Carrancas, actual Museu Nacional de Soares dos Reis, depois de inicialmente proposto para albergar um Hospital de Crianças.

Mas voltemos à Rua do Triunfo e à casa que Carlos Alberto virá entretanto a ocupar e na qual ficará alojado pouco mais de um mês. Porquê? Primeiro, porque tem apenas três divisões e se mostra exígua para o monarca e seu séquito; e, depois, porque a barulheira contínua, graças à chiadeira dos carros de bois a caminho de Matosinhos, o impede de repousar. É então que a família Pinto Basto, proprietária da Vista Alegre e com interesses em Inglaterra – de onde irá importar para o nosso país, em 1889, essa “excentricidade” chamada Foot-ball –, oferece ao monarca no exílio a sua quinta de recreio, a Quinta da Macieirinha (actual Museu Romântico), a troco da módica renda mensal de 600.000 reis. Carlos Alberto acaba por se instalar neste reduto de tranquilidade nas encostas do Douro, onde virá a falecer, como dissemos, em 28 de Julho de 1949. A título de curiosidade saiba-se que todo o mobiliário da Casa, ao tempo de Carlos Alberto, está agora no Museo Nazionale del Risorgimento Italiano, sediado no Palazzo Carignano, em Turim, sendo o mobiliário que se pode apreciar no Museu Romântico uma cópia exacta do original.

Após a morte do monarca, o seu corpo foi transladado para o Panteão dos Sabóia, em Itália. A sua meia-irmã, a princesa Frederica Augusta de Montheart, contudo, não esqueceu a cidade que acolheu Carlos Alberto nos seus últimos tempos de vida. Deslocando-se ao Porto, em 1854, mandou erigir uma capela em sua memória nos Jardins do Palácio de Cristal, evocativa de S. Carlos Borromeu, a qual ficou concluída em 1861 e é hoje local de culto da Igreja Luterana. Antes disso, em 1852, o Porto oferecia o nome de Carlos Alberto à Praça dos Ferradores, o qual se mantém (e manterá) vivo na toponímia da cidade. Fica assim concluída esta visita guiada de enorme interesse e valor histórico, restando apenas o conselho para ficarem atentos às iniciativas da Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos, a próxima das quais, já no dia 08 de Abril, orientada pelo Professor Joel Cleto, levará os participantes num percurso pelas margens de Gaia, na (re)descoberta da lenda do Rei Ramiro e do castelo de Gaia. A não perder!

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