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segunda-feira, 2 de junho de 2025

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: "Ethiopian Hunger" | Sebastião Salgado



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Ethiopian Hunger”,
de Sebastião Salgado
100 Anos da Leica I - O Mundo Através do Visor
Curadoria | Magda Pinto
Museu Nacional de Soares dos Reis
24 Mai > 13 Jul 2025


“A fotografia é uma linguagem que dispensa tradução. A fotografia é a linguagem que dá às pessoas a oportunidade de ver o que você viu.”
Sebastião Salgado

Há cem anos, uma pequena câmara mudou o mundo. Apresentada ao público pela primeira vez em 1925, a Leica I revolucionou a fotografia ao torná-la móvel, discreta e espontânea, o que permitiu aos fotógrafos captar a vida tal como ela é, na sua crueza e imediatismo, como na sua autenticidade. Ao celebrar o seu centenário, a Leica presta homenagem aos visionários do Prémio Oskar Barnack, um dos mais prestigiados galardões internacionais de fotografia documental e contemporânea, através duma mostra intitulada “100 Anos da Leica I - O Mundo Através do Visor”, a qual está patente até 13 de Julho no Museu Nacional de Soares dos Reis. Reunindo obras de dez renomados fotógrafos de nível mundial, nela se inclui “Ethiopian Hunger”, emocionante e comovente série do recém falecido fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado e cujo cunho sócio-documental dá a ver ao mundo a fome na Etiópia, consequência catastrófica da seca durante os anos 80 que afectou cerca de oito milhões de pessoas. São imagens que documentam o extermínio de mais de quinhentos mil etíopes e que tiveram um forte impacto na consciencialização para o drama humanitário junto das nações industrializadas.

Conjunto de uma dezena de imagens chocantes, “Ethiopian Hunger” revela massas em fuga, acampamentos e crianças famintas. São imagens de pobreza, sofrimento e morte que Sebastião Salgado revela em toda a sua dimensão. Por detrás da câmara, ele soube perscrutar a escuridão, o abismo, o horror, juntando a arte de fotografar a um forte compromisso com a realidade. Imerso num mundo que ninguém imagina, soube concentrar-se em pessoas de carne e osso que perderam muito, senão tudo, em consequência de guerras, exploração, epidemias ou destruição ambiental. A maior parte das suas fotografias parece perguntar por que razão se vive em excesso desmedido em certas partes do mundo, enquanto outras não têm oos recursos mínimos necessários à sua sobrevivência. “Ethiopian Hunger” não responde a esta questão, nem é esse o seu desígnio. Explora, sim, as emoções que as imagens podem despertar no espectador, arrastando-o para fora da sua zona de conforto ao trazer à tona aquilo que está a acontecer noutras partes do mundo e que se mostra profundamente dissonante em relação à sua realidade. 

Sebastião Salgado oferece, bem entendido, a possibilidade de olhar para uma realidade que, de outra forma, permaneceria desconhecida. Essa realidade é cruel e desoladora: uma criança envolta num cobertor, rodeada de outras crianças, que olha resignadamente a câmara; uma mulher rodeada de crianças, apenas pele e osso, numa longa caminhada que é prenúncio de morte; um acampamento onde uma família etíope se amontoa, a ver o tempo a esgotar-se sem que uma ponta de esperança faça com que as cabeças se ergam. Em imagens de uma estética assombrosa, o fotógrafo coloca o destino e a morte diante dos nossos olhos, retirando da sombra a vida de pessoas que lutam desesperadamente pela sua sobrevivência. Sebastião Salgado recebeu o Prémio Leica Oskar Barnack em 1985 com esta série sobre a devastação causada pela fome na Etiópia. O júri soube reconhecer o valor e impacto das suas imagens, afirmando que as fotografias tornam visíveis os pensamentos de humanidade e filantropia na nossa sociedade. Salgado continuou a fotografar pessoas até 2000, documentando trabalhadores em minas de ouro na África e migrantes procurando fugir da fome ou da guerra. Em toda a sua vida fotografou apenas um animal; e esse animal somos nós.

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