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sábado, 28 de setembro de 2024

FESTIVAL: ESTAU - Estarreja Arte Urbana 2024



FESTIVAL: ESTAU - Estarreja Arte Urbana 2024
Vários Locais
14 > 22 Set 2024

“É a primeira vez que venho a Portugal e estou a gostar muito. Tenho encontrado aqui muitos amigos.” As palavras são de Tellas, talentoso artista de Cagliari, na Sardenha, com quem troquei algumas palavras no decurso da visita que fiz a Estarreja e à sexta edição do ESTAU - Estarreja Arte Urbana 2024. A palavra “amigos” tem aqui um valor real, já que Tellas se referia a um conjunto de artistas que, tal como ele, têm passado por Estarreja, aqui deixando a sua marca em peças de enorme beleza e significado. Amigos de outras paragens, de outros festivais, de quem se guarda o convívio, a troca de saberes e experiências, o nome e o traço nas peças que assinam, a partilha da paixão pela Arte Urbana. Amigos que se podem “rever” numa parede, num muro, num posto de transformação eléctrico ou num depósito de água. Não em Stavanger ou Grenoble, Montreal ou Brisbane, mas aqui bem perto, em Estarreja. E é isto, o ESTAU: Um ponto de convergência entre a arte e a cultura, uma forma de juntar a comunidade em torno das suas histórias e memórias, enfim, uma oportunidade única de ver ao vivo o trabalho dos artistas que vêm visitando Estarreja desde 2016, que fazem da rua o seu atelier e tornam a arte acessível a todos, difundindo-a e democratizando-a.

À semelhança das edições anteriores, também este ano o primeiro fim de semana do ESTAU foi dedicado ao conhecimento do território, permitindo aos artistas perceber melhor a realidade desta magnífica região do Baixo Vouga Lagunar. Nesse contacto inicial reside a força inspiradora que permite, nos dias seguintes, partir para o terreno com ideias bem assentes e trabalhar peças que, nos seus mais diversos estilos, são evocativas da identidade estarrejense e prestam homenagem à terra e às suas gentes. Parto ao encontro do trabalho acabado ou por acabar e, com a preciosa ajuda de Lara Seixo Rodrigues, traço o meu próprio roteiro. Começo pelo centro da cidade onde, no Mercado Municipal de Estarreja, Barbara R. põe em prática o trabalho de uma Oficina dirigida a alunos de uma escola do Concelho. Rumando a Sul, a próxima paragem é Salreu, onde o argentino Facio presta homenagem ao Visconde de Salreu. De regresso a Estarreja, é tempo de apreciar o mural de Tellas que faz do depósito de água junto à Estação de Comboios um espaço levemente abstracto, mas viçoso e verdejante.

Preparo-me para seguir rumo ao Bairro da Teixugueira quando, ao fazer a manobra, vejo pelo retrovisor, mesmo atrás de mim, uma estranha personagem com um carrinho de compras do supermercado. É Jaune, artista de nacionalidade belga, que tem como protagonistas das suas humorísticas instalações e quadros, funcionários de limpeza urbana, trabalho que o próprio exerceu durante algum tempo. No caso de Estarreja, o alvo da sua homenagem foram os bombeiros, verdadeiros heróis no combate aos incêndios que devastaram os concelhos vizinhos de Oliveira de Azeméis e Albergaria-a-Velha, e que se podem encontrar um pouco por toda a cidade, em muros e bancos, em portas e caixas eléctricas. No Bairro da Teixugueira, por fim, vejo como o espanhol Sojo interpreta, de forma singular, o Carnaval de Estarreja. A viagem de regresso faz-se pela EN 109 onde, num dos muros que delimitam os terrenos da Bondalti, se abre ao nosso olhar a “missão impossível” de Bigod, jovem artista de Benfica do Ribatejo que evoca os que (ainda) trabalham a terra. E digo “missão impossível” porque o multicolorido mural, onde não faltam os tractores, tem só 550 metros. De fora ficou Tiago Hesp e o trabalho que desenvolveu numa casa isolado nas margens do Esteiro de Salreu, praticamente inacessível em período que coincidiu com as marés vivas na Ria de Aveiro.

Mas não acaba aqui o ESTAU - Estarreja Arte Urbana 2024. Rico e variado, o programa integrou um vasto conjunto de oficinas, visitas guiadas, uma acção comunitária, a exibição do filme “Banksy - Procura-se!”, exposições, instalações, uma sessão de teatro experimental e três concertos. E é justamente de duas destas iniciativas que quero dar nota, visto ter participado em ambas (e me ter deixado encantar). A primeira trata-se de “O Som da Fábrica”, oficina desenvolvida pela Frenesim Cooperativa Cultural, com a Rita Campos Costa e o José Figueiredo como formadores. Dividida em três etapas distintas mas complementares entre si, a Oficina congregou o viver e o sentir dos participantes nas suas deambulações pelo recém inaugurado Museu Fábrica da História - Arroz, resultando numa peça sonora inspirada e muito animada, feita de nomes, frases, sons, cantares e ambientes únicos e irrepetíveis. A segunda é uma instalação com o sonoro nome de “Gamelão de Porcelana e Cristal”, desenvolvido pela Companhia de Música Teatral na pessoa de Mariana Miguel. “Instrumento musical coletivo” constituído por centenas de peças de porcelana, faiança, grés, vidro e cristal, o gamelão reuniu à sua volta um numeroso grupo de pequenos artistas, fascinados com o som extraído de tão exótico instrumento, cientes de estarem a fazer música. Fascínio que me invadiu, igualmente, não só pela competência da Mariana, pela sua mímica e forma como soube cativar a plateia, mas também por poder estar perante um objeto visual versátil e de tanta beleza.

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