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domingo, 19 de maio de 2024

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: "Diários do Cáucaso"



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Diários do Cáucaso”,
de José Luís Santos
iNstantes 2024 - Festival Internacional de Fotografia de Avintes
Salão Nobre dos Bombeiros Voluntários de Avintes
10 Mai > 26 Mai 2024


Geórgia, jóia do Cáucaso. Parada no meio da rua, uma mulher ergue o olhar para algo que se desenrola mais à frente. Também a criança ao seu lado, com uma boneca ao colo, parece olhar na mesma direcção. Em volta, vemos blocos de habitação de um lado e do outro da rua, varandas com marquises, carros estacionados, um céu de nuvens dispersas. Num quotidiano aparentemente normal, a nota de sobressalto está na ansiedade e na inquietação que percebemos naqueles rostos. O mesmo olhar ansioso e inquieto que vemos no rosto da rapariga parada no passeio em frente a um grande edifício no centro da cidade ou no de outra mulher que caminha apressada, tendo ao seu lado um prédio decrépito. Esse olhar sob um céu sempre carregado de nuvens, que se alonga e que torna os passos incertos e inseguros, que dá conta de quem teme pelo futuro e tem como única opção o viver o momento presente, como se cada dia fosse sempre o último das suas vidas.

Terra de fronteira e zona-tampão entre os impérios russo, persa e otomano, o Cáucaso é daqueles territórios que continuarão a sofrer pelo enorme peso com que a História se abate sobre ele. Basta olharmos para os vários conflitos que o assolam, como a guerra entre a Geórgia e a Abecazia, a autoproclamada república independente que se desvinculou do país que foi o berço de Estaline, um conflito ainda não resolvido e que parece arrastar-se indefinidamente no tempo. Mas a lista é longa e estende-se a todo o Cáucaso, com a disputa do Nagorno-Karabakh que opõe a Arménia ao Azerbaijão, os conflitos separatistas na Ossétia do Sul ou na Tchechénia, no Daguestão ou na Inguchétia. Do colapso da União Soviética, em terra onde há petróleo, sobram o desejo de uma ligação à União Europeia e aos interesses norte-americanos ou, antes, a manutenção e reforço do histórico cordão umbilical com a Rússia.

Viajante incansável, José Luís Santos volta a expor no Festival iNstantes, depois de aqui ter mostrado imagens da “Rota da Seda”, na edição de 2019. A paixão pelos vastos horizontes e pelas culturas milenares leva-o desta feita à Geórgia, onde capta um quotidiano ambíguo e impreciso, as interrogações a formarem-se em cada imagem desta série verdadeiramente impressiva. O olhar do fotógrafo cruza-se com os olhares das pessoas e, entre ambos, é a dúvida que persiste. Ele assegura que, “no meio de toda esta problemática, a vida continua porque tem de continuar”. Por isso o seu olhar poisa, de igual modo, no rosto da mulher que vende batatas num mercado ao ar livre, na carroça que se afasta deixando para trás a escultura de uma arma com um nó no cano, dos banhistas que abrem o guarda-sol nas areias do Mar Negro ou das crianças que brincam na rua indiferentes à violência que se abriga nas três estátuas decepadas de Lenine.

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