CONCERTO: Orquestra de Jazz de Leiria com Kurt Elling
Direcção | César Cardoso
Teatro José Lúcio da Silva
04 Mar 2023 | sab | 21:30
Emoções ao rubro nesta minha deslocação a Leiria. Desde logo, por ser uma estreia no Teatro José Lúcio da Silva, uma sala que se mostrou extraordinariamente acolhedora, talvez a mais confortável onde alguma vez tenha estado, com espaço entre as filas suficiente “para arrumar um Mercedes”. Depois, pelo agrupamento anfitrião, que muito recentemente soprou doze velas e cujo trabalho tem merecido o aplauso crescente de crítica e público. Um agrupamento ambicioso, a quem faltaria dar um passo percebido como fundamental neste seu esforço de afirmação e consolidação: convidar um artista internacional e poder extrair daí importantes dividendos, quer pelo ganho de conhecimentos e pela partilha de experiências, quer pela projecção do seu potencial e pela possibilidade de viver um momento marcante a todos os títulos. E este é o terceiro motivo que me levou a Leiria, seguramente o mais importante: a aposta recaiu sobre Kurt Elling, norte-americano nascido há 55 anos no Illinois e uma referência enorme na cena jazzística mundial. Aposta feita, aposta ganha: A sala encheu e Elling convenceu.
Não foi esta a primeira vez que Kurt Elling actuou no nosso País. Já o tinha feito por quatro vezes em Lisboa e uma vez em Vila Real, mas em qualquer dos casos sempre acompanhado por um quarteto. Não será todos os dias que Elling canta com o suporte de uma Orquestra, mas do que pude ver desde o momento em que pisou pela primeira vez o palco, sentiu-se como peixe na água e foi claro que esta é a sua praia. A uma energia transbordante e à alegria de partilhar o espaço com tantos e tão talentosos músicos, juntou Elling a sua maravilhosa voz, transformando as quase duas horas de concerto num momento de sedução e fascínio. Depois da “volta de aquecimento”, uma homenagem da OJL ao compositor Thad Jones que estaria a celebrar cem anos caso fosse vivo, Elling trouxe-nos “Steppin' Out”, um tema de Joe Jackson, prendendo imediatamente o público com o calor da sua voz e a força da sua presença. Afável, humilde, bom contador de histórias e com enorme sentido de humor, foi desfiando temas sobre temas enquanto puxava pela banda e teimava em dizer ao público o quão orgulhoso deveria sentir-se por esta magnífica Orquestra.
Benny Carter, com “I Can’t Give You Anything But Love” e “I Like the Sunrise” e “Tootie for Cuttie”, de Duke Ellington, não espalharam apenas o perfume do swing, mas deram a escutar, em deliciosos solos, as qualidades interpretativas do pianista Pedro Nobre, do saxofonista João Capinha, do trompetista Luís Cunha, do baterista João Maneta ou do vibrafonista Paulo Santo, entre outros. A homenagem a Wayne Shorter, falecido dois dias antes deste concerto, não poderia faltar e escutou-se “Where To Find It” e o incontornável “Speak No Evil”, esse maravilhoso instrumento que é a voz a desdobrar-se em mil sons, com Luís Cunha a brilhar em mais um solo precioso. “You Are Too Beautiful”, da dupla Rodgers e Hart, foi um saboroso momento de serena harmonia, os holofotes a recaírem desta vez sobre o magnífico solo de Paulo Santo. Até ao final ainda tivemos Count Basie e “Lil’ Darlin’ ”, John Coltrane e “Resolution” e, já no encore, o imortal “My Foolish Heart”, da dupla Washington e Young. Por muitas razões, ter partilhado o palco com Kurt Elling terá sido o ponto mais alto da Orquestra de Jazz de Leiria até hoje. Mas esse ponto alto deve ser estendido a muitos dos espectadores que, como eu, tiveram o privilégio de assistir a este concerto memorável. Um concerto que me acompanhará durante muito tempo e que me faz desejar voltar rapidamente a Leiria para mais momentos como este, neste espaço e com esta Orquestra.
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