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terça-feira, 2 de agosto de 2022

VISITA GUIADA: "Os Barcos, Vidas & Memórias"


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VISITA GUIADA: “Os Barcos, Vidas & Memórias”
CENARIO – Centro Náutico da Ria de Ovar
Curadoria | Hélder Ventura
Escola de Artes e Ofícios
02 Jul > 30 Set 2020


Até 30 de Setembro, está patente na galeria de exposições da Escola de Artes e Ofícios “Os Barcos, Vidas & Memórias”, mostra da responsabilidade da CENÁRIO - Centro Náutico da Ria de Ovar, agremiação com uma forte vocação museológica dedicada à salvaguarda e divulgação do património náutico ovarense. Através dela, pretende mostrar-se o esforço na manutenção e restauro de embarcações notáveis para a história náutica da nossa região, representativas da arte da carpintaria naval. Parte integrante das quase duas centenas de eventos que preenchem a Agenda Náutica e Verão 2022, promovida pela Câmara Municipal de Ovar, a Exposição contou com uma Visita Guiada pelo seu curador, Hélder Ventura, ao longo da qual foi possível perceber o quão forte é a ligação entre Ovar e a sua ria e de como se foram desenvolvendo em torno desta relação um conjunto de actividades económicas e lúdicas que tiveram na construção naval e nos barcos uma face particularmente visível.

Os barcos passam por ser o grande assunto desta exposição. Eles surgem em desenho ou em projecto, são figura presente em parte ou no seu todo, revelam-se nas madeiras que os enformam, na infinidade de apetrechos que permitem otimizar a sua condução, nas particularidades que os distinguem entre si, nas cordas e nas velas com que se deixam beijar pelo vento e se entregam em gracioso bailado às águas da Ria. Eles são conhecimento e saber passado de geração em geração em esboços fascinantes nos seus códigos e símbolos gráficos, ampliados à escala real nas “salas do risco” e vertidos em belos navios e embarcações. São bateiras, moliceiros e mercantéis, mas são também os Vouga e os Sharpies 12M, os Andorinhas e os Vaurien, os Snipes, os pequeninos Otimist e os saudosos Lusitos, Moth e Cadetes. São, enfim, o “Melody” e o “Marilinda”, o “Narceja” e o “Rabor”, o “Cáster” e o “Vouga”, o “Algol”, o “Finório”, o “Celta” e o “Martinho”. Nomes que convocam todo um conjunto de vidas e memórias recuperadas com paixão por Hélder Ventura, servindo de alimento a grande parte da visita.

De vidas está a exposição repleta. Vidas que, directa ou indirectamente, dependiam da ria para o desenvolvimento das suas actividades produtivas, encontrando ali o seu principal ganha pão. Vidas daqueles que, em enormes mercantéis, viajavam entre Ovar e Aveiro, transportando consigo perto de vinte toneladas de sal. Vidas dos que extraiam as mais variadas madeiras nas florestas do Norte da Europa ou da Índia, da Birmânia, do Brasil ou da Oceânia, e que viriam a ser a matéria-prima da construção de cada barco, de acordo com o seu tipo. Vidas, também, dos mestres artífices que criaram ou aperfeiçoaram peças de design verdadeiramente únicas, lindíssimas, tão necessárias para trabalhar as velas e aumentar a sua performance. Vidas de quem, directa ou indirectamente, vê o seu nome gravado a ouro na história dos barcos da nossa Ria, do construtor e artífice Horácio Lopes da Melra ao engenhoso Duarte Bello, do criativo António Ferreira Gordinho ao empresário José Gomes Ramada. Enfim, as vidas de quem, na CENÁRIO, se empenha em preservar tão vasto e rico património, recuperando os barcos no respeito pela sua traça e materiais originais.

Por fim, as memórias. Do transporte de um barco da Ribeira de Ovar até à Marina do Carregal pode ver-se um vídeo onde o mais impactante é compararmos a Ria de hoje com o que era há duas décadas e percebermos o quanto a paisagem se alterou num tão curto espaço de tempo. Esta reflexão leva-me a “puxar o filme” um pouco mais atrás, às intermináveis férias de Verão passadas no Areinho, ao queixo esfolado num mergulho inaugural na piscina da Marina do Carregal, às pescarias de enguias em longas tardes de anedotas, às rocambolescas acrobacias do Carlos Malaquias sobre os esquis, à peculiar cabine envidraçada” do “Joinha” de Francisco Ramada, a uma Ria espelhada onde dezenas de barcos à vela se moviam em todas as direcções. Enfim, aos domingos passados no hangar do Manuel Marinheiro, na margem Norte do Cais da Ribeira, à roda de uma dobrada com feijão que a minha mãe fazia para a família toda enquanto, suspenso por pujantes tiras, mesmo ali ao nosso lado, nascia e crescia o “Maria Cristina”.

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