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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

TEATRO: "A Coragem da Minha Mãe"



TEATRO: “A Coragem da Minha Mãe”,
de George Tabori
Tradução | António Carlos Conde
Encenação | Jorge Silva Melo
Cenografia e figurinos | Rita Lopes Alves
Interpretação | Pedro Carraca, Antónia Terrinha, Hélder Braz
Produção | Artistas Unidos
75 Minutos | Maiores de 12 anos
Cine-Teatro de Estarreja
05 Fev 2022 | sab | 21:30


Estreado em Novembro de 2020 no Teatro da Politécnica, “A Coragem da Minha Mãe” vem trilhando, desde finais do ano passado, os caminhos da itinerância. Em Estarreja, perante uma plateia bem composta, Pedro Carraca, Antónia Terrinha e Hélder Braz deram corpo às personagens de um drama que nos fala da improvável salvação da mãe do dramaturgo húngaro George Tabori, contada pelo próprio, aquando da deportação de judeus de Budapeste para Auschwitz em julho de 1944. Uma história real, acrescente-se, de uma mulher que aos 55 anos se dirige a casa da irmã para um jogo de cartas, sendo presa e logo conduzida para a estação central de comboios onde é metida num vagão de gado, juntamente com outras quatro mil pessoas, com destino ao campo de extermínio de Auschwitz. Mas o impensável acontece e Elsa irá viver uma história mirabolante, marcada pelo absurdo e com um final feliz. Doze horas depois, a mulher estará de regresso a Budapeste e à casa da irmã para o prometido jogo de rummy.

Um piano, um cadeirão, mesa e cadeiras, uma cómoda com um naperon, um rádio e um candeeiro, são alguns dos elementos que adornam o palco. Ao centro, uma poltrona onde se senta a mãe e uma cadeira para o filho, embora este esteja quase sempre de pé enquanto vai desfiando esta história improvável e escutando da mãe as pequenas correcções à narrativa. Há pouco de interessante ou de inovador no espaço cénico, as vozes gravadas que se ouvem em fundo pouco acrescentam em termos de ambiente e as interpretações não descolam do registo convencional. Mas há um texto e uma mensagem que, esses sim, colocam esta peça num lugar à parte no universo do teatro. Uma mensagem que é vista como “a resposta subversiva de Tabori à Mãe Coragem de Brecht” ao promover um universo interpolado e fragmentado e a total inversão de expectativas.

Paródia? Talvez possamos classificá-la assim, admitindo que a peça nos fala da vida a rir de si própria. Num mundo desagregado, regido por um Estado ameaçador e brutal, com vizinhos que se tornam inimigos da noite para o dia, pessoas tratadas como animais, sobreviventes que carregam o peso da culpa, homens e mulheres que se refugiam em casa entregues à sua descrença, Elsa, a mãe de Tabori, é tudo menos uma heroína. É ela a primeira a negar a temeridade e bravura dos seus actos, interrompendo constantemente o filho para lhe dizer que “não foi bem assim”. Entre as peripécias que envolvem a detenção de Elsa, o episódio de cariz sexual com um estranho em plena viagem de comboio e a existência de um salvo-conduto da Cruz Vermelha, a dúvida instala-se. A única certeza parece saída de um conto infantil: “Se fores uma boa menina nada de mal te poderá acontecer”.

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