CONCERTO: Márcia
Concertos Íntimos
Cine-Teatro de Estarreja
07 Mai 2021 | sex | 21:00
“Dá-me o mar, o meu rio, minha calçada
Dá-me o quarto vazio da minha casa
Vou deixar-te no fio da tua fala
Sobre a pele que há em mim
Tu não sabes nada”
Foi, pois, do palco para a plateia, que brotou, em catorze temas, a força da música de Márcia, devidamente secundada por Zé Kico Moreira na bateria, David Santos no baixo e Filipe Cunha Monteiro e Manuel Dórdio nas guitarras. Datado de 2018, “Vai e Vem”, o último trabalho de estúdio da cantora, chamou a si a “parte de leão” do concerto, do qual extraiu cinco belíssimas canções, nomeadamente esse verdadeiro “hit” que é “Tempestade”, mas também a sensível e intimista “Amor Conforme”. Os restantes temas pertenceram aos álbuns “Dá” (2010), “Casulo” (2013) e “Quarto Crescente” (2015) e ainda ao EP “Márcia” (2009). A este último foi buscar o incontornável “A Pele Que Há em Mim”, logo a abrir o concerto (lembramo-nos de ti, J.P. Simões). Dos restantes vieram “Menina”, “Lado Oposto” e esse incrível “A Insatisfação”, entre outros. Zeca Afonso não poderia faltar, dele se escutando “A Presença das Formigas”, assim como Ana Moura, de quem Marcia cantou, a capella, “Até ao Verão”, naquele que foi o mais belo e arrepiante momento da noite.
Generalidades à parte, aquilo que verdadeiramente faz de Márcia uma autora única tem sobretudo a ver com a sua poesia. Ora sóbria, introspectiva, contida, murmurante, ora telúrica e efusiva, sempre visceral, ela é manta de retalhos que, “se demora, não é por desmazelo”, aprende a “levar o seu azar a sério”, “semeia sol, colhe a tempestade”, “promete-se a si mesma mais de céu azul” e sabe que “vai chegar o dia em que o medo não faz parte”. Cada poema é página de um diário íntimo, liberto na sua nudez, aberto a todos e a si próprio em busca da “pele que há em mim”. Laborioso, minucioso, oficina de formiguinha a clamar liberdade. “E assim, ouvi, pela noite fora a Márcia cantar; e o que não vi só tive de imaginar”. Fechar os olhos, imaginar. Sonhar com um céu sem nuvens. Sentir o aroma das giestas no verão. “Entender a chuva que acontece”. Escutar o bater do coração. E ser feliz. Obrigado, Márcia.
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