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sábado, 18 de maio de 2019

CONCERTO: Lula Pena



CONCERTO: “Archivo Pittoresco”,
de Lula Pena
Academia de Espinho – Auditório
11 Mai 2019 | sab | 21:30


“Não queria ser o dia / Porém o momento
Muito menos ser concerto / Apenas a canção”

Escutei Lula Pena pela primeira vez nos jardins do Centro Cultural Vila For, em Setembro de 2017. “Archivo Pittoresco”, o seu terceiro álbum, acabava de sair e a expectativa não podia ser maior. Sentado na relva, o céu estrelado a desenhar uma concha acústica de limites infinitos, fui envolvido por aquela voz e aquela musica e, no embalo duma sonoridade única, fechei os olhos e deixei-me guiar numa viagem hipnótica mar adentro. Dei por mim de visita às costas da Sardenha, a percorrer o Chile, a banhar-me no Amazonas, a ir do Algarve ao país Basco e a chegar a terras do Novo Mundo. Escutei o grego e o sardo misturados com o português, o inglês, o espanhol ou o italiano e senti o quão próximo o “phado” está da bossa nova, o flamenco da “chanson française”. Então levantei os olhos e vi, sentados ao meu lado, Chico Buarque, Violeta Parra, Atahualpa Yupanqui, Amália Rodrigues, um trovador medieval e uma ceifeira de Pias. Todos eles escutavam a cantora e a sua música, um sorriso de felicidade desenhado nos rostos serenos e muito belos.

“Archivo Pittoresco” voltou a ser a proposta para uma noite muito especial no Auditório de Espinho. Sozinha em palco, a viola por companhia, Lula Pena explorou uma vez mais o seu magnífico repertório de forma totalmente livre e aberta, fazendo deste um concerto com particularidades diversas daquelas que se puderam escutar em Guimarães (e, certamente, em muitos outros lugares por onde “Archivo Pittoresco” já passou). Encadeando um conjunto de dez canções como se fossem uma só, ligando fragmentos e estabelecendo confluências, Lula Pena voltou a sublinhar a sua ideia de um mundo com mais pontes e menos fronteiras. Um mundo de criação e liberdade, feito de intensas melodias, timbres harmoniosos e ritmos apaixonantes, num todo sugestivo e inspirador.

Ao longo de uma hora, Lula Pena cantou e encantou, a sua viola simultaneamente instrumento de cordas e de percussão a desenhar pontes, sempre pontes, o público em suspenso, rendido à força da música e das palavras - “Rose eu peço a Deus que os dias seus / Sejam vividos pra jamais eu lhe encontrar nesta tristeza / Incontida, tão esquecida de viver...”. Natural, verdadeira, sedutora e livre, Lula Pena ainda teve tempo de, findo o concerto, regressar ao palco, assim agradecendo o longo aplauso que o público fez questão de lhe tributar. E de novo essa fusão de géneros, o fado e a “canção gitana” como nunca os tínhamos visto, tão fortemente abraçados em torno dum idioma sonoro tornado único graças ao génio da cantora. Noite sublime, noite de magia, de felicidade e júbilo, a fruição e o prazer a tomarem conta de nós, a subirem devagarinho, em passos lentos, a dissiparem a nossa cruz do desalento, a porem-nos na boca e na alma um sincero e sentido obrigado.

[Foto: Auditório de Espinho – Academia / facebook.com/auditoriodeespinhoacademia]

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