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sexta-feira, 8 de junho de 2018

CONCERTO: "Lala Belu"



CONCERTO: “Lala Belu”,
de Hailu Mergia
Fundação de Serralves
02 Jun 2018 | sab | 19:00


Para o final da tarde do segundo dia do Serralves em Festa estava guardado um dos pontos altos do certame, com a presença em palco de Hailu Mergia para a apresentação de “Lala Belu”, o seu trabalho mais recente. Parte integrante duma tournée que teve início em Berlim, estendendo-se a Oslo, Gotemburgo, Amsterdão, Paris, Londres e outras cidades europeias, a vinda do músico etíope a Portugal constituiu um momento de júbilo para a imensa mole humana que tomou conta do Prado de Serralves, pese embora os problemas com o som, levando a que o início do concerto se atrasasse substancialmente e tivesse de ser interrompido sensivelmente a meio por falência geral do sistema.

Vale a pena recordar um pouco da história deste etíope de 71 anos, cuja carreira permaneceu largo tempo em stand-by, sendo ressuscitada graças ao poder da blogosfera. Ex-baterista e teclista do bem-sucedido Walias Band, Mergia viu-se obrigado a fugir do seu país de origem em 1981, na sequência do golpe que derrubou Haile Selassie e levou ao poder uma junta militar que, entre outras atrocidades, promoveu uma política anti-música, repressiva e castradora. Exilado nos Estados Unidos, durante a maior parte das três décadas seguintes Mergia conduziu um táxi em Washington, aproveitando as pausas entre os turnos para compor novas músicas que ia gravando de forma precária. Foi só em 2013 que as coisas começaram a mudar quando Brian Shimkovitz, fundador do blog e do selo Awesome Tapes From Africa, descobriu algumas dessas gravações. Daí ao relançamento dos trabalhos dos anos 70 e das desamparadas composições americanas de Mergia foi um pequeno passo que culmina agora com um novo trabalho, vibrante e vital, em final de carreira.

Neste concerto, Mergia ofereceu dois clássicos etíopes, Gum Gum” Anchihoye Lene”, aos quais juntou quatro músicas originais, uma das quais, Tizita, é uma jornada que se inicia como um lamento acordeonista à terra natal do músico, há muito tempo deixada para trás, concluindo sob a forma de um frenético tributo ao free jazz do legado musical de sua cidade adoptiva. Explorando diversões melódicas assentes, sobretudo, nos teclados, o multi-instrumentista fez alarde do seu enorme talento, tanto no contemplativo “Addis Nat” como no exuberante “Lala Belu”. Com “Yefikir Engurguro” o concerto atingiu o auge, as notas soando como grossas lágrimas de felicidade caindo sobre as teclas do piano. A seu lado, o baixista Mike Majkowski e o baterista Toni Buck garantiram, de forma superior, o suporte necessário a uma música enérgica, contagiante, de proporções épicas. Grande momento de jazz este, em Serralves, vivificante e inspirador!


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