CINEMA: “Até Sempre” / “Elskling”
Realização | Lilja Ingolfsdottir
Argumento | Lilja Ingolfsdottir
Fotografia | Øystein Mamen
Montagem | Hilde Bjørnstad, Mirja Melberg
Interpretação | Oddgeir Thune, Helga Guren, Kyrre Haugen Sydness, Heidi Gjermundsen, Mona Grenne, Marte Magnusdotter Solem, Maja Tothammer-Hruza, Esrom Kidane, Elisabeth Sand, Lucas Inversini, Berthina Kayembe, Else Mariann Enger, Anna Lou Mamen
Produção | Thomas Robsahm
Noruega | 2024 | Drama, Romance | 101 Minutos | Maiores de 12 Anos
UCI Arrábida 20 – Sala 18
03 Ago 2025 | dom | 18:45
Sozinha e com dois filhos, Maria conhece Sigmund numa festa e percebe que encontrou o homem ideal para preencher o vazio deixado pelo divórcio recente. Entre avanços e recuos, as manobras de sedução prolongam-se no tempo, o cerco vai-se fechando e o “sucesso” das investidas acaba por afirmar-se nos dois tracinhos de um teste de gravidez mostrado pela porta entreaberta de um elevador. Com uma presença encantadora e um sentido de humor desarmante, Maria partilha com o espectador momentos únicos de alegria, intimidade, segurança e compromisso, até que a legenda “sete anos depois” faz o filme dar uma cambalhota e mostrar uma realidade bem diferente. A relação do casal desembocou num beco sem saída, é agora terreno fértil de medos auto-destrutivos, um campo minado de emoções reprimidas, desejos não reconhecidos e necessidades mal explicadas, uma zona de colisão entre o tempo de cada um e o tempo de qualidade juntos. Cada vez mais distante de um mundo sonhado, Maria vê-se mergulhada numa crise profunda e deve preparar-se para o final da relação.
São vários os trunfos de “Até Sempre”, a começar pelo argumento. De uma precisão cirúrgica, atento ao mais ínfimo detalhe, assume uma vocação psicológica numa jornada de autodescoberta que irá revelar-se redentora a muitos títulos. Lilja Ingolfsdottir é exímia na forma como gere o tempo e a dramaturgia do filme, adaptando-os aos processos emocionais da personagem principal, disso sendo exemplo o conjunto de flashbacks que vão sendo dispensados, em estreita associação com as memórias armazenadas. Maria é, sem dúvida, um ser humano maravilhoso, sedento de amor, mas tão mergulhada num quotidiano cada vez mais duro e difícil que a razão e o coração entram frequentemente em rota de colisão. O filme alcança um forte pendor emocional que toca o espectador e vem lembrar que nem sempre as memórias criadas correspondem à realidade. O argumento dedica uma especial atenção aos efeitos psicológicos transgeracionais, observando a relação conflituosa de Maria com Alma, a filha mais velha, mas também com a própria mãe, numa piscadela de olho ao melhor cinema de Ingmar Bergman.
O outro grande trunfo de “Até Sempre” é Helga Guren, a actriz principal, verdadeiro pivot do filme que a câmara de Lilja Ingolfsdottir persegue de forma obsessiva. Muito depende da sua representação fortemente empática e da autenticidade nos mais variados momentos emocionais, sejam eles explosões incontroláveis de raiva ou colapsos histéricos, ou uma comunicação esclarecida, disposta a aceitar objetivos de longo prazo. Com a ajuda de uma psicóloga, Maria irá aprender a prestar atenção aos outros, a controlar as emoções e a pesar os efeitos das suas acções passadas e presentes. A sua coragem em escapar aos becos sem saída, não se deixar enganar a si própria e seguir um caminho de auto-exame sem concessões nem desvios, é verdadeiramente inspiradora. O espectador irá acompanhá-la nesta jornada, quebrando as suas próprias barreiras internas e aprendendo a lidar com as dificuldades da mudança. Que “Até Sempre” possa não passar de uma história comovente sobre o final de uma relação é algo que se aceita. Mas Lilja Ingolfsdottir sabe pôr-nos no caminho do auto-conhecimento e mostrar o quanto cada um de nós importa a cada momento.
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