Pela primeira vez na sua história, o Prémio Leica Oskar Barnack foi concedido a um fotógrafo alemão. Estávamos em 2003 e a reportagem fotográfica de Andrea Hoyer, um projecto de longo prazo iniciado cinco anos antes, seria alvo do reconhecimento do júri de um dos galardões mais prestigiados do mundo, ao documentar os anseios, as perspectivas e os estados de espírito da população russa da era pós-União Soviética. Curiosidade, sede de aventura e a vontade de se envolver com outros povos e culturas caracterizam uma série cujo olhar se estende do Cazaquistão ao Uzbequistão, da Rússia à Ucrânia. Feita de imagens a preto e branco cuidadosamente compostas, “Places of Memory” foi registada com uma Leica M6 e nela podemos observar elementos representativos da antiga União Soviética, desde monumentos onde figura Estaline a vistas internas do Exército Vermelho. As vastas extensões da paisagem russa, bem como cidades e praias do Mar Negro, são igualmente retratadas.
A viver em Nova York, Andrea Hoyer concentra-se nas circunstâncias das pessoas: Na sua solidão, sozinhas ou em grupos, na falta de orientação ou de segurança no círculo íntimo da família e dos amigos. Na série agora patente no Museu Nacional Soares dos Reis, percebemos que a artista não busca o drama ousado de uma certa forma de fazer fotojornalismo, mas usa o seu apurado poder de observação para intensificar estados de espírito e mostrar de que forma se vêem reflectidos na sua própria alma. O resultado escapa àquilo que designamos por “reportagem clássica”, antes encerra uma visão muito pessoal dos lugares visitados. As pessoas que Hoyer retrata são sempre parte de uma composição geral: surgem muitas vezes cortadas ou indefinidas, ajustando-se na pose à arquitectura e às paisagens que as rodeiam como parte de um todo enigmático e complexo. No trabalho de Andrea Hoyer não há fotografias cuja interpretação seja imediata, mas isso só torna ainda mais convidativo um olhar cuidado e atento sobre cada uma delas.
Andrea Hoyer nasceu em Göttingen, em 1967, e cresceu na Alemanha e nos EUA. Estudou fotografia em São Francisco e no Centro Internacional de Fotografia de Nova York. Na Universidade de Columbia, diplomou-se em Estudos do Oriente Médio/Árabe e em 1995, após um ano a estudar a língua uzbeque, começou a fotografar nos estados da Ásia Central da ex-União Soviética e, em seguida, orientou os seus interesses predominantemente para a Rússia. Desde 2012, Hoyer começou a esculpir e a modelar cabeças de pessoas imaginárias em argila, combinando esse lado do seu trabalho com um enorme interesse por memórias individuais e colectivas e por factores como a identidade e a perda. Como sempre trabalhou numa relativa obscuridade, o reconhecimento da Leica colocou-a no mapa da fotografia, abrindo-lhe as portas de um mundo novo e mostrando caminhos que a artista desconhecia. O seu sucesso na cerimónia de premiação durante os Encontros de Fotografia de Arles recompensou a sua coragem e perseverança e chamou a atenção do público para o seu trabalho.
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