EXPOSIÇÃO DE ESCULTURA E PINTURA: “Yayoi Kusama: 1945 — Hoje”,
de Yayoi Kusama
Curadoria | Doryun Chong, Mika Yoshitake
Museu de Arte Contemporânea de Serralves
27 Mar > 29 Set 2024
Artista e escritora japonesa, Yayoi Kusama (n. 1929, Matsumoto, Nagano), surgiu como ícone cultural global do séc. XXI ao persistir na sua intransigente visão vanguardista. Ao longo das últimas sete décadas, esta artista refinou uma singular estética pessoal, a par de uma filosofia de vida fundamental. A obra de Kusama cativa milhões de pessoas ao permitir vislumbrar o espaço ilimitado e reflexões sobre os ciclos naturais de regeneração. “Yayoi Kusama: 1945 — Hoje” narra a história da vida e obra da artista, destacando o seu desejo de interconexão e as perguntas profundas sobre a existência que orientam as suas explorações criativas. Com cerca de cento e sessenta trabalhos, incluindo pinturas, desenhos, esculturas, instalações e materiais de arquivo, a mostra explora a carreira de Kusama desde os seus primeiros desenhos, feitos na sua adolescência durante a II Guerra Mundial, às suas obras de arte imersivas mais recentes. Organizada cronologicamente e por temas, esta exposição retrospetiva conduz os visitantes através da produção criativa de toda uma carreira, dividida por grandes temas: Autorretrato, Infinito, Acumulação, Conectividade Radical, O biocósmico, Morte e Força de Vida.
Na primeira sala o visitante depara-se com as imagens que Kusama pintou de si mesma ao longo de toda a sua extensa carreira. Ao contrário dos autorretratos convencionais, que retratam a aparência superficial de um artista, os quadros de Kusama transmitem as suas experiências psicológicas e emocionais numa panóplia extravagante de estilos. A ideia de infinito é permanente na arte de Kusama. Ao longo da sua carreira, a artista criou pinturas, esculturas e ambientes que estimulam a sensação de espaço infinito. Captar o infinito através da arte, tornou-se na sua forma de expressar os sentimentos relativamente à complexidade infinita da vida. Enquanto jovem artista, Kusama encontrou inspiração na observação daquilo que descreveu como “um milhão de pedras brancas” nas margens do rio perto da casa em que cresceu. Utilizando técnicas de repetição e replicação, começou a criar esculturas prendendo dezenas de pequenas bolsas de tecido com enchimento a peças de mobiliário e outros objetos comuns. Porém, a criação dessas obras obrigava a processos repetitivos e laboriosos, e Kusama acabou diversas vezes hospitalizada por exaustão física e mental.
A segunda galeria da exposição, debruça-se sobre temas tão predominantes na obra de Kusama como o biocósmico. Há muito que Kusama se identifica com as plantas, considerando-as formas de vida animadas pelo mesmo espírito que os seres humanos. Alguns dos seus trabalhos mais antigos são estudos de plantas e flores que encontrava no viveiro de plantas da sua família e nas suas redondezas, em Matsumoto, uma região montanhosa do Japão. As abóboras tornaram-se uma especial fonte de fascínio, permanecendo até hoje uma das suas referências mais icónicas e comuns. Na mesma galeria, um conjunto de obras remete-nos para o tema da “Conectividade Radical”, reflexo da importância que a artista dá à conexão e ao colectivo como valores importantes da sua arte. As suas performances de pintura corporal contavam com a participação de elementos do seu grupo e demonstram o seu conceito de “auto-obliteração”, ou a reunificação do “eu” com o universo através da “obliteração” de qualquer conceito de indivíduo isolado.
Produzir arte permitiu a Kusama processar o seu fascínio pela morte e persistir na sua luta com a depressão. O reconhecimento directo desses sentimentos sombrios traz consigo uma mensagem poderosa, expressando através da arte um desejo de viver. Algumas das obras mais antigas falam da destruição que esta testemunhou na sua adolescência, durante a Segunda Guerra Mundial. Na sua carreira mais tardia, a força de vida e o poder curativo da arte tornaram-se temas dominantes. Kusama relaciona frequentemente o seu estado mental com as condições sociais que observa. A guerra, a industrialização e degradação ambiental são experiências coletivas desorientadoras. Lamentando a violência no mundo na viragem do milénio, Kusama declarou que iria “criar arte para curar a humanidade”. Os trabalhos nesta última sala atestam as suas palavras. Este grupo de pequenos quadros reflete a viragem de Kusama para um estilo mais figurativo, depois de uma vida inteira a trabalhar com abstração e padrões repetitivos.
Esta visão de harmonia acabou por dar origem à série “My Eternal Soul”, o maior corpo de trabalho de Kusama, compreendendo quase 900 telas à data de 2021. Estes quadros reúnem os temas inter-relacionados que foram surgindo ao longo da carreira de Kusama, servindo de veículo para ultrapassar os desafios e para a cura através da força da sua arte. Na última sala da exposição o Museu exibe o infinito quarto espelhado “Dots Obsession – Aspiring to Heaven's Love”, uma grande instalação de espelhos reflexivos e bolinhas característicos da obra de Kusama. Na sala o visitante é confrontado com grandes balões cobertos de bolinhas brancas suspensos do tecto e um ambiente cúbico espelhado que o conduzirá a uma experiência caleidoscópica. A obra é uma manifestação renovada dos espaços e acontecimentos espelhados característicos de Kusama da década de 1960 que conduz o visitante a uma nova dimensão para a compreensão do conceito central de infinito e acumulação da artista. A experiência perceptiva trazida pela repetição de pontos e pela ilusão de espaço infinito oblitera o visitante no cosmos.
[Texto extraído do Roteiro da Exposição, em https://cdn.bndlyr.com/nsa343pdfl/_assets/2403_kusama_roteiro_site2.pdf]
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