CINEMA: “Pedágio”
Realização | Carolina Markowicz
Argumento | Carolina Markowicz
Fotografia | Luis Armando Arteaga
Montagem | Lautaro Colace, Ricardo Saraiva
Interpretação | Maeve Jinkings, Thomas Aquino, Isac Graça, Erom Cordeiro, Kauan Alvarenga, Caio Macedo, Aline Marta Maia
Produção | Sandro Aguilar, Karen Castanho, Fernando Fraiha, Carolina Markowicz, Luís Urbano, Bianca Villar
Brasil | 2023 | Crime, Drama | 102 Minutos | Maiores de 14 anos
UCI Arrábida 20 – Sala 8
21 Jun 2024 | sex | 13:50
Suellen é mãe solteira e trabalha nas portagens da Rodovia Anchieta, em São Paulo. O trabalho é duro, mal remunerado e os horários são miseráveis, mas é a forma que tem de garantir o seu sustento e o de Tiquinho, o filho adolescente. Quando a mulher descobre que o filho partilha vídeos nas redes sociais travestindo-se de mulher, a sua surpresa não poderia ser maior. Perturbada, cansada de acender “velas de virilidade” e de recorrer a outras mezinhas, decide seguir o conselho de uma colega de trabalho que vê no comportamento de Tiquinho uma “doença”, e matriculá-lo num curso de “ressignificação bio-energética”, ministrado por um prestigiado padre português que o deve curar da sua homossexualidade. Mas o curso é caro e o salário de Suellen mal dá para sobreviver, pelo que a solução encontrada para obter mais recursos passa por ajudar o namorado num esquema de assaltos a partir da cabine da portagem onde trabalha.
Segunda longa-metragem da realizadora e argumentista Carolina Markowicz, “Pedágio” é um retrato acutilante da sociedade conservadora e homofóbica brasileira, servindo-se para tal de um humor cáustico neste libelo contra a intolerância e o preconceito de género. O filme narra a complexa dualidade de uma juventude que anseia por se libertar de uma história de tradição repressiva, mas que deve coexistir num mundo dominado pelas atitudes conservadoras das gerações anteriores. É uma história de amor difícil e problemático, principalmente porque Suellen cede às convenções e insiste em “curar” António, sem se dar conta do quão contraproducente é a sua atitude. Enquanto espectadores, percebemos a angústia desta mãe e a forma como, genuinamente, quer o melhor para o filho. Afinal, quem é a mãe que não se preocupa com a “saúde” do seu filho? O desespero é tal que, para esconder o facto de ter um filho homossexual, arrisca tudo na busca de um remédio.
Os conservadores arrogam-se o papel de guardiões da moralidade, mas sabemos que eles próprios vivem em contraciclo com padrões morais elevados. É essa hipocrisia que Carolina Markowicz tão bem transmite através de sua narrativa. Tiquinho, esse jovem que procura afirmar-se na pessoa que é através da roupa e da música, é um problema para a mãe, incapaz de aceitar os comportamentos extravagantes do filho. Mas é quando amigos, colegas, familiares erguem a voz para lhe dizer que tais actos são “pecaminosos”, que a mãe quebra e deixa de saber o que fazer. Dói ver um relacionamento familiar destruído por costumes culturais nesta história de amor materno equivocado, de esmagadora culpa, luta pela sobrevivência e transformação dos cenários sociais. Pode não ser um grande filme, seguramente não é um filme feliz, mas ninguém pode negar a “Pedágio” o sentido de oportunidade.
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