VISITA ORIENTADA: “Aleg(o)ria - Uma Leitura ao Carnaval de Ovar”
Texto, encenação e interpretação | Leandro Ribeiro
Cenografia e figurinos | Marta Baldaia
Carnaval de Ovar 2024
Aldeia do Carnaval
02 Fev 2024 | sex | 17:30
“Axé meu pai, axé. Se a sua vida é um fracasso, em Ovar o Carnaval será um sucesso”. Foi com estas palavras que Mestre Foliandro - especialista em espíritos diabólicos, vidente, cartomante, tarólogo, sexólogo e medium (“porque estou farto de ser small”) - começou por se dirigir às cerca de duas dezenas de pessoas que marcaram presença na Aldeia do Carnaval para uma visita orientada a esse verdadeiro laboratório onde é produzida a “vitamina da alegria”. De turbante azul empenachado, olhar hipnotizante e voz profunda, Mestre Foliandro propôs-se, com a ajuda dos seus orixás - o gigantone, o cabeçudo e o dominó - e das suas (dele) preciosas bolas, dar a ver o passado, o presente e o futuro do Carnaval de Ovar. Um tridente temporal que casa na perfeição com o tridente de Neptuno, “deus de todos os mares”, tão eficaz em chamar os foliões ao centro de Ovar como o mar às ruas do Furadouro.
Pagão ou religioso, eis a questão quanto à essência do Carnaval. A isto procurou responder Mestre Foliandro, lançando as cartas ao mesmo tempo que invocava os espíritos: “Ô-lê-lê, ô-lá-lá, pega no ganzê, mas não pega no meu ganzá”. Um espírito maléfico logo fez sentir o seu “toque” perturbador, mas a primeira carta não tardou a sair e, com ela, “os prisioneiros da Babilónia”, em cujo território se acredita possa estar a origem do Carnaval. Já na Grécia Antiga, havia festas para celebrar a chegada da primavera onde era permitido à população participar no evento, sem distinção de classes ou géneros. Celebração semelhante ocorria no Império Romano, na Saturnália, quando as pessoas se mascaravam e passavam dias a brincar, a comer e a beber. Era também na Roma Antiga que se fazia uma festa à deusa Ísis, a Navigium Isidis (o navio de Isis), e cujo “carrus navalis” terá sido o primeiro carro alegórico. Com a ascensão do cristianismo, as festas pagãs ganharam novos significados. Assim, o Carnaval tornou-se a oportunidade dos fiéis se despedirem da carne às refeições. A palavra “carnaval” parece ter origem no latim “carnis levale”, que significa “retirar a carne”.
O carnaval de Veneza com as suas máscaras, o carnaval da Alemanha com os seus “ca(ra)melos”, o carnaval da Bolívia com os seus trajes andinos ou o carnaval do Brasil com um solitário Zé Pereira não foram esquecidos. Mas foi no nosso país que Mestre Foliandro se concentrou, tentando perceber, com a ajuda dos búzios, qual o melhor de todos. À falta de búzios, porém, a solução foi lançar pipocas e perceber de imediato que, entre resseços ou melosos, insossos ou moles, não havia carnaval que se aproveitasse. Recorrendo à hipnose e a um moderníssimo baralho de cartas de Tarot, pudemos então passar em revista os carnavais de norte a sul do País, de Estarreja à Mealhada ou de Podence a Loulé. Colocando em cima da mesa as suas (dele) bolas, Mestre Foliandro deixou para o fim, muito a propósito, o Carnaval de Ovar. Nova invocação dos espíritos - “mamãe eu quero mamar, dá chupeta pro bebé não chorar” - e eis-nos perante um plasma de cristal de 40 polegadas ao encontro da nossa história, do “carnaval porco” aos carros alegóricos e piadas dos anos 70, do carnaval infantil e das escolas de samba surgidos nos anos de 1980 à Fundação do Carnaval e à Aldeia do Carnaval, inaugurada em 14 de Setembro de 2013.
A finalizar, Mestre Foliandro partilhou as suas infalíveis previsões: A Noite Mágica chegará ao Furadouro, a realização do Carnaval de forma rotativa em todas as freguesias será uma realidade, a Aldeia do Carnaval transformar-se-á em Metrópole do Carnaval e manter-se-á aberta 365 dias por ano, assistiremos à construção de bancadas fixas na Avenida Sá Carneiro, com ateliers e oficinas no seu interior, que levarão à criação de centenas de postos de trabalho e existirá um sistema mecânico de cobertura das bancadas que permitirá a saída do corso carnavalesco, mesmo em dias de temporal. A segunda parte da visita levou os participantes ao encontro das sedes de três grupos carnavalescos, onde Mestre Foliandro continuou, com a ajuda das suas (dele) bolas, a adivinhar passados e a confirmar futuros. Mais do que visitar pela primeira vez a Aldeia do Carnaval e perceber a dinâmica de um espaço único, foi gratificante ver o quanto uma visita neste contexto pode ter tanto de lúdico como de didático. Respeitando o espírito carnavalesco, Leandro Ribeiro soube ser o cicerone perfeito, encarnando o espírito do nosso carnaval na sua essência, carregando as palavras de segundos sentidos e puxando à brejeirice, mas sempre com elegância e bom gosto. Duas horas muito bem passadas, a prenunciar (quase) duas semanas da maior folia.
Efectivamente trata-se de uma visita muito interessante que tem muito de lúdico e de didáctico, tendo havido um enorme TPC para alcançar este resultado. Parabéns ao Leandro que continua a surpreender-nos!
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