EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Siza e Óscar: Para Além do Mar”,
de José Roberto Bassul
Curadoria | Ângela Berlinde
Casa da Arquitectura - Espaço Luís Ferreira Alves
07 Set > 14 Out 2023
Linhas. Próximas ou distantes. Que se cruzam ou se afastam. Se intersectam, constroem e desconstroem. Se interrompem ou se prolongam para lá daquilo que nos é dado ver (até ao infinito, talvez, porque infinitos são os mecanismos da mente, os caminhos da própria imaginação). Linhas nas quais se firma “Siza e Óscar: Para Além do Mar”, exposição de fotografia de José Roberto Bassul que, por estes dias, pode ser apreciada no Espaço Luís Ferreira Alves da Casa da Arquitectura. Linhas como que desenhadas numa fachada, num muro, num vão, num terraço. Cuja forma e definição adivinhamos efémeras, reféns da luz e das sombras, lavradas num preto e branco ora depurado, isento de “ruído”, ora apenas esboçado, esbatido, esquiço de um criador volátil e caprichoso. Singulares, minimalistas, assumidamente abstractas, as imagens oferecem-se ao visitante no risco do desafio. Contam histórias e convocam memórias. Convidam à viagem e abrem espaço ao sonho.
“O real não está na saída nem na chegada, ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.” A viagem, precisamente, evocada nas palavras de João Guimarães Rosa, epígrafe de um texto muito belo da autoria de Ângela Berlinde, curadora da exposição. Um texto que se derrama em poesia, no que a travessia pode ter de fantasioso e onírico. É nessa travessia que nos vemos envolvidos, as linhas à nossa frente como margens, balizas, espaços de fronteira para além dos quais ousar é sinónimo de abraçar o desconhecido. Noção de chão firme no que é textura, de salto no vazio no que é enigma, navegamos entre a partida e a chegada, o antes e o depois, o dentro e o fora, o real e o aparente. Certos apenas do nosso crer e da nossa vontade, a progressão faz-se devagar. Tacteamos na escuridão como na luz, desafiamos limites, vivemos a aventura. Satisfeita a curiosidade, abraçamos novos reptos, novas metas. Navegar é preciso!
Arquitecto de formação, José Roberto Bassul fotografou o extraordinário edifício da Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre, tendo consciência de que essa era a única obra de Álvaro Siza edificada no Brasil. Entretanto, deu-se conta de uma coincidência: Oscar Niemeyer, o mais importante arquitecto brasileiro, tinha igualmente uma obra apenas em Portugal, na ilha da Madeira (apesar da controvérsia em torno da paternidade do edifício, que o próprio negou). Daí que a visita ao Pestana Casino Park surgisse como corolário lógico desta constatação e o diálogo visual entre os “dois imensos modernistas” se estabelecesse mediante o olhar de Bassul. Ante as imagens, à falta de legendas, é com legitimidade que nos perguntamos o que é Siza e o que é Niemeyer. O trabalho expositivo desvia o foco dessa preocupação, poupando o visitante ao estéril exercício da comparação. Importa a travessia. Admirar, empreender, arriscar, sonhar, viver, é isso que importa. Como importa, no traço dos dois imensos arquitectos, beber “o idioma sem fronteiras da poesia”.
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