LUGARES: Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz
Palácio dos Marqueses da Praia e Monforte
Rua Vasco da Gama, Estremoz
Horário | Terça-feira a domingo, das 09h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h30. Encerra aos feriados e segunda-feira
Ingressos |€ 1,50 (bilhete normal)
“ (…) Maravilhar-se, à vontade, com os bonecos de barro que de Estremoz tomaram o nome. Maravilhar-se, diz ele, e não há termo melhor. (...) Oh, que maravilha, torna a dizer. A Estremoz irás, seus bonecos verás, tua alma salvarás. Aí fica um ditado inventado pelo viajante para passar à história.”
José Saramago, Viagem a Portugal (1981)
O magnífico espaço do Palácio dos Marqueses da Praia e Monforte, notável exemplar de arquitectura civil de finais do Barroco situado bem no centro da cidade de Estremoz, acolhe, desde o dia 09 de Agosto de 2021, o Centro Interpretativo do Boneco de Estremoz. Este espaço resulta do êxito da Candidatura do Figurado em Barro de Estremoz à Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade, classificado pela UNESCO no início de Dezembro de 2017. O objetivo principal do Centro Interpretativo passa por se colocar o foco no presente e futuro do Boneco de Estremoz, com uma exposição idealizada para ser dinâmica nos conteúdos e na apresentação do figurado, dando destaque aos produtores, no fundo os grandes protagonistas desta história multisecular.
A produção de figurado em barro, vulgarmente conhecida como “Bonecos de Estremoz”, é uma arte com mais de três séculos e que faz parte da identidade cultural do concelho. As primeiras referências ao figurado de Estremoz são de princípios do séc. XVIII. Os bonecos tiveram certamente início na necessidade espiritual, ou seja, o povo queria ter em casa os santinhos da sua devoção. Comprá-los em talha era impossível, dadas as dificuldades do quotidiano, pelo que, supomos, uma mulher habituada a lidar com o barro se terá atrevido a modelar pela primeira vez um santinho da sua devoção particular e daqui terá nascido a tradição, numa terra onde o barro era abundante. Datadas de 1770, encontram-se referências às “boniqueiras”, mulheres que faziam curiosidades e figuras de barro e que tinham um trabalho não reconhecido enquanto ofício.
Dos santinhos, e dada a expansão do gosto presepista ligado à Escola de Mafra de setecentos, passou-se às cenas da natividade. Os Presépios eruditos, observados nos Conventos e casas abastadas, depressa foram adaptados à mundividência popular das bonequeiras. Assim, na cena envolvente à da Sagrada Família nasceram os Reis Magos, os ofertantes regionais e um vasto reportório, como o “pastor a comer”, o “pastor a dormir”, a “mulher das galinhas”, o “pastor com o cabrito às costas”, entre outros. Hoje estas figuras “sobrevivem” fora do Presépio, estando inventariadas mais de cem figuras relacionadas com o quotidiano das gentes alentejanas, na sua vivência rural e urbana, estendendo-se aos emblemáticos “O Amor é Cego” ou à “Primavera”, aos “Fidalgos e Fidalguinhos” ou, mais recentemente, ao boneco “Rainha Santa Isabel”.
Em oitocentos, os homens começam a intrometer-se na arte, segundo relato da barrista Georgina, que confirmou a Sebastião Pessanha, no princípio do séc. XX, ter aprendido a arte por intermédio do seu esposo. Em 1935, José Maria Sá Lemos, Diretor da Escola Industrial de Estremoz, convenceu a artesã Ti Ana das Peles, que apenas sabia modelar “Assobios”, a ensinar o que sabia da arte e a participar no processo de “ressuscitar” as figuras que já ninguém modelava desde a década passada. Deste feliz encontro de saberes, nasce o gosto da família oleira Alfacinha pelo figurado de barro, nomeadamente Mariano da Conceição, que o transmite a alguns empregados da Olaria e a familiares diretos. Actualmente, modelam bonecos as Irmãs Flores, Fátima Estróia, Afonso e Matilde Ginja, Duarte Catela e Ricardo Fonseca. Utilizando as técnicas tradicionais, mas modelando com formas contemporâneas e locais, temos Isabel Pires, Jorge da Conceição e Célia Freitas / Miguel Gomes.
O Figurado em Barro de Estremoz envolve um processo de produção que dura vários dias: os elementos das figuras são montados antes de serem cozidos num forno elétrico, pintados pelo artesão e cobertos com um verniz incolor. As figuras em argila seguem temas específicos, sendo “vestidas” com a indumentária regional do Alentejo ou com as roupas da iconografia religiosa cristã. A viabilidade e o reconhecimento da arte são assegurados pelos artesãos através de seminários educativos não-formais e iniciativas pedagógicas, bem como pelo Centro UNESCO para a Valorização e Salvaguarda do Boneco de Estremoz. Os conhecimentos e competências são transmitidos nas oficinas familiares e em contextos profissionais, com os artesãos activamente envolvidos nas acções de sensibilização organizadas em escolas, museus, feiras e outros eventos.
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