EXPOSIÇÃO DE PINTURA: “Vida e Segredo. Aurélia de Souza 1866-1922”
Museu Nacional de Soares dos Reis
24 Nov 2022 > 21 Mai 2023
Encontra-se patente ao público no Museu Nacional de Soares dos Reis a exposição “Vida e Segredo”, de Aurélia de Souza. Comissariada por Maria Ortigão de Oliveira, a mostra insere-se no programa de evocação do primeiro centenário da morte da artista (1866-1922) e é constituída por 92 obras apresentadas num cenário familiar e íntimo, próximo do de uma casa senhorial do século XIX. Dividida em quatro núcleos – Vidas, Espaços, Temas e Cores –, a exposição parece querer dissecar um conjunto de episódios marcantes da vida desta “mulher feminista radical”, que teve cinco irmãs, nunca casou nem teve filhos. Maria Ortigão Oliveira assume que se trata de “visão pessoal” a partir da obra, na busca de “entender um bocadinho daquela personalidade tão esquiva, discreta e secreta”, que pintou “o que quis” – “e, se não foi mais ousada, é porque não estava para isso”, sublinha.
São inúmeros e particularmente relevantes os detalhes que servem para vincar o cuidado e o talento que Aurélia de Souza coloca na sua obra e que fazem dela uma figura singular. Nos seus primeiros trabalhos, retratou familiares e amigos, mas também gente simples e humilde, colocando em todos a mesma força e dedicação. Seguem-se os lugares de intimidade, onde passa grande parte dos seus dias, numa casa debruçada sobre o rio Douro. “Temas” revela a largueza dos seus interesses, algo invulgar entre as mulheres da época, mais focadas em retratos e naturezas-mortas, enquanto Aurélia pinta paisagens, às vezes estranhas, desenha e tem obras de inspiração religiosa. Por último, “Cores” agrega os seus enigmáticos, andróginos e provocadores autorretratos, nos quais se representa com um icónico casaco vermelho, um desproporcional laço negro ou travestida de Santo António, registando, no modo como se via, a passagem do tempo.
Aurélia de Sousa nasceu em 1866 em Valparaíso, no Chile, e viveu depois no Porto, em Portugal, na Quinta da China, casa setecentista situada nas margens do Douro, que se tornará ambiente e atelier para a produção de inúmeras pinturas e fotografias. Interiores intimistas, retratos, cenas do quotidiano doméstico, jardins, naturezas-mortas, flores ou vistas sobre o rio são temáticas recorrentes do seu trabalho, que se caracteriza por um naturalismo expressivo. A morte prematura do pai intensifica a experiência do feminino numa família maioritariamente constituída por mulheres, várias das quais, incluindo Aurélia, não casarão nem abandonarão a casa materna. A reflexão sobre a condição da mulher na viragem para o século XX e no quadro da sociedade do Porto, onde vive, ou de Paris, onde ingressa na Académie Julian já com cerca de 30 anos, é a chave para a compreensão da sua obra, que foi tardiamente reconhecida pela História da Arte Portuguesa.
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