EXPOSIÇÃO DE PINTURA: “Um Lugar de um Mundo Novo”,
de Francisco Laranjo
Coordenação Geral | Fernando Seara
Museografia | Francisco Laranjo, Mariana Morais
Museu do Douro
02 Dez 2022 > 26 Fev 2023
“Tudo o que é importante na vida, é simbólico.” A partir desta frase, respigada de uma conversa que teve em novo com o pai, Francisco Miguel Laranjo desenvolve um texto belíssimo que acompanha a exposição de pintura e desenho “Um Lugar de um Mundo Novo”, de Francisco Laranjo, e que pode ser vista até ao próximo dia 26 de Fevereiro. É dele que me socorro para contextualizar as obras patentes na galeria de exposições temporárias do Museu do Douro, na Régua, percebendo que “nesta simples, mas totalizante afirmação, cabe uma dimensão significativa do seu trabalho enquanto artista. Na verdade, pode dizer-se que a sua pintura e pensamento encontram-se invariavelmente num local intermédio entre o gesto e o simbólico. Se o primeiro pressupõe fisicalidade e materialidade, o segundo permite viagens pelo tempo, entre culturas, entre escalas micro e macro, entre variadas geografias.”
As viagens. As geografias. O Douro. O rio, mas também as margens que o comprimem, se erguem em monumentais escadarias e se desdobram noutras viagens que Francisco Laranjo empreendeu entre continentes, culturas e referências, da filosofia à música e da literatura ao cinema. O Douro, e por extensão o Porto, ao qual sempre regressa e que nos é sugerido nestes trabalhos em traços de luz e cor, ao mesmo tempo chamando a atenção para a desdita de se “considerar inexistente o que não se vê”, realidade tão comum nas sociedades ocidentais. Falando sobre a beleza, Junichiro Tanisaki dizia: “Creio que o belo não é uma substância em si, mas apenas um desenho de sombras, um jogo de claro-escuro produzido pela justaposição de diversas substâncias.” Por seu lado, Mark Rothko articula também a ideia da utilização do silêncio. Algures entre o cósmico e o microscópico, onde cabem e se criam mundos, está Francisco Laranjo e a sua obra. Na sombra e no silêncio.
Sobre a pintura, disse Francisco Laranjo: “Confesso acreditar nela poderosamente para além de todos os vaticínios da sua morte, faz dois séculos com Hegel. E acredito sobretudo por ser exactamente o oposto do lado físico do objecto que ela é também. E o exercício mais estranho da relação do espirito com um lado simples e intuitivo de imaginar que se pode pensar num espaço eminentemente plano e ilusório, uma escrita sobre o tempo e o lugar, e pensar que aí se transcende o discurso que chamamos do conhecimento e da vida, e ao mesmo tempo procurarmo-nos a nós próprios. A pintura nasce num silêncio tão eloquente, quanto as razões que assistem para a sua realização. E, se o silêncio a testemunha como espaço interior de reflexão da razão, da paixão, do sentimento, da consciência ou do que lhe quisermos chamar para justificar o que não é preciso, sobra em importância a dimensão do desconhecido e do mistério que a arte estende para lá do visível e do imaginário que existe na nossa natureza mais profunda.”
São de Francisco Miguel Laranjo as últimas palavras: “Há poucos anos atrás, enquanto o ajudava a pendurar uma gravura numa parede, procurava a posição mais apropriada, enquanto olhava para a altura do tecto. De forma genérica, costuma-se utilizar um sempre subjectivo ‘nível dos olhos’ para encontrar a posição do centro de uma pintura que ficará suspensa, em exposição. ‘Mais abaixo’, disse-me o meu pai num tom suave, ‘gosto dos meus trabalhos juntos ao coração’, enquanto tocava com a mão direita no peito. (…) A enorme dimensão humana e empática que caracterizam o seu trabalho – e o definiram como pessoa – que partiu do Douro para todo o mundo, é assim devolvida nesta generosa presença abstracta de enorme clareza, sempre entre o gesto e o simbólico. Este texto é, igualmente, um pequeno gesto simbólico. Guarda uma pequeníssima quantidade de memórias, de inúmeras viagens, de longas conversas, de muita aprendizagem, ajuda e encorajamento continuo. Do ocidente ao oriente, ficarão pinturas, desenhos, serigrafias, gravuras, esculturas, vitrais e cerâmicas suspensas no tempo. Os gestos simbólicos, no entanto, ficarão para sempre.”
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