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sábado, 9 de outubro de 2021

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: "Espinho" | Vincen Beeckman


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EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Espinho”,
de Vincen Beeckman
Encontros da Imagem de Braga
Museu dos Biscainhos
17 Set > 31 Out 2021


Vincen Beeckman pegou nas suas máquinas fotográficas e nas objectivas e deu por si a caminho de Portugal. Sentado no combóio, quis o acaso que o seu olhar recaísse sobre um conjunto habitacional que mais tarde identificaria como o bairro piscatório de Espinho. Foi aí que assentou arraiais, ao encontro de toda uma comunidade condenada a uma vida à margem. De linhas geométricas, tal como a cidade que se espalha lá ao longe, as ruas do bairro foram-se abrindo diante si, deixando à mostra as marcas de uma precariedade que fere e dói. Obrigados a um confinamento forçado, os habitantes do bairro pouco mais por companhia do que as memórias do tempo das companhas, dos lanços à recaxia, dos bois a puxarem vagarosamente as redes, das redes carregadas de sardinha e carapau que as mulheres, de canastra à cabeça, vendiam depois pela cidade. Hoje, a gesta vareira é passado. Só dois barcos resistem ainda, enfrentando um mar cada vez mais fértil em perigos e ávaro de peixe.

O drama silencioso que se ofereceu ante o olhar de Vincen Beeckman não o deixou indiferente. Aquele mundo em rápido declínio passou a ser o seu mundo. Ano após ano, as temporadas em Espinho foram-se sucedendo e, com elas, os registos fotográficos. Aos poucos, o artista deu-se conta do quanto de resistência há na atitude dos moradores do bairro. Nascidos na adversidade, são eles que, perante as portas que se fecham, constroem novas vias, ou não fossem estas mulheres e homens, filhas e filhos, netas e netos de pescadores que, em tempos bem mais adversos, se atreveram a navegar no mar das incógnitas. Inspiradoras, emotivas, intensas, as suas histórias de vida abrem-se nos seus gestos, no seu olhar, nas mãos calejadas e nas rugas que se afundam nos rostos. O fotógrafo sente-o, sabe-o, torna-se cúmplice. E vai recolhendo imagens que é uma forma de ser solidário. Ao resultado chamou “Espinho”. Não o cosmopolita, o dos casinos e dos campos de golfe, mas este bem distante, apartado do centro, desprezado e esquecido.

“Espinho” é, sem sombra de dúvida, uma das grandes mostras da presente edição dos Encontros da Imagem de Braga. Numa bonita sala do Museu dos Biscainhos, o público tem a possibilidade de apreciar duas dezenas de fotos que, no seu conjunto, constituem uma sentida homenagem a um punhado de pessoas que o acolheram e o fizeram sentir-se como uma delas. Há uma nota de abandono muito forte nestas imagens de um bairro de pescadores a quem o próprio mar parece ter virado as costas. Partir parece ser a solução, mas o que espera então os que ficam no bairro? Eis é a questão com a qual estas mulheres e estes homens parecem debater-se em permanência. Olhá-los nos olhos e vê-los nas suas casas, nos cafés, sentados nas ruas que calcorrearam milhares de vezes, deitados no areal que tão bem conhecem, revela muito das suas vidas e da sua descrença. Lançando mãos da sua arte, com voz sensível mas poderosa, Vincen Beeckman vem dizer-nos que o desconfinamento é para todos. É tempo de agir. É tempo de respirar!

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