LIVRO: “Regresso a Casa”,
de José Luís Peixoto
Ed. Quetzal Editores, Agosto de 2020
“(...) Porque demorei tanto a fazer este caminho?
Perguntas como esta são para se responder
a pouco e pouco. Afinal, havia muitas estradas
para chegar aqui, havia dias seguidos num diário,
páginas para traduzir palavra a palavra. Afinal,
havia amigos. Havia toda esta família que me olha
e que olho. Aqui estou de novo. (...)”
Dividido em dez capítulos, “Regresso a Casa” é uma janela aberta sobre a vida [de José Luís Peixoto], das memórias dos tempos da infância – “a minha mãe nova, o meu pai vivo” –, até aos tempos de hoje, tempos de distanciamento e de isolamento, de quarentena, de poemas “contaminados” pela palavra “medo”. Sincero, transparente, dele se derrama a verdade das coisas simples, que ora nos enchem o peito num fundo suspiro de felicidade, “amor, como uma romã, sem til, lido ao contrário”, ora nos angustiam com “o número de infectados e de mortos, 295 até ao momento”. Na sua enorme generosidade e dádiva, “Regresso a Casa” é um livro que se nos oferece por inteiro, que nos irmana a todos nesta casa a que chamamos mundo, que escorre para dentro de nós palavra a palavra, poema a poema, num gota-a-gota de frasco de soro que depura e revivifica.
Dentro de poucas horas regressaremos a casa. À nossa casa e a outras casas que também são nossas. Como esta Herdade da Almojanda é nossa. O derradeiro passeio pela colina, as últimas braçadas na piscina e até o almoço de domingo terão ficado para trás. Também o bezerro e a mãe, as cegonhas, as rolas e os abelharucos. As papoilas murcharam no canteiro e são agora como flores de papel crepe pisadas por milhares de pessoas nas Festas do Povo de Campo Maior. “Sabemos por fim que aquilo que importa é pouco e raro.” Diremos adeus aos gatos (“não é um gato, é uma gata”), diremos adeus à Teresa e ao Hugo com promessas de voltar. Não uma semana, mas duas. Nunca menos de duas. Na companhia da Maya Angelou, do Ta-Nehisi Coates, da Wisława Szymborska, da Maria do Rosário Pedreira e do Rodrigo Guedes de Carvalho, o José Luís Peixoto regressa connosco a casa. “Felizmente, não temos de despedir-nos deste aqui e deste agora, são nossos para sempre.”
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