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domingo, 21 de março de 2021

LIVRO: "Contracorpo"



LIVRO: “Contracorpo”,
de Patrícia Reis
Edição | Cecília Andrade
Ed. Publicações Dom Quixote, Março de 2013 (2ª edição, Maio de 2013)


“Pedro descobriu outra mãe em Maria e ela percebeu mais coisas no filho. Já não são o contracorpo um do outro, são dois corpos em frente um ao outro, a verem-se, a analisarem-se, a medirem-se. Não são apenas os desenhos e os silêncios de Pedro, mas também uma forma de enquadramento do mundo que é dela, a mãe, e ainda um reflexo de ver distintamente as formas do mundo que porventura, os aproxima.”

“Ninguém cresce sozinho”. Há nesta frase uma verdade inquestionável que nos atrai ao lugar das relações, nem sempre fáceis, entre pais e filhos. Em particular no período da adolescência, elas tendem a ser tumultuosas, feitas de teimosia, provocações e amuos, o dedo apontado aos filhos por “pisarem o risco” e serem cada vez mais insolentes, mas também aos pais por não saberem cumprir convenientemente o seu papel. É neste terreno que se move “Contracorpo”, romance de Patrícia Reis publicado em 2013 e que nos traz a história de Maria e Pedro, mãe e filho em rota de colisão.

Julguei adivinhar o propósito de “Contracorpo” logo nas primeiras páginas. A história do rapaz que se descobre a si mesmo através dos gestos simples de um quotidiano marcado por um pai ausente não é propriamente original. Que os avós maternos e o tio mais novo sejam uma boa rectaguarda ou que revele um jeito fora do comum para o desenho pouco acrescenta ao livro. E depois há esta mãe angustiada com a possibilidade de perder o filho, depois de ter visto morrer o marido, e que é mais fonte de irritação do que de compreensão ou solidariedade. Daí que a tentação para desistir do livro fosse grande. Ainda bem que o não fiz.

Patrícia Reis tem o mérito de ganhar o leitor ao transferir o foco para o interior daquela mãe. A história toma um rumo inesperado e torna-se particularmente apelativa. O ritmo e espessura do livro têm neste processo gradual de aproximação entre mãe e filho a sua conta, peso e medida. Pôr este Pedro a contar(-se) é outra das boas coisas do romance. O resultado final é entusiasmante, levando-me a crer que este será, porventura, o melhor livro de Patrícia Reis, depois de ter lido “A Construção do Vazio” e “As Crianças Invisíveis”. Uma última nota para mostrar, pela enésima vez, o meu desagrado pelas sinopses descuidadas, revelando aquilo que importava esconder. Ditames do marketing, bem sei.

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