CINEMA: Shortcutz Ovar Sessão #42
Escola de Artes e Ofícios
120 Minutos | Maiores de 16 anos
29 Out 2020 | qui | 22:00
A rábula da máscara em véspera de Halloween colocou uma nota de boa disposição na abertura da 42ª sessão do Shortcutz Ovar. Aos indefectíveis do cinema em versão curta juntaram-se os amantes do cinema de terror e do fantástico, esgotando uma vez mais o belíssimo espaço da Escola de Artes e Ofícios para um momento de convívio, partilha e bom cinema. Um momento que poderá muito bem ter sido o último desta quarta temporada com a presença de público, agora que o Plano Municipal de Emergência e Protecção Civil de Ovar acaba de ser reactivado e que as medidas governamentais que se adivinham apontam no sentido de um eventual confinamento parcial. Teremos de aguardar pelo dia 12 de Novembro para perceber se nos voltamos a reunir para a derradeira sessão, mas neste momento o importante é conter a praga que, negra, cresce de forma assustadora, qual erva daninha que ameaça tornar estéreis campos outrora fecundos.
“Erva Daninha”, assim se intitula a curta-metragem que abriu esta sessão e que venceu a 13ª edição do Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa MOTELX 2019. Escrito e realizado por Guilherme Daniel, o filme narra a história de um casal de camponeses que vê crescer nos campos em redor de casa uma estranha planta negra que, mais do que roubar a vida na terra, ameaça tomar conta das suas próprias vidas. Definido pelo realizador como um filme “pós-terror presunçoso com base de realismo mágico gótico rural”, o filme usa a ferida aberta no chão como metáfora dos estados de alma auto-destrutivos que tomam conta de certas pessoas e da forma como isso afecta as relações interpessoais. Influenciado pela fotografia de Artur Pastor, este é um filme de género, mas também um filme de época que remete para os tempos do Estado Novo no interior do país, o que ajuda o espectador a entender melhor a ideia de depressão que lhe subjaz e a valorizar ainda mais o trabalho de Guilherme Daniel, bem como dos actores Daniel Viana e Isabel Costa.
Menção Especial do Júri no MotelX 2019, “Häuschen – A Herança” foi o único filme que fez realmente jus a uma noite talhada para a saudosa série Z e para os filmes de terror que, ao invés de causarem medo ou tensão, são essencialmente engraçados. É assim esta obra da dupla Paulo A. M. Oliveira e Pedro Martins que nos leva ao encontro de um casebre na floresta onde Maria e Miguel, um jovem casal perdido, procura guarida em noite de tempestade. Mais do que uma adaptação de “Hansel & Gretel”, o filme procura dar continuidade ao conto clássico dos irmãos Grimm, imaginando o porvir das personagens. Trazendo a história para os dias de hoje, o argumento de Pedro Martins e Andreia Albernaz é particularmente hábil na mistura que faz de telemóveis com migalhas de pão ou de GPS com estranhos mapas manuscritos, tudo isto reforçado com portas a bater, figuras nos vidros, machados que decepam membros e sangue, pois claro. Muito bons a música e efeitos sonoros de Aurélien Lino, bem como a direcção de som, assinada por Herberto Magalhães, e o trabalho dos actores Adriana Moniz, Fernando Pires e José Raposo.
Último filme da sessão, “A Escritora”, de Hugo Pinto, narra a história de uma mulher ensombrada pela hipergrafia, uma doença psiquiátrica que faz da escrita um acto compulsivo-obsessivo. Incapaz de travar sozinha a luta contra a doença, a mulher vê a sua situação agravada perante a falta de sensibilidade do marido e uma certa inveja, até, visto ser ele também um escritor. Verdadeiro drama e não um filme de género como os dois anteriores, “A Escritora” tem como ponto de partida o belíssimo conto homónimo de Andreia Azevedo Moreira, mostrando-nos como pode ser a vida sem palavras, contada através delas. Catarina Lima, Afonso Pimentel e Áurea tomam sobre si os papéis principais e o seu desempenho é convincente o suficiente para que o espectador se agarre à história e se sinta estimulado a seguir a pista das várias leituras que se oferecem, a questão do sofrimento inerente às doenças do foro psiquiátrico por todos quantos vivem estes dramas sendo a mais evidente.
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