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EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “A
Paisagem Escondida de Copacabana [Olhares Verticais]”,
de Sérgio
DuarteCentro de Artes de Ovar
24 Jan > 25 Abr 2020
“Evitem dizer que algumas vezes
cidades diferentes sucedem-se no mesmo solo e com o mesmo nome,
nascem e morrem sem se conhecer, incomunicáveis entre si. Às vezes,
os nomes dos habitantes permanecem iguais, e o sotaque das vozes, e
até mesmo os traços dos rostos; mas os deuses que vivem com os
nomes e nos solos foram embora sem avisar e em seus lugares
acomodaram-se deuses estranhos. É inútil querer saber se estes são
melhores do que os antigos, dado que não existe nenhuma relação
entre eles, da mesma forma que os velhos cartões-postais não
representam a Maurília do passado mas uma outra cidade que por acaso
também se chamava Maurília.”
Italo Calvino, in “As Cidades
Invisíveis”
Inaugurou na passada sexta feira, no Centro de
Artes de Ovar, a Exposição de Fotografia de Sérgio Duarte
intitulada “A Paisagem Escondida de Copacabana [Olhares
Verticais]”. Apresentado na Bienal de Arquitectura de Veneza, em
2018, no contexto da exposição com o tema “Time Space Existence”,
promovida pelo European Cultural Center / GAA Foundation e patente no
Palazzo Mora, a mostra contempla uma selecção de imagens a partir de
uma extensa colectânea que o fotógrafo recolheu em Copacabana, Rio
de Janeiro, ao longo de um período da sua vida em que ali exerceu
actividade profissional.
Vale a pena atentar no título da
exposição e dissecá-lo, palavra por palavra. Começando pelo fim,
entre parêntesis, os “olhares verticais” remetem para a visão
estética e artística do fotógrafo, para a opção por um austero
preto e branco, para as tomadas de perspectiva que recorrem
frequentemente ao picado e ao contra-picado e, mais interessante do
que isso, para a disposição de alguns dos trabalhos no chão ou no
tecto da galeria de exposições, convidando o espectador a mimetizar
o fotógrafo e a experimentar esses “olhares verticais”, para
cima ou para baixo, com ele partindo em busca do melhor ângulo,
atentando no mais ínfimo detalhe.
Depois há “Copacabana”,
a “princesinha do mar” que Tom Jobim inspiradamente cantou. É
neste bairro, um dos mais conhecidos do Brasil e do Mundo - e também
o mais populoso da zona sul do Rio de Janeiro, com mais de 150 mil
habitantes -, que o fotógrafo faz incidir a sua atenção. Não para
nos mostrar a enorme língua de areia branca povoada de banhistas, o
famoso hotel Copacabana Palace, o desenho ondulado da calçada
portuguesa a perder de vista ou o espectáculo dos fogos de artifício
na noite da Passagem de Ano. Antes aquilo que se abriga (se esconde)
nas traseiras desta icónica fachada com mais de quatro quilómetros:
Aglomerados pardacentos, “de vãos claustrofóbicos e espaços
abertos, de amplitude e plenitude, de detalhes menores e grandezas
absurdas (…), prédios modernos e outros mais antigos,
enclausurados em redor de si mesmos, que nem anónimos e inamovíveis
monstros de betão”.
É nesta “paisagem escondida” que
fatalmente nos detemos, dela recolhendo o imediatismo das imagens,
mas também uma infinidade de metaleituras onde “arquitectura”,
“sociedade” e “betão” combinam com “fortaleza”,
“criminalidade” e “lixo”. É mergulhando na sua expressão
inexpressiva, no seu anodinismo vincado, que percebemos que estar
entre o bem e o mal da sociedade são concepções que, além de
subjectivas, invocam escolhas de posicionamento. O grande mérito de
Sérgio Duarte é o de nos mostrar a face da mescla, do diferente,
daquilo que se encontra relegado à dimensão de excluído, como quem
dispensa o desenho e o colorido da carpete para olhar o lixo que por
debaixo dela se acoita. Uma belíssima escolha dos programadores do
Centro de Artes a merecer visita atenta.
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