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EXPOSIÇÃO DE PINTURA: “À Flor
da Pele”,
de Rosa Bela Cruz
Cooperativa Árvore
31 Out > 30 Nov 2019
Nunca é fácil controlar as emoções
quando é de corações dilacerados que falamos. Quando, no
recolhimento de uma sala, olhamos nos olhos a tristeza e a dor, o
sofrimento e a morte. Quando vemos, num véu de noivado e em três
rosas brancas, o amor adiado, os sonhos sufocados, as vidas
desfeitas. Quando, naquela sala, percebemos que não estamos sós,
que há olhares interrogativos que sobre nós se derramam: “Porquê
eu?”. É de violência doméstica, verdadeira praga social do nosso
tempo, que nos fala “Pesadelo”, a obra que domina o espaço da
sala 2 da galeria de exposições da Cooperativa Árvore, um coração
ferido bem no centro da tela, as vinte e oito facas a ele apontadas
carregando em si os corpos das vinte e oito mulheres assassinadas,
neste contexto, no ano findo.
O nó na garganta não se desfez ainda
quando franqueamos a porta da sala 3. São muito belas as mulheres
que nos recebem. À medida que nos aproximamos, não se adivinham, no
rosto e na pose, sinais de intranquilidade, desconfiança ou medo.
Sob um par de olhos que, intensos, perseguem os nossos passos, é por
caminhos seguros que vamos ao encontro de cada uma destas obras. A
complexidade inerente à figura feminina é aqui realçada pela forma
como Rosa Bela Cruz trabalha as suas mulheres. O extraordinário
domínio das colagens e texturas gráficas, aliado a um inegável bom
gosto na combinação de tons e cores, confere ao conjunto uma nota,
simultaneamente, de complexidade e leveza, neste paradoxo residindo,
afinal, o mistério e fascínio do “eu” feminino.
Na forma, como na mensagem, “À Flor
da Pele” não é propriamente uma surpresa. À excelente artista
que é, junta Rosa Bela Cruz o facto de ser uma mulher de causas, não
cessando de reflectir sobre a origem e consequência dos nossos actos
e de exprimir as suas preocupações em telas delicadas e de uma
enorme beleza. Elo mais fraco numa sociedade conservadora e machista,
a mulher é, em Rosa Bela Cruz, sujeito primordial, figura central de
um discurso de afirmação de princípios e valores que a distinguem
como sublime e única, ao mesmo tempo reclamando igualdade, exigindo
respeito, gritando justiça. Na sua mensagem simples mas
extraordinariamente eficaz, é disso que esta exposição nos fala. À
flor da pele ficam as emoções. No coração, bem fundo cravadas, as
facas que ferem e matam.
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