CINEMA: “Bacurau”
Realização | Kléber Mendonça
Filho, Juliano Dornelles
Argumento | Kléber Mendonça Filho,
Juliano Dornelles
Fotografia | Pedro Sotero
Montagem | Eduardo Serrano
Interpretação | Udo Kier, Sónia
Braga, Alli Willow, Chris Doubek, Jonny Mars, Karine Teles, Barbara
Colen, António Sabóia
Produção | Emilie Lesclaux, Saïd
Ben Saïd, Michel Merkt
Brasil | 2019 | Aventura, Terror,
Mistério | 131 minutos | M/14
27º Curtas Vila do Conde - Internacional Film Festival
Teatro Municipal de Vila do Conde –
Sala 1
06 Jul 2019 | sab | 2019
O funeral de Dona Carmelita é um
verdadeiro acontecimento em Bacurau, pequena comunidade serrana do
Rio Grande do Norte. Mãe de muitos filhos espalhados pelo mundo,
mulher influente pelos reconhecidos méritos no domínio das práticas
de bruxaria, morre com 94 anos deixando a comunidade orfã. Ali, no
povoado, o que é de um é de todos. Perder um dos seus é perder uma
parte de si mesmo. Entretanto, as eleições aproximam-se e algo de
muito estranho começa a acontecer. De repente, o nome de Bacurau
desaparece do mapa na internet, um dos habitantes é
perseguido por um pequeno ovni e a aldeia recebe a visita de dois
“motards” garridamente trajados. A partir daqui, os habitantes da
aldeia começam a ser dizimados.
“Bacurau” é um objecto bizarro
apenas na aparência. Escavando a sua “casca” de filme de série
B, vamos encontrar uma “caça ao homem” levada a cabo por
mercenários americanos em pleno sertão, a morte como exercício de
pura diversão intermediada por políticos brasileiros e uma
burguesia contemporânea que exerce o poder sobre os mais
desfavorecidos, oferecendo-lhes tostões e cobrando milhões. Mas o
instinto de defesa do ser humano numa comunidade que se fecha sobre
si mesma e se protege das ameaças externas fala mais alto. A união
está do lado dos mais fracos, daí advindo a sua enorme força.
União essa que os salvará dos americanos guiados pela adrenalina
egoísta, do intermediário brasileiro sedento de um poder que nunca
irá alcançar e, no limite, de si mesmos como seres humanos.
Com um casting extraordinariamente
seleccionado, onde pontificam Udo Kier, Sónia Braga e uma grande quantidade de
não actores, Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles
oferecem-nos um objecto surpreendente nas suas propostas e mensagem.
“Bacurau” transporta consigo uma carga política muito grande,
clamando pelo fim da exploração do homem pelo homem.
Metaforicamente, o filme reflecte igualmente sobre as questões
sociais e económicas que fazem com que os mais fracos sejam também
os mais resilientes. Ao mesmo tempo, pisca o olho aos problemas
ambientais e à igualdade de género, fazendo da pequena comunidade
de Bacurau um exemplo dos problemas que assolam este mundo. No
limite, percebemos que os ciclos da História se perpetuam porque o
homem continua a mostrar-se incapaz de aprender com os seus próprios
erros. Presente nesta sessão inaugural do Curtas Vila do Conde 2019,
Kléber Mendonça Filho fez questão de salientar isso mesmo,
avisando que a acção do filme se centra no futuro, “um futuro
que, no Brasil, pode ser agora mesmo ou no ano que vem”.
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