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segunda-feira, 24 de setembro de 2018

LIVRO: "Meridiano 28"



LIVRO: “Meridiano 28”,
de Joel Neto
Cultura Editora, Maio de 2018


Mesmo não gostando de sinopses, sou forçado a aceitar que elas existam como forma de mais facilmente chegar ao leitor. Mas tenho para mim que uma sinopse é tanto melhor quanto menos reveladora for e, nesse sentido, escrevê-la é uma arte. Pois eu gosto da sinopse de “Meridiano 28”, uma vez que o livro é muito menos sobre 1939 e o estalar do conflito mais mortífero da História da Humanidade, sobre os periscópios de Hitler a emergirem em frente ao Faial ou sobre as estrelas de cinema e da música, estadistas e campeões de boxe a desembarcarem dos hidroaviões da Pan Am e muito mais sobre os sonhos e ilusões que só na juventude têm esse poder de arranhar a alma ou sobre a amizade que nos vai dizendo ser “muito mais o que nos une que aquilo que nos separa”.

Para além da sua dimensão de puro divertimento, há em “Meridiano 28” essa “costela” do lado da História que nos convida a recuar cerca de oito décadas aos tempos da II Guerra Mundial e a uma altura em que “a cidade da Horta deixava de ser um pacato porto no mar alto, base avançada para a distribuição de cabos telegráficos e escala de oportunidade para aviões de famosos e inconsequentes, para se transformar numa agitada urbe de interesses estratégicos”. Não menos interessante, podemos perceber ainda um certo desvendar das possíveis motivações para se escrever um livro ou alguns dos muitos caminhos que o processo de escrita pode seguir, do esconder-se atrás de citações ou do evitar dos “bloqueios” mediante o parafraseado dos grandes mestres no início de cada capítulo, a essa ideia deveras interessante inscrita no próprio livro, a de que o escritor, no caso concreto José Filémom Marques, é o resultado duma luta entre a paciência e a impaciência.

Este é um livro que se revela particularmente apelativo na forma como a trama narrativa se desenvolve, o final de cada capítulo coincidindo com um pequeno clímax a aguçar a curiosidade do leitor e a compeli-lo a prosseguir nessa autêntica voragem das páginas. O autor mostra-se exímio numa arte (ou será técnica?) que remete para a vibrante literatura juvenil, as imagens vivas e apelativas a convidarem o leitor a viver as maiores aventuras. Recusando qualquer comparação com “Arquipélago”, romance publicado por Joel Neto em 2015 e do qual gostei muitíssimo, diria apenas que a leitura de “Meridiano 28” me soube um bocadinho a desconsolo. Para tal muito contribuiu o factor de previsibilidade naquela que será, porventura, a mais intensa das várias histórias que compõem o romance. Tal não constituiu, contudo, motivo de desinvestimento na sua leitura, de tal forma sobejam motivos de interesse ao longo de mais de quatrocentas páginas e é muito o prazer que se extrai deste livro.

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