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segunda-feira, 5 de março de 2018

LIVRO: "Nenhuma Verdade se Escreve no Singular"



LIVRO: “Nenhuma Verdade se Escreve no Singular”,
de Cláudia Cruz Santos
Ed. Bertrand Editora, Setembro de 2017


Em “Nenhuma Verdade se Escreve no Singular” há carros topo de gama, casas de alterne e whisky barato vendido como se fosse caro. Há histórias de futebol e homens que decidem quem ganha e quem perde. Há negócios escuros, imigração ilegal e máfias do Leste. Há famílias desestruturadas e crianças institucionalizadas. Há juizes e tribunais, arguidos e testemunhas, culpados e absolvidos. E há a prisão, vista como um azar: nuns dias tem-se sorte, noutros não.

É nos corredores da justiça que se passa este romance de estreia de Cláudia Cruz Santos, um livro que fala de liberdade, do seu valor e do seu preço, da sua relevância social, do seu significado individual. Tirando partido da liberdade que a ficção confere, a escritora despe-se de formalismos técnicos e partilha com o leitor comum as suas inquietações, as suas dúvidas e receios, a sua angústia. No viveiro de histórias e memórias que se derramam dum quotidiano fértil, encontra a escritora a matéria-prima para este seu romance, questionando-se – e aos leitores – sobre os méritos e deméritos (mais estes do que aqueles) do sistema judicial português. Ao mesmo tempo, veste o romance duma dimensão pessoal vincadamente auto-biográfica, alicerçada na figura de Amália, uma juíza que vamos conhecendo melhor nas suas longas noites de insónia.

Nesta sua primeira obra, Cláudia Cruz Santos não consegue disfarçar a ansiedade de querer contar tudo o que lhe vai na alma. Do ponto de vista formal, “Nenhuma Verdade se Escreve no Singular” acaba por ser quase um livro de contos, onde até mesmo a história central – a relação de Amália com Marta, uma criança de 13 anos em processo de desinstitucionalização – configura um novo conto e não exactamente o fio condutor do romance, como se pensaria. Há momentos de enorme intensidade e beleza neste livro (as palavras duma mãe que testemunha em favor do filho, jogador de futebol apanhado nas malhas da corrupção é um dos mais impressivos exemplos), mas há também momentos que parecem estar ali a mais (nomeadamente umas férias em Marraquexe). E depois não há nada que prepare o leitor para aquele final, sabendo mais a remedeio que a solução plena. Se as coisas boas do livro não apagam as menos boas, não é menos verdade que há muito de apelativo na escrita de Cláudia Cruz Santos, o que nos obriga a estarmos atentos a esta autora e a aguardar por novo romance.

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