LIVRO: “Manobras de Guerrilha”,
de
Bruno Vieira Amaral
Quetzal Editores, Janeiro de 2018
É sob um manto pretensamente
belicista que descubro o mais recente livro de Bruno Vieira Amaral.
Ao remeter para acções não convencionais, grande mobilidade e
muito jogo psicológico, “Manobras de Guerrilha” é isso tudo mas
também o seu contrário. Desde logo porque, ao acrescentar o
subtítulo “Pugilistas, Pokémons & Génios”, o autor
desdramatiza o conceito, ao mesmo tempo que coloca uma nota de
estranheza na equação. E depois há essa bela capa, ao estilo da
Banda Desenhada, que evoca a “nobre arte” e põe os pontos nos
ii. Na arte e no respeito – e nunca na violência – coloca o
autor a tónica deste livro, nos quais os punhos têm a força da
escrita e o resultado final deve muito mais à cabeça (leia-se,
“inteligência”) que a esse bailado delirante de pés e mãos em
sintonia, corpo contra corpo, em “rounds” de três minutos.
“… Plim”. A campainha soa e o
combate tem início. O ato solitário em busca da superação no
ringue é agora o da leitura, feita de “emboscadas”,
“avanços no terreno” e “campo aberto”. O primeiro golpe
(“Chalana, como peixe na água”) é logo um “murro no
estômago”. Outros se seguirão, do “uppercut” aos queixos de
Toni Bentley, uma “Santa Teresa de Ávila do sexo anal”, ao
gancho no fígado de Susan Sontag, em defesa de Camus. Subtil,
mordaz, eloquente, magnânime, jocoso, camaleónico, irónico,
contundente, Bruno Vieira Amaral discorre sobre as diferenças entre
Messi e Maradona com o mesmo à vontade com que transforma em saco de
boxe uma humanidade esquecida da decência. Tanto o vemos em
passinhos de filigrana a “caminhar entre ruínas” como partimos
com ele à caça de Pókemons pelas ruas do Barreiro ou subimos o
Monte Farinha para assistir à chegada da caravana da Volta.
Em Bruno Vieira Amaral, a escrita é
uma arte. Que pode ser dura, sim, mas é sempre digna e nobre. E é
essa arte – que tem um nome, porque um estilo: o do autor – que
resulta na argamassa que torna coeso o conjunto de 26 textos
selecionados a partir de publicações em orgãos tão respeitados
quanto díspares: Observador, LER, Circo da Lama, Blimunda, Expresso
Diário, Malomil, Público, Orgia Literária e GQ. Nas crónicas de
viagem como nas críticas literárias, por exemplo, o autor deixa a
sua marca inconfundível, a mesma que já encontrávamos em “As
Primeiras Coisas” e se prolongou, depois, no litúrgico “Hoje
Estarás Comigo no Paraíso”. É esse seu estilo, o seu “eu”
literário, que leva a que “Manobras de Guerrilha” seja mais um
momento inefável de partilha, de cumplicidade. Assim como uma
família unida em torno de um par de luvas.
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