LIVRO: “Orlando e o Rinoceronte”,
de Alexandra Lucas Coelho
Ilustrações de Alexandra Lucas
Coelho
Ed. Alfaguara, Outubro de 2017
Confesso que nem sempre foi assim, esta
minha admiração pela chamada literatura infantil, infanto-juvenil
ou o que lhe quiserem chamar. A razão para esta mudança está em
livros como “Orlando e o Rinoceronte”, de Alexandra Lucas Coelho,
e cuja leitura resulta em momentos de deleite e fruição de pequenos
prazeres e grandes aventuras, muitas delas “irmãs gémeas” das
que preservamos na memória e que remetem para infâncias felizes.
Gostaria de notar que “Orlando e o
Rinoceronte” é um livro “a sério”. Quero com isto dizer que o
seu formato “reduzido” (se comparado com a generalidade dos
exemplares da “concorrência”), as suas mais de cem páginas (!)
e a relativa escassez de desenhos, faz com que o seu apelo esteja
mais no conteúdo, que não na forma. Daí que a dedicatória “para
os meus sobrinhos Maria, Mariana, Matias e Nuno e para todos os que
vão mudar o mundo” faça todo o sentido. Os meninos e meninas dispostos a
aceitar o convite à leitura de “Orlando e o Rinoceronte” que se
preparem para a realidade que os espera: Vocês vão MESMO mudar o
mundo!
“Orlando e o Rinoceronte” leva-nos
a conhecer Orlando, olhos abertos para o mundo do alto dos seus oito
anos, mas também Ganda e a sua história trágico-marítima, por
obra e graça da estupidez e do egoísmo dos homens. Faz igualmente
com que nos lembremos que encontrar a pessoa certa para nos falar das
coisas é mil vezes melhor do que ir procurar ao Google; e que o
conceito de Portugalidade e de escravatura estão ligados e não são
coisa de que nos possamos orgulhar. Entre outras, também nos alerta
para a ideia subjacente aos Descobrimentos e mostra que, afinal, as
coisas podem não ser bem como nos contam. “Coisas sérias” à parte, este livro fez-me, sobretudo, fechar os olhos com força e, nas estrelas por cujo brilho me
deixei levar, jogar de novo às caricas no pátio tornado estádio
todas as tardes de todas as férias, acompanhar o meu pai nas
pescarias de tainhas numa ria imensamente bela e despoluída,
deliciar-me com o sabor levemente acidulado da broa que a D. Laurinda
cozia, passar tardes inteiras a ler em voz alta para a minha mãe enquanto ela fazia renda, penetrar nas sombras misteriosas do Pinhal
do Gato Morto, o corpo a tremer colado ao da Tia Matilde, ou
sentir-me livre como nunca, correndo no meio do feno alto ao cair
duma tarde de Verão.

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