Páginas

terça-feira, 3 de setembro de 2024

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: "Paisagens Tecnológicas"



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Paisagens Tecnológicas”,
de Álvaro Domingues
Bienal de Fotografia Lamego e Vale do Varosa 2024
Casa da Torre
20 Jul > 21 Out 2024


Geógrafo e professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Álvaro Domingues tem-se debruçado sobre as temáticas da geografia urbana, do urbanismo e da paisagem. A sua obra escrita fala-nos disso, como nos falam disso as inúmeras imagens que partilha com aqueles que o seguem nas redes sociais. No seu livro “Paisagens Transgénicas” (Ed. Museu da Paisagem, Maio de 2021), refere-se a “paisagem” como “uma daquelas palavras cujo sentido habitualmente não se interroga. De tão banal, por mil vezes repetida, adjetivada, convertida em metáfora e outros artifícios de linguagem, toma-se a palavra como auto-explicativa e passa-se rapidamente aos assuntos que ela designa - são infinitos, polémicos e contraditórios. Atente-se àquilo de que se fala quando se fala de paisagem e logo se perceberá a imensa cacofonia, eliminadas certas tonalidades frequentes e relaxantes que povoavam os postais ilustrados, as imagens dos calendários e, agora, o fundo dos ecrãs dos computadores - o pôr do sol na linha do horizonte no grande mar oceano, o lago com a montanha ao fundo e os picos nevados, uma cena campestre de recorte romântico e cenografia a condizer, a fita da estrada entre colinas com o recorte da urbe ao longe e outros exemplares perfeitamente codificados por regimes de visibilidade do real bastante difundidos e visitados.”

Explorar este livro é abrir os horizontes sobre paisagem, transgénicos e identidade, fibras nervosas e espaço verde topiário, o chão pacífico da lavoira, ruas [que] se abrem derribando todos os tropeços que lhe fizerem impedimento. É perceber que o olhar paisagista pode não se revelar espontaneamente e que, muito menos, são consensuais as formas sobre “o que ver, como ver, sentir e como julgar e partilhar o que é visto.” “Paisagens Tecnológicas”, exposição que integra a Bienal de Fotografia Lamego e Vale do Varosa 2024 e que pode ser vista na Casa da Torre de Lamego até ao dia 21 de Outubro, reforça a visão de Álvaro Domingues, trazendo para primeiro plano o lado tecnológico da paisagem, a “natureza sintética” na qual “são os humanos especialistas”. Trabalhando sobre uma paisagem que ele próprio vem modificando há décadas e séculos, feita de muros, arruamentos, socalcos, sistemas de rega e uma “policultura promíscua”, o homem tem hoje para nos oferecer auto-estradas, viadutos, pontes, túneis, barragens, condutas, heliportos, torres eólicas e linhas da alta tensão. As imagens estão lá a confirmá-lo, numa sequência que pede tempo para olhar e mais tempo para reflectir.

Nos idos de 1531/2, Rui Fernandes falava de uma terra “(…) muito montuosa pela maior parte e toda é muito aproveitada, principalmente para o Douro. E os homens são tão benfeitores que às fragas altas levam o cesto da terra às costas para plantarem as parreiras e figueiras, pereiras, ameixoeiras, e todo outro arvoredo. E todas as estradas estão cobertas de fruteiras e videiras (…)”. Álvaro Domingues deixa-nos este excerto da “Descrição do terreno ao redor de Lamego duas léguas”, para lembrar que “mais do que impressões visuais sobre terras montuosas e muito aproveitadas, Rui Fernandes assinala modos de transformação”. E conclui: “Este é um exemplo claro das razões tecnológicas da paisagem. Construir socalcos e caminhos, pontes, fontanários, casada, cardenhos, moinhos, armazéns, adegas…, são trabalhos que mobilizam saberes, técnicas, ferramentas, máquinas e toda a infinidade de coisas de que é feita a tecnologia - desde as técnicas de enxertia, aos sistemas globais de telecomunicações (…). O território é uma construção social, um retalho do mundo que, como escreveu Camões, é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades.”

Sem comentários:

Enviar um comentário